TJSP – CSM – Título judicial – Formal de partilha – Óbice relativo à especialidade objetiva – Imóvel que sofreu pequeno desfalque, sem comprometer a verificação de disponibilidade quantitativa e qualitativa.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1004005-07.2021.8.26.0586

      Registro: 2023.0000511121

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1004005-07.2021.8.26.0586, da Comarca de São Roque, em que é apelante MARIA DE LURDES APARECIDA TRUJILLO ANGIOLUCCI, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SÃO ROQUE.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 16 de junho de 2023.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL Nº 1004005-07.2021.8.26.0586

      APELANTE: Maria de Lurdes Aparecida Trujillo Angiolucci

      APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de São Roque

      VOTO Nº 39.013

      Registro de imóveis – Dúvida – Sucessão causa mortis – Título judicial – Formal de partilha – Óbice relativo à especialidade objetiva – Imóvel que sofreu pequeno desfalque, sem comprometer a verificação de disponibilidade quantitativa e qualitativa – Exigência de retificação do imóvel pela suposta divisão em glebas do referido bem – Divisão que não se vê na matrícula – Frações ideais do imóvel atribuídas ao viúvo e aos herdeiros da matriarca – Ausência de pretensão de regularização de escritura de doação, com reserva de usufruto, quanto à gleba destacada do imóvel – Pretensão voltada apenas para registro da transmissão da parte ideal do imóvel do falecido a seus herdeiros – Óbices afastados, dúvida improcedente – Recurso provido.

      Trata-se de recurso de apelação interposto por Maria de Lurdes Aparecida Trujillo Angiolucci, fls. 379/389, visando à reforma da sentença de fls. 370/373, que julgou procedente a dúvida suscitada, mantendo a recusa do Oficial do Registro de Imóveis e Anexos de São Roque feita ao ingresso no registro de formal de partilha dos bens deixados por Sinésio Trujillo Gonçalves, expedido em 04/06/2013, com referência ao imóvel de matrícula nº 10.349 daquela serventia.

      A Nota de Devolução prenotada sob nº 149419, fls. 331/332, indicou, como motivo de recusa do ingresso do título:

      “(…) a necessidade de retificação do registro, para apuração do remanescente do imóvel da matrícula nº 10.349 e o prévio registro de divisão da propriedade, estorvam o acesso da partilha ao registro, mesmo que apenas com relação à fração ideal do item II-2 (registro parcial), com origem no registro número 1 da referida matriz”.

      A recorrente alega, em síntese, que o formal de partilha está em termos para que seja registrada a transmissão da fração ideal no valor de Cr$23.571,42 do imóvel de matrícula nº 10.349 do Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de São Roque, em razão da morte de Sinésio Trujillo Gonçalves, cuja aquisição se deriva do registro de nº 1 da referida matrícula, haja vista que reivindica somente a obediência ao princípio da “saisine”, a fim de que referida fração ideal passe à titularidade dos sucessores do falecido. No mais, refuta a necessidade de retificação do registro em razão do desfalque havido pela usucapião porque a transmissão se refere a fração ideal, não delimitada.

      A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 417/419).

      É o relatório.

      Maria de Lurdes Aparecida Trujillo Angiolucci apresentou a registro parcial o formal de partilha dos bens deixados por Sinésio Trujillo Gonçalves, expedido em 14/06/2013 e aditado em 03/02/2014.

      A recorrente deixou perfeitamente claro que postulara tão somente o registro do formal de partilha com referência à fração ideal no valor de Cr$23.471,42 do imóvel de matrícula nº 10.349 do Oficial de Registro de Imóveis de São Roque, parte ideal esta que havia sido adquirida por Sinésio Trujillo Gonçalves em razão da morte de sua genitora, Encarnação Moya Trujillo, tudo conforme o registro de nº 1 na matrícula (fls. 326/328).

      No entanto, o registro parcial foi negado pelo Oficial, sob fundamento de que há necessidade de prévia apuração do remanescente do imóvel, mediante retificação do registro, “uma vez que a matrícula não mais contempla o imóvel rural descrito na ficha 1, com 286.275,16 metros quadrados, já que foi desfalcado de parte certa com 298,83 metros quadrados, conforme averbação nº 03 de 07/10/2010”, além do que as partes ideais do imóvel arroladas na partilha indicam a existência de divisão do imóvel, a ser previamente regularizada.

      Para melhor compreensão da controvérsia, é preciso fazer uma breve referência ao que constou na partilha sobre o imóvel, assim como ao que consta da correspondente matrícula.

      O imóvel em apreço está matriculado sob nº 10.349 no Oficial de Registro de Imóveis de São Roque e está descrito como um terreno com a área de 286.275,16 metros quadrados, situado no imóvel denominado “Fazenda Cambará”, no Bairro do Cambará, no Município e Comarca de São Roque, conforme as divisas e confrontações mais bem descritas na certidão de matrícula a fls. 326/328.

      Do Registro de nº 1, consta o formal de partilha dos bens deixados por Encarnação Moya Trujillo, que deu o valor de Cr$310.000,00 ao imóvel, partilhando-o ao viúvo e aos herdeiros, sendo atribuída ao primeiro a fração ideal de Cr$145.000,00, e, a cada um dos sete herdeiros, a fração ideal de Cr$23.571,42. Sinésio Trujillo Gonçalves foi um dos herdeiros contemplados com tal fração ideal.

      Da Averbação de nº 03, consta que parte do imóvel daquela matrícula (10.349), com superfície de 298,83 metros quadrados foi objeto de usucapião, conforme mandado judicial registrado sob nº 1/35.684, prenotação nº 108.751 de 17/09/2010.

      Esta a situação do imóvel no registro. Passa-se, então, à partilha para aferir o que dela constou com referência ao referido bem.

      Da partilha (fls. 20), vê-se que são várias as menções ao imóvel em pauta:

      i) no item 2 consta uma área de terras com 48.400,00 metros quadrados, em comum num terreno com área de 286.275,16 metros quadrados, situado no imóvel denominado “Fazenda Cambará” (atualmente denominação “Sítio Trujillo” – Averbação nº 2, na matrícula nº 10.349, do Cartório de Registro de Imóveis de São Roque). Esta área consta como havida por Sinésio Trujillo Gonçalves por escritura pública de doação, com reserva de usufruto, lavrada no Segundo Tabelião de Notas de São Roque, no livro 292, fls. 79/81, em 25/12/1982, ainda não levada a registro.

      ii) no item 3 consta uma parte ideal de Cr$ 23.571,42, na avaliação de Cr$ 310.000,00 no mesmo imóvel. Esta parte ideal consta como adquirida por força do Registro nº 1 na matrícula nº 10.349 do Oficial de Registro de Imóveis de São Roque, em razão do falecimento de Encarnação Moya Trujillo.

      iii) no item 4 consta uma parte ideal no valor de Cz$23,57 (23.571,42 Cr$ antigos) do mesmo imóvel. Esta parte ideal consta como havida por Sinésio Trujillo Gonçalves por venda de Walter Trujillo, conforme escritura pública lavrada no Segundo Tabelião de Notas de São Roque, no livro 319, fls. 292, em 12/06/1986, ainda não levada a registro na matrícula do imóvel.

      vi) no item 5 consta uma parte ideal, no valor de Cz$23,57 (23.571,42 Cr$ antigos) do mesmo imóvel. Essa parte ideal consta como havia por Sinésio Trujillo Gonçalvez por venda de Luiz Antonio de Mello e sua mulher, conforme escritura lavrada no Segundo Tabelião de Notas de São Roque, no livro 323, fls. 111, em 01/10/1986, ainda não levada a registro.

      A ora recorrente inicialmente havia postulado o registro do formal de partilha com referência ao imóvel de matrícula nº 10.349, de modo a incluir todas as aquisições acima, ocasião em que o Oficial devolveu o título, prenotado sob nº 148.578, em 03/09/2021, aduzindo (fls. 329/330):

      “Existem títulos aquisitivos do autor da herança não registrados, posto que, está prejudicada a conferência da partilha com relação àquilo que detém no imóvel da matrícula nº 10.349.

      A matrícula nº 10.349 abriga imóvel rural com 286.275,16 metros quadrados, desfalcado de parte certa, como se pode verificar da averbação nº 3, efetivada em 07/10/2010 e, sendo assim, o registro de qualquer título com origem neste registro está condicionado a que se promova, imprescindivelmente, a apuração do seu remanescente através de Retificação de Registro, considerando o princípio da especialidade e disponibilidade registrária”.

      Depois disso, houve novo pedido de registro parcial do formal de partilha, desta feita tão somente para que se efetivasse o registro da parte ideal do imóvel de matrícula nº 10.349, cuja aquisição fora derivada do registro nº 1 na referida matrícula, ou seja, a pretensão referiu-se apenas à parte ideal que o autor da herança, Sinésio Trujillo Gonçalvez, adquirira pelo falecimento de Encarnação Moya Trujillo, sua genitora. Referida parte ideal está descrita no item “ii” supra.

      O título foi prenotado sob nº 149.419, em 16/11/2021, mas foi devolvido, asseverando o Oficial “a necessidade da retificação, para apuração do remanescente do imóvel da matrícula nº 10.349 e o prévio registro de divisão da propriedade”.

      Data vênia dos fundamentos exarados pelo Oficial e mantidos pela r. sentença, a recusa de registro parcial do formal de partilha é descabida.

      Como se vê do registro nº 1 da certidão de matrícula do imóvel, realizado em 22 de janeiro de 1981, Sinésio Trujillo Gonçalves consta como proprietário de parte ideal de Cr$23.571,42 do referido bem. Quanto a esta parte ideal, nenhuma regularização está pendente, diferentemente do que se passa, por exemplo, com as aquisições de partes ideais do mesmo imóvel por Sinésio junto a Walter Trujillo e Luiz Antonio de Mello e sua mulher.

      Com o falecimento de Sinésio Trujillo Gonçalvez, a herança transmitiu-se, desde logo, a seus herdeiros, nos moldes do artigo 1.784 do Código Civil, que adota o princípio da “saisine”, “o direito de saisina, ou da investidura legal na herança, que irradia efeitos jurídicos a partir do óbito do de cujus”[1].

      Estando perfeitamente descrita a parte ideal pertencente a Sinésio Trujillo Gonçalves e, ante sua morte, com a transmissão da herança a seus herdeiros, não há óbice de que seja encerrado o estado de indivisão entre eles, atribuindo a cada herdeiro a parte que lhe couber.

      A circunstância de ter havido o destaque de 298,93m² em razão da usucapião desta área não impede o registro pretendido. Considerada a área total do imóvel de 286.275,16m², e a parte cabente ao espólio de Sinésio, aproximadamente 20.448,22m², esse desfalque de área, pequeno e isolado, pela prescrição aquisitiva é pouco significativo, e não retira a disponibilidade quantitativa e qualitativa na matrícula.

      Em sentido semelhante, destaca-se trecho do voto proferido nos autos da Apelação Cível nº 1000032-10.2020.8.26.0059:

      “Não há óbice para o registro stricto sensu da partilha no que diz respeito ao imóvel […] esse prédio rústico efetivamente sofreu um desfalque, pois da área original, calculada em 80.266m² (fl. 15), veio a ser subtraída, segundo a Av. 2 (fl. 15), a fração de 131,25m². A despeito das imprecisões da descrição original e, depois, da parte destacada, fato é que o desmembramento havido, sendo pequeno e único, ainda permite concluir que subsiste disponibilidade quantitativa e qualitativa na matrícula, ou seja, que realmente houve transmissão de uma gleba, como documentado na escritura pública de inventário e partilha (fs. 28)” (Relator Desembargador Ricardo Anafe; data do julgamento:17 de setembro de 2021).

      De outra parte, a descrição do imóvel contida na matrícula não identifica tenha havido sua divisão em glebas.

      O que existe é a transmissão de frações ideais ao meeiro e aos herdeiros de Encarnação Moya Trujillo, conforme o registro nº 1. Isso, todavia, não indica que o imóvel esteja dividido em glebas, a impor prévia regularização, como o Oficial exigiu.

      É fato que do formal de partilha há descrição de um destaque de 48.400,00m² do imóvel da matrícula 10.349, que consta como havida por Sinésio Trujillo Gonçalves por escritura pública de doação, com reserva de usufruto, lavrada no Segundo Tabelião de Notas de São Roque, no livro 292, fls. 79/81, em 25/12/1982 (fls. 58/61), mas nem mesmo a referida escritura foi levada a registro, sendo, então, o negócio totalmente desconhecido do Oficial de Registro de Imóveis.

      Se e quando houver a pretensão de regularizar esse destaque de área, mediante o registro da escritura pública de doação em referência, é que terá cabimento eventual exigência de retificação do registro do imóvel.

      Não se vislumbra, portanto, ofensa ao princípio da especialidade objetiva, porquanto a pretensão da recorrente é de registro parcial do formal de partilha apenas para que se efetive a transmissão da parte ideal do imóvel pertencente a Sinésio Trujillo Gonçalves, conforme consta do registro nº 1 da matrícula 10.349, a seus herdeiros.

      Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação, e julgo a dúvida improcedente.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      NOTA:

      [1] Maria Helena Diniz. Código Civil Anotado. São Paulo: Saraiva. 18ª edição. P. 1392.

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