TJSP – CSM – Impugnação ao registro de loteamento – Artigo 19, §1º, da Lei n.6.766/79 – Verificação de patrimônio suficiente para lastrear as dívidas dos antigos proprietários – Inexistência de potencial prejuízo aos adquirentes dos lotes.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1001229-10.2023.8.26.0539

      Registro: 2024.0000118346

      ACÓRDÃO 

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001229-10.2023.8.26.0539, da Comarca de Santa Cruz do Rio Pardo, em que é apelante MURILO SCATAMBURLO, são apelados JT – LOTEADORA E INCORPORADORA LTDA e OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SANTA CRUZ DO RIO PARDO.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 16 de fevereiro de 2024.

      FRANCISCO LOUREIRO

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL nº 1001229-10.2023.8.26.0539

      APELANTE: Murilo Scatamburlo

      APELADOS: Jt – Loteadora e Incorporadora Ltda e Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Santa Cruz do Rio Pardo

      VOTO Nº 43.008

      Registro de imóveis – Impugnação ao registro de loteamento – Artigo 19, §1º, da Lei n.6.766/79 – Verificação de patrimônio suficiente para lastrear as dívidas dos antigos proprietários – Inexistência de potencial prejuízo aos adquirentes dos lotes – Registro autorizado nos termos do artigo 18, §2º, da Lei n.6.766/79 – Recurso não provido.

      Trata-se de recurso de apelação interposto por Murilo Scatamburlo contra a r. sentença de fls. 1837/1845, proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Santa Cruz do Rio Pardo, a qual rejeitou impugnação apresentada nos termos do artigo 19, §1º, da Lei n.6.766/79, e autorizou o registro do loteamento denominado “Jardim América II” no imóvel objeto da matrícula n.40.009 daquela serventia (prenotação n. 183.338).

      A conclusão foi de que as ações judiciais apontadas pelo impugnante não representam risco de prejuízo aos futuros adquirentes dos lotes, uma vez que os antigos proprietários do imóvel loteado, bem como a empresa JT Loteadora e Incorporadora Ltda, que está promovendo o loteamento, possuem bens e/ou rendimentos suficientes para o pagamento de suas dívidas.

      O recorrente alega, em resumo, que é credor dos sócios da empresa loteadora no processo de autos n. 1000152-44.2015.8.26.0539 em valor superior a um milhão de reais, o qual pode ser dobrado se provido recurso especial pendente de julgamento; que os devedores transmitiram o imóvel da matrícula n.25.239 e não possuem patrimônio para o pagamento da dívida; que o sócio Claiton tem pendências de mais de cinco milhões de reais e já teve penhorada sua parte no faturamento da empresa loteadora; que declarações unilaterais do contador sobre o faturamento não são suficientes para demonstrar a higidez financeira da empresa, sendo necessária apresentação de extratos bancários; que houve alegação de fraude à execução e contra credores em virtude da alienação do imóvel da matrícula n.25.239, o que pode afetar o domínio do imóvel loteado; que a comercialização de lotes para terceiros de boa-fé representa risco à satisfação dos credores, de modo que o registro do loteamento deve ser indeferido (fls. 1851/1855).

      A empresa loteadora apresentou contrarrazões, requerendo, preliminarmente, o indeferimento de efeito suspensivo ou a concessão de liminar para registro imediato do loteamento, o que foi indeferido (fls.1856/1861, 1871, 1874/1883 e 1894/1895).

      No mérito, defendeu a manutenção da sentença, que analisou minuciosamente a farta documentação apresentada. Aduziu, ainda, que os devedores possuem bens suficientes para satisfação das dívidas, inexistindo risco de inadimplemento; que foi demonstrada a realização de diversos depósitos no processo de autos n.1000152-44.2015.8.26.0539, suficientes para amortização substancial da condenação imposta, sendo que a parte credora ainda não iniciou o cumprimento da sentença; que os limites subjetivos da ação revocatória de autos n.1000039-46.2022.8.26.0539 impedem que seu resultado afete o imóvel loteado ou os futuros adquirentes; que as execuções movidas contra o sócio Claiton não atingem a cifra apontada pelo apelante; que sua situação financeira é capaz de suportar eventuais débitos que exacerbem o patrimônio dos sócios, sendo que o registro do loteamento aumentará ainda mais a garantia de satisfação dos débitos (fls.1874/1883).

      A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 1902/1904).

      É o relatório.

      Decido.

      De início, vale anotar que, para o registro de loteamento, a lei exige a apresentação de certidões negativas de débitos tributários e de ações reais relativas ao imóvel, bem como certidões de protesto e de ações cíveis em nome do loteador e de todos aqueles que tenham sido titulares de direitos reais sobre o imóvel no período de dez anos, com a finalidade de se verificar eventual repercussão econômica ou afetação do imóvel objeto do loteamento (artigo 18, III e IV, da Lei n.6.766/1979, e itens 176 e 177, Cap. XX, das NSCGJ).

      Com efeito, o artigo 18 da Lei n.6.766/79 dispõe:

      “Art. 18, § 2° – A existência de protestos, de ações pessoais ou de ações penais, exceto as referentes a crime contra o patrimônio e contra a administração, não impedirá o registro do loteamento se o requerente comprovar que esses protestos ou ações não poderão prejudicar os adquirentes dos lotes. Se o Oficial do Registro de Imóveis julgar insuficiente a comprovação feita, suscitará a dúvida perante o juiz competente”.

      No caso concreto, embora o Oficial de Registro de Imóveis tenha entendido pela existência de patrimônio suficiente para o pagamento das dívidas e viabilidade do registro do loteamento na matrícula n.40.009, remeteu o caso ao Juiz Corregedor Permanente para análise da impugnação apresentada pelo ora recorrente, como determina o artigo 19, §1º, da Lei n.6.766/79.

      O Corregedor Permanente acompanhou o entendimento do Oficial de Registro de Imóveis e, após analisar detidamente todas as ações apontadas pelo impugnante, confrontando a vasta documentação produzida, rejeitou a impugnação e autorizou o registro.

      No mérito, o recurso não comporta provimento.

      Como se extrai das razões da apelação, a principal preocupação do recorrente é com o recebimento de crédito havido em face dos sócios da empresa loteadora, que foram condenados ao pagamento de indenização no processo de autos n.1000152-44.2015.8.26.0539.

      Neste primeiro ponto, é importante destacar que o Conselho Superior da Magistratura já analisou os reflexos da referida condenação sobre os adquirentes do Loteamento Jardim América, implantado anteriormente pela mesma empresa loteadora no imóvel da matrícula n.8.148 do Registro de Imóveis de Santa Cruz do Rio Pardo (Apelação n.1000036-33.2018.8.26.0539, fls. 1253/1260).

      Naquela época, o registro do primeiro loteamento foi obstado pelo Registrador, que entendeu não haver comprovação de patrimônio da loteadora suficiente para garantir eventual condenação.

      O acórdão, proferido em novembro de 2018, analisou o litígio, constatando que os sócios da empresa loteadora foram condenados ao pagamento de duzentos e cinquenta mil reais e que não havia risco de insolvência, bem como observando que, no caso, não se cuidava de ação real e não havia determinação de bloqueio da matrícula a impedir a livre alienação de lotes. Assim, o julgamento foi pelo provimento do recurso, o que viabilizou o registro daquele primeiro loteamento.

      Desde então, a situação dos litigantes no processo de autos n.1000152-44.2015.8.26.0539 pouco se alterou: o julgamento dos recursos interpostos confirmou a condenação dos sócios da empresa loteadora no valor de duzentos e cinquenta mil reais, bem como o afastamento das indenizações por lucros cessantes, danos materiais e morais, sendo a sentença reformada apenas nos tópicos referentes aos honorários de sucumbência e à restituição da comissão de corretagem (fls.1564/1583). O recurso especial ainda pendente de julgamento apenas envolve a questão da devolução dobrada das arras, nos termos do artigo 418 do Código Civil.

      Por outro lado, a apelada indica a realização de diversos depósitos judiciais omitidos pelo recorrente, os quais garantem a satisfação de mais da metade do crédito atualizado, ainda que não se tenha iniciado o cumprimento provisório da sentença (fls.1702/1703 e 1884/1885).

      Com base na condenação alcançada no processo de autos n.1000152-44.2015.8.26.0539, o impugnante promoveu ação revocatória que tramita sob n.1000039-46.2022.8.26.0539, na qual pretende o reconhecimento da ocorrência de fraude contra credores, com anulação do desdobro da matrícula n.25.239 e da venda de suas parcelas ou declaração de ineficácia da venda por ter sido realizada em fraude às execuções de autos n.1005988-71.2013.8.26.0020 e 1004239- 96.2015.8.26.0004 (fls.759/926).

      Para a exata compreensão dos fatos, convém transcrever a evolução dos registros envolvidos desde a matrícula n.25.239 até o registro atual tal como consta da sentença (fls.1840/1841):

      “O imóvel objeto do loteamento originou-se da matrícula n.25.239, que pertencia aos sócios Maria Apparecida (fração ideal de 25%), Roselene (fração ideal de 25%) e Claiton (fração ideal de 50%) (fls.1.424/1.429).

      Por escritura pública de compra e venda lavrada aos 11.01.2018, os proprietários destacaram do aludido imóvel a área de 4,90 hectares e alienaram à MÁRIO SÉRGIO MANFRIN e sua esposa MARIA CRISTINA REINA MANFRIM, ÉRIK LEONARDO MANFRIM e sua esposa VANESKA RODRIGUES PEGORER MANFRIM (fls.1.410/1416), originando a matrícula n.38.190 (fls.1.430/1.432).

      A área remanescente (9,7866 hectares) deu origem à matrícula n.38.191 e foi alienada, em 10.04.2018, à JT LOTEADORA E INCORPORADORA LTDA (fls.1.417/1.423), que, por sua vez, desmembrou o imóvel em dois distintos, ensejando a abertura das matrículas nºs: 39.146 (9,701872 hectares) e 39.147 (0,84728 hectares) (fls.1.433/1.438).

      Por escritura pública de compra e venda lavrada aos 18.12.2018, a proprietária JT LOTEADORA vendeu o imóvel de matrícula n.39.147 a MÁRIO SÉRGIO MANFRIM e sua esposa MARIA CRISTINA REINA MANFRIM, ÉRIK LEONARDO MANFRIM e sua esposa VANESKA RODRIGUES PEGORER MANFRIM (fls.1.439).

      Já o imóvel de matrícula n.39.146 foi unificado ao de matrícula nº 40.007, por contíguos e pertencentes à JT LOTEADORA, motivo pelo qual foi aberta a matrícula nº 40.009, em que registrado o imóvel objeto do loteamento”.

      Nesse contexto, observados os limites subjetivos impostos pelo artigo 506 do Código de Processo Civil, a coisa julgada derivada da ação revocatória não pode atingir a empresa JT Loteadora e Incorporadora Ltda, já que promovida apenas contra os antigos proprietários e contra os adquirentes Mário Sérgio, Maria Cristina, Érik e Vaneska. Assim, como bem ressaltado pelo Corregedor Permanente, na hipótese de procedência, apenas o imóvel da matrícula n.38.190 retornará ao patrimônio dos antigos proprietários, aumentando a garantia dos credores, sem interferir no loteamento que se pretende implantar no imóvel da matrícula n.40.009.

      Da mesma forma, as demais ações movidas exclusivamente em face do antigo proprietário Claiton não têm o condão de atingir o imóvel que se pretende lotear.

      Conforme detalhadamente apurado pela sentença recorrida, a execução de autos n.1029030-36.2018.8.26.0001 e a ação monitória de autos n.1000807-40.2020.8.26.0539 foram distribuídas posteriormente à aquisição do imóvel pela empresa loteadora.

      O mesmo se aplica às execuções de autos n.1005988-71.2013.8.26.0020 e n.1004239-96.2015.8.26.004, nas quais a citação de Claiton ocorreu posteriormente à transmissão da propriedade do imóvel. Nesses casos, verifica-se que Claiton não é o único devedor e a penhora de sua parte nos lucros da empresa JT Loteadora não interfere no patrimônio da pessoa jurídica, que terá seu faturamento incrementado com o desenvolvimento do novo loteamento.

      As dívidas de Claiton correspondentes às execuções fiscais de autos n. 0017998-83.2013.4.03.6182 e n.0049663-98.2005.4.03.6182 foram parceladas, o que se confirma pela certidão positiva com efeitos de negativa relativa aos débitos federais (fls.1024/1029, 1748/1754 e 1755), sendo que a segunda execução também está garantida pela penhora dos imóveis das matrículas n.58.660 e 58.661 do 3º Registro de Imóveis da Capital (fls.1.186/1.196)

      Ademais, houve demonstração acerca do patrimônio imobiliário dos antigos proprietários em montante suficiente para satisfação de todas as dívidas identificadas, o que foi detalhadamente apontado na r. sentença recorrida, sem qualquer questionamento no recurso apresentado.

      Por outro lado, não há indício de falsidade no faturamento declarado pela pessoa jurídica, sendo inviável realizar, nesta estreita via administrativa, investigação minuciosa de seu movimento contábil mediante apresentação de documentos fiscais e bancários protegidos por sigilo legal, sobretudo quando medidas preventivas concretas, embora possíveis, ainda não tenham sido adotadas em relação ao imóvel loteado, como bem destacado pela Douta Procuradoria Geral da Justiça (fls.1902/1904).

      Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

      FRANCISCO LOUREIRO

      Corregedor Geral da Justiça e Relator 

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