TJSP – CSM – Processo extrajudicial de usucapião – Falecimento de titular de domínio de imóvel confrontante – Exigência de lavratura de escritura pública declaratória de únicos herdeiros para anuência ao pedido de usucapião descabida.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1005090-16.2020.8.26.0278

      Registro: 2022.0000995277

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1005090-16.2020.8.26.0278, da Comarca de Itaquaquecetuba, em que são apelantes ROSEANE ALVES ANDRADE, JOSIVALDO ALVES DOS SANTOS e WESLEY ALVES ANDRADE, é apelado OFICIAL DE REGISTROS DE IMÓVEIS DA COMARCA DE ITAQUAQUECETUBA.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 25 de novembro de 2022.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL nº 1005090-16.2020.8.26.0278

      APELANTES: ROSEANE ALVES ANDRADE, JOSIVALDO ALVES DOS SANTOS e WESLEY ALVES ANDRADE

      APELADO: OFICIAL DE REGISTROS DE IMÓVEIS DA COMARCA DE ITAQUAQUECETUBA

      VOTO Nº 38.822 

      Registro de imóveis – Dúvida – Processo extrajudicial de usucapião – Falecimento de titular de domínio de imóvel confrontante – Exigência de lavratura de escritura pública declaratória de únicos herdeiros para anuência ao pedido de usucapião descabida – Oficial de registro que não pode apresentar óbice ao registro, que dependa de providências de terceiros – A escritura de únicos herdeiros somente se faz necessária se, não havendo inventário aberto ou concluído, os sucessores do titular de domínio falecido desejarem anuir ao pedido – Demonstrada a inexistência de inventário em curso, impõe-se a notificação dos herdeiros da falecida titular de domínio do imóvel confrontante, comprovando-se tal condição – Impossibilidade, diante da normativa vigente, de proceder-se à notificação por edital desde logo – Inaplicabilidade do §10 do art. 10 do provimento CNJ N.º 65/2017 e do subitem 418.10 das NSCGJ – Área usucapienda que não coincide com a descrição tabular – Apelação a que se nega provimento.

      Trata-se de apelações interpostas por WESLEY ALVES ANDRADEROSEANE ALVES ANDRADE e JOSIVALDO ALVES DOS SANTOS contra a r. Sentença (fls. 260/262), proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos, Civil de Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Comarca de Itaquaquecetuba, que julgou procedente a dúvida e manteve óbice ao avanço de processo extrajudicial de usucapião concernente ao imóvel localizado na Rua do Sol n.º 175, Vila Celeste, Itaquaquecetuba.

      Da nota devolutiva constaram os seguintes óbices ao avanço do processo extrajudicial de usucapião (fls. 235/236):

      “a notificação feita em 06/05/2020, pelo setor de RTD desta serventia, revelou que a proprietária tabular do imóvel confrontante dos fundos, HILDA GLÓRIA DOS SANTOS, é falecida há mais de 10 anos, cuja informação foi prestada por suas filhas, LUCIA e HILCE.

      Em razão disso, informamos ao interessado que a anuência ao pedido de usucapião ora requerido deverá ser prestada pelas herdeiras legais, desde que apresentem escritura pública declaratória de únicos herdeiros com nomeação do inventariante, conforme previsto no item 418.14, Cap.XX, Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo. Visando cumprir a exigência acima, o interessado apresentou em 26/05/2020, petição solicitando a notificação das herdeiras para que estas informem se possuem ou não cargo de inventariante, e, em caso de negativa, que este Oficial de Registro de Imóveis suscite ao Juiz Corregedor desta Comarca, conforme artigo 989 do Código de Processo Civil, para que este determine, de ofício, a abertura do inventário. Em 03/06/2020, esclarecemos em novo comunicado que, não há previsão legal que autorize o Oficial de Registro de Imóveis a requerer tal providência junto ao juízo.

      Portanto, para prosseguimento do presente procedimento de usucapião, o interessado deveria apresentar novo requerimento contendo pedido para notificação do Espólio de HILDA GLÓRIA DOS SANTOS, indicando o inventariante e comprovando a respectiva condição, com endereço válido para a nova notificação.

      Em 03/06/2020, foi enviada ao advogado nova notificação reiterando a notificação datada de 06/05/2020.

      Em 24/06/2020, o interessado apresentou nova petição, acompanhada de certidões expedidas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, onde requer novamente a notificação das herdeiras, diante da informação contida nas respectivas certidões de que não existe ação de inventário dos bens deixados pelo falecimento de HILDA GLÓRIA DOS SANTOS. O interessado solicita, também, que caso não seja possível a notificação das herdeiras, este Oficial dispense a respectiva notificação com base no artigo 10, §10 do Provimento nº 65/2017 do Conselho Nacional de Justiça. Por fim o interessado requer a respectiva notificação por edital, nos termos do artigo 11 do citado Provimento nº 65/2017 do CNJ.

      (…) presente procedimento poderá ser prestada pelos herdeiros legais, mediante apresentação de escritura pública de nomeação de únicos herdeiros (item 418.14, Cap. XX, Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo), ou, caso haja inventário em curso, pelo inventariante nomeado judicialmente ou extrajudicialmente.

      No que se refere a dispensa da notificação, entendemos não ser possível, pois, o artigo 10, § 10, do Provimento nº 65/2017 do CNJ, somente prevê a respectiva dispensa da notificação quando o imóvel usucapiendo estiver matriculado com descrição precisa e houver perfeita identidade entre a descrição tabular e a área objeto do requerimento da usucapião, o que não ocorre no presente caso (matrícula de origem do imóvel com área de 278,20m², imóvel usucapiendo com área de 125,00m²).

      Da mesma forma, a notificação por edital é medida que, também, não se aplica neste momento, já que tal alternativa se dá apenas depois de esgotadas as possibilidades de notificação pessoal do titular ou seus representantes.”

      Em suas razões, sustentam os apelantes que não há como providenciar a apresentação de escritura pública de declaração de herdeiros da confrontante tabular, Hilda Glória dos Santos, ônus cabente aos próprios herdeiros.

      A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento dos recursos (fls. 302/305 e 341).

      É o relatório.

      Trata-se de requerimento firmado por Roseane Alves Andrade, Wesley Alves de Andrade e Josivaldo Alves dos Santos de procedimento extrajudicial de usucapião envolvendo o imóvel com origem na matrícula n.º 43.514 do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Poá.

      É dos autos ser titular de domínio do imóvel confrontante dos fundos a Senhora Hilda Glória dos Santos.

      Enviada notificação, houve o retorno com certidão negativa, constando que as filhas da notificada, Senhoras Lúcia e Hilce, recusaram-se a fornecer seus nomes completos e informaram que a Senhora Hilda faleceu há mais de dez anos.

      O Oficial de Registro de Imóveis exigiu, então, a anuência dos herdeiros legais da Senhora Hilda Glória dos Santos, acompanhada de escritura pública declaratória de únicos herdeiros com nomeação de inventariante, judicial ou extrajudicialmente.

      No mais, destacou o Registrador ser inviável a dispensa de notificação, como pretendido pelos apelantes, à vista do § 10 do artigo 10, do Provimento CNJ nº 65/2017; assim como a notificação por edital, porquanto não esgotadas todas as possibilidades de notificação pessoal da titular ou seus representantes.

      A sentença recorrida confirmou a recusa do Oficial de Registro, reconhecendo a impossibilidade de dispensa de notificação e da realização de notificação por edital, bem como a necessidade de apresentação de escritura pública outorgada pelos herdeiros, ante a inexistência de inventário em curso. Ainda, ressaltou que a notificação do inventariante ou de todos os herdeiros é providência que compete aos requerentes e não, ao Oficial (fls. 260/262).

      Os apelantes, entretanto, sustentam ser inviável lavrar a escritura pública de declaração de herdeiros da confrontante, Sra. Hilda, o que somente poderá ser realizado por suas herdeiras. Assim, na hipótese de inércia das herdeiras, pugnam para que o silêncio seja interpretado como consentimento.

      Ora, o obstáculo apresentado pelo Oficial do Registro de Imóveis e os fundamentos trazidos pelo MM. Juiz Corregedor Permanente para confirmação da exigência de lavratura de escritura pública para manifestação de anuência, pelos herdeiros, não se sustentam.

      Exigir que os requerentes imponham aos herdeiros da falecida confrontante a obrigação de lavratura de escritura pública declaratória de únicos herdeiros para anuência ao pedido de usucapião é absolutamente descabido. Não pode o Oficial de Registro apresentar óbice que dependa de providências de terceiros e, com isso, barrar o direito dos requerentes da usucapião extrajudicial.

      Não se desconhece que, em relação aos proprietários tabulares já falecidos, prevê o art. 12 do Provimento CNJ nº 65/2017 que:

      Art. 12. Na hipótese de algum titular de direitos reais e de outros direitos registrados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula do imóvel confinante ter falecido, poderão assinar a planta e memorial descritivo os herdeiros legais, desde que apresentem escritura pública declaratória de únicos herdeiros com nomeação do inventariante.

      Sobre a questão, contudo, esclarece Francisco José Barbosa Nobre:

      “Se há certeza da morte, comprovada por certidão do registro civil ou pela existência de inventário, ou se é fato sabido na localidade, mas não se sabe com exatidão qual é o conjunto de sucessores, os que são conhecidos poderão passar sua anuência expressa ou serem notificados nominalmente, e os sucessores desconhecidos ou incertos serão notificados por edital. Se há inventário judicial aberto, ou escritura de inventário lavrada, com definição do conjunto de herdeiros e inventariante nomeado, não há necessidade da escritura de únicos herdeiros mencionada neste artigo. O espólio poderá ser representado pelo inventariante, desde que não seja dativo, ou pelo conjunto dos sucessores (…) Por fim, se, verificada a morte do notificando, não houver inventário em andamento ou concluído, e os sucessores se dispuserem a outorgar sua anuência expressa, nesse caso, e SOMENTE NESTE, far-seá necessária a escritura de únicos herdeiros” (“Manual da Usucapião Extrajudicial”, Ed. Clube de Autores, 2021).

      Em outras palavras, a escritura de únicos herdeiros somente se faz necessária se, não havendo inventário aberto ou concluído, os sucessores do titular de domínio falecido desejarem anuir ao pedido. Nas demais situações, como no caso concreto, mostra-se incabível a exigência.

      Logo, na hipótese em análise, demonstrada a inexistência de inventário em curso, impõe-se a notificação dos herdeiros da falecida titular de domínio do imóvel confrontante, comprovando-se tal condição.

      E, diferentemente do quanto consignado pelo MM. Juiz Corregedor na r. sentença recorrida, a efetivação da diligência deverá ser concretizada pelo Oficial de Registro.

      O que é preciso ressaltar, a rigor, é que, para cumprimento da diligência de notificação, compete aos requerentes da usucapião indicar, de forma inequívoca, quem são os herdeiros da falecida confrontante e seus endereços. Sem essa demonstração e sem a consequente tentativa de notificação, mostra-se prematura a requerida notificação por edital.

      Como está nos §§ 4º e 13 do art. 216-A da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (e também no Provimento CNJ 65/2017, arts. 11 e 16, e nas NSCGJ, II, XX, itens 418.16 e 418.21), no processo extrajudicial de usucapião a notificação por edital é cabível para a ciência (a) de terceiros eventualmente interessados e (b) de notificandos que não tenham sido encontrados, ou que estejam em lugar incerto ou não sabido.

      Tampouco é o caso de aplicação do § 10 do art. 10, do Provimento nº 65/2017 e do item 418.10 do Capítulo XX do Tomo II das NSCGJ, que autorizam a dispensa de notificação dos confrontantes na hipótese de descrição precisa e perfeita identidade entre a descrição tabular e a área objeto do requerimento da usucapião extrajudicial.

      Assim se afirma, pois a área usucapienda é descrita, conforme memorial, com total de 125,00m², denominado lote 16-A, quadra C (fls. 23), sendo a descrição tabular de área maior sobre o qual recai o pedido, a matrícula nº 43.514 do Registro de Imóveis da Comarca de Poá/SP, em que consta 278,20m² (fls. 26).

      Nesse cenário, sem a indicação, pelos interessados, da qualificação dos herdeiros da confrontante falecida, bem como a comprovação dessa condição, não há como prosseguir no presente procedimento de usucapião extrajudicial, sendo de rigor a manutenção da procedência da dúvida suscitada, ainda que por outro fundamento.

      Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

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