TJSP – CSM – Usucapião extrajudicial – Contrato de compromisso particular de permuta de cessão de direitos e outras avenças – Posse precária cedida – Falta de comprovação do termo inicial da posse com ânimo de dono.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1003915-58.2022.8.26.0361

      Registro: 2023.0000511181

      ACÓRDÃO 

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1003915-58.2022.8.26.0361, da Comarca de Mogi das Cruzes, em que são apelantes EUGENIO PACELLI FIGUEIREDO e EDNA SONIA DE FIGUEIREDO, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE MOGI DAS CRUZES.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 16 de junho de 2023.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL nº 1003915-58.2022.8.26.0361

      APELANTES: Eugenio Pacelli Figueiredo e Edna Sonia de Figueiredo

      APELADO: 1º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Mogi das Cruzes/SP

      VOTO Nº 39.012

      Registro de imóveis – Dúvida – Usucapião extrajudicial – Contrato de compromisso particular de permuta de cessão de direitos e outras avenças – Posse precária cedida – Falta de comprovação do termo inicial da posse com ânimo de dono – Prazo prescricional não demonstrado – Certidões atualizadas exigidas pelo artigo 4º, IV, do Provimento Nº 65/2017 da Corregedoria Nacional de Justiça – Exigência de inclusão na planta e memorial descritivo apresentados, de construção existente no imóvel – À vista da modalidade de usucapião invocada (artigo 1.238, Parágrafo Único, do Código Civil), a exigência era pertinente porque há alegação de estabelecimento de moradia no imóvel – Mantidos os óbices ao prosseguimento da usucapião – Recurso desprovido.

      Trata-se de apelação interposta por Eugênio Pacelli de Figueiredo e sua esposa Edna Sônia Figueiredo, em processo de dúvida, visando à reforma da r. sentença que manteve a rejeição do pedido de reconhecimento extrajudicial da usucapião do imóvel objeto da matrícula nº 78.061 (um terreno composto dos lotes sob nºs 01, 02, 03 e 04 da quadra “X”, situado na Vila Oliveira, no Município e Comarca de Mogi das Cruzes, formado pelo perímetro A-B-C-D-E-A, com área de 1.933,78m², melhor descrito na certidão a fls. 173/175), com a consequente extinção do processo e cancelamento da respectiva prenotação (fls. 781/785).

      Os óbices apontados pelo Oficial foram: (i) ausência de planta e memorial descritivo que retratem suficientemente a construção (acessão) existente no local; (ii) ausência de certidões cíveis e criminais atualizadas; (iii) impossibilidade de estabelecer o termo inicial da posse como ânimo de dono na data informada pelos interessados (2009).

      Aduzem os apelantes, em síntese, que os requisitos necessários para a usucapião foram preenchidos, fazendo jus ao reconhecimento da aquisição do domínio. Afirmam estar na posse do imóvel desde meados de 2009, conforme a documentação acostada aos autos, sendo inexigível justo título ou boa-fé, a teor do que dispõe o artigo 1.238, parágrafo único, do Código Civil. Alegam que apresentaram as certidões exigidas, e o Oficial jamais solicitou a apresentação das certidões atualizadas nas notas de devolução que precederam a última. No mais, no tocante à construção erigida sobre o imóvel objeto da usucapião, disseram que a anterior nota de devolução sugeriu que, para o atendimento da especialização do objeto, seria necessária a solicitação expressa de dispensa da especialização da construção (por uma regularização futura, se o caso), vez que os trabalhos técnicos de especialização do objeto não contemplaram a construção existente; e a sugestão foi acolhida pelos ora recorrentes.

      Pedem, portanto, o afastamento dos óbices para o deferimento da usucapião extrajudicial sobre o imóvel em apreço (fls. 809/826).

      A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 842/845).

      É o relatório.

      Os recorrentes deduziram pedido de usucapião extrajudicial do imóvel de matrícula nº 78.061 no 1º Oficial de Registro de Imóveis de Mogi das Cruzes, fls. 31/37, com invocação do disposto no artigo 1.238, parágrafo único, do Código Civil, que defere a usucapião extraordinária a quem tem posse mansa e ininterrupta, com animus domini, estabelecendo no imóvel sua moradia habitual, ou nele realizando obras ou serviços de caráter produtivo, por dez anos (fls. 31/37).

      Em seu requerimento, afirmaram que “os direitos de posse sobre esse imóvel foram adquiridos pelos requerentes por meio do Compromisso Particular de Permuta de Cessão de Direitos e Outras Avenças, firmado na data de 01 de junho de 2009”, quando, então, nele estabeleceram sua moradia (fls. 32).

      Por referido contrato e seu aditamento, figuraram como vendedores Devaldo Cardoso de Jesus e sua esposa JosenildaVicente de Paula Jesus e, como compradores, os recorrentes (fls. 82/85, 86/87). Os primeiros cederam os direitos sobre o imóvel que haviam recebido de Gilson de Oliveira Cardoso e sua esposa Gabrielle Sanchez Palência Cardoso (fls. 77/81). E nenhum deles figura como proprietário do imóvel, que está sob a titularidade de JúlioIvo Albertoni, casado com Ely Piacenti Albertoni, e Umberto Palma, casado com Maria Assunta Bottari Palma.

      No contrato firmado entre Devaldo e esposa e Gilson e esposa, constou a entrega da posse precária sobre o imóvel, sendo que a posse definitiva dar-se-ia após a quitação das 100 (cem) parcelas avençadas na alínea “e” da cláusula 1ª, vencendo-se a primeira delas em 20/10/2008.

      Vale dizer que a posse transmitida aos postulantes por Devaldo e esposa teve a mesma característica da precariedade, haja vista que ninguém transmite direitos maiores do que os têm.

      Deste modo, não é possível extrair da prova documental em apreço o termo inicial da posse com ânimo de dono porque, como é de geral sabença, posse precária não é adusucapionem.

      Não se trata de exigir a prova da quitação do preço firmado no contrato, como querem fazer crer os recorrentes. A quitação apenas poderia indicar eventual inversão do ânimo da posse, quiçá com deflagração do termo a quo para a contagem do prazo de usucapião.

      Não se tem, portanto, notícia de quando se deu o prazo inicial da posse com ânimo de dono, e certamente não é a data de celebração do contrato invocado pelos apelantes (meados de 2009) porque, naquela data, a posse transmitida era precária.

      Pela mesma razão as contas de consumo ou de pagamento e imposto sobre o imóvel não auxiliam os recorrentes. Não há controvérsia de que realizaram os pagamentos e de que residiam no imóvel, apenas não se tem demonstração de que o termo inicial da posse com intento de adquirir a propriedade ocorreu na data invocada.

      O Provimento nº 65/2017 da Corregedoria Nacional de Justiça, que estabelece diretrizes para o procedimento da usucapião extrajudicial nos serviços notariais e de registro de imóveis, dispõe:

      “Artigo 4º. O requerimento será assinado por advogado ou por defensor público constituído pelo requerente e instruído com os seguintes documentos:

      (…)

      III – justo título ou quaisquer outros documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a cadeia possessória e o tempo de posse;”

      Ainda que a modalidade de usucapião invocada seja a extraordinária, o que dispensa a presença do justo título, era imprescindível que os apelantes trouxessem documentos hábeis a demonstrar a origem, a continuidade, a cadeia possessória e o tempo de posse, o que não se vê dos autos.

      Só por isso o pleito já era improcedente, mas as demais exigências igualmente se sustentam.

      No que se refere à construção existente no imóvel e à necessidade de que a ata notarial, a planta, o memorial descritivo e eventuais outros documentos fizessem menção a ela, o Oficial está com a razão, à vista da modalidade de usucapião invocada.

      Os recorrentes pretenderam invocar a usucapião extraordinária do parágrafo único do artigo 1.238 do Código Civil, aquele que se dá em dez anos de posse mansa e ininterrupta, com ânimo de dono, estabelecendo no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizando obras ou serviços de caráter produtivo.

      Como a moradia se estabelece na construção sobre o terreno, era imprescindível que o pedido de usucapião também descrevesse a construção existente no terreno.

      Por pertinência lógica entre o dispositivo legal invocado e o imóvel, haver-se-ia de incluir a construção no pleito de usucapião.

      A circunstância de o Oficial ter sugerido, em nota de devolução anterior que, para o atendimento da especialização do objeto, seria necessária a solicitação expressa de dispensa da especialização da construção (por uma regularização futura, se o caso), vez que os trabalhos técnicos de especialização do objeto não contemplaram a construção existente, em nada auxilia os recorrentes.

      Tratou-se de mera sugestão a ser acolhida, se o caso.

      Mas diante da invocação do disposto no artigo 1.238, parágrafo único, do Código Civil, certamente não era o caso de se adotar a sugestão do Oficial.

      As certidões atualizadas são devidas por força do disposto no artigo 4º, inciso IV, do Provimento 65/2017 da Corregedoria Nacional de Justiça, sendo exigidas do requerente e respectivo cônjuge ou companheiro, se houver; do proprietário do imóvel usucapiendo e respectivos cônjuge ou companheiro, se houver; de todos os demais possuidores e respectivos cônjuges ou companheiros, se houver, em caso de sucessão de posse, que é somada à do requerente para completar o período aquisitivo da usucapião.

      Tratando-se de exigência decorrente da normatização referida, é desimportante eventual ausência de óbice nas notas de devolução anteriores.

      Por fim, não se vislumbram indícios de atuação desidiosa do Oficial hábil a deflagrar sua responsabilidade administrativa. É dever do Oficial apresentar os óbices à qualificação do título e embora seja recomendável que o faça exaustivamente na primeira oportunidade em que se manifestar, não se pode olvidar que os esclarecimentos posteriores por parte dos interessados acabam por justificar óbices outros.

      Além disso, cuida-se de um procedimento de usucapião extrajudicial, onde esclarecimentos podem ser necessários durante seu curso, como, aliás, estabelece o artigo 17, “caput”, do Provimento CNJ nº 65/2017:

      “Art. 17. Para a elucidação de quaisquer dúvidas, imprecisões ou incertezas, poderão ser solicitadas ou realizadas diligências pelo oficial de registro de imóveis ou por escrevente habilitado”.

      Em suma, mantidos os óbices, a extinção do processo extrajudicial era mesmo de rigor.

      Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator 

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