TJSP – CSM – Registro de carta de sentença – Acordo em separação judicial – Partilha de imóvel comum, com doação aos filhos e reserva de usufruto à mulher – Desnecessidade de Escritura Pública de doação.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1001054-12.2022.8.26.0584

      Registro: 2024.0000118345

      ACÓRDÃO 

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001054-12.2022.8.26.0584, da Comarca de São Pedro, em que é apelante ESPÓLIO DE CLAUDIA DOS SANTOS LIMA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SÃO PEDRO.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento, v u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 16 de fevereiro de 2024.

      FRANCISCO LOUREIRO

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL Nº 1001054-12.2022.8.26.0584

      APELANTE: Espólio de Claudia dos Santos Lima

      APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de São Pedro

      VOTO Nº 43.007

      Registro de imóveis  Dúvida julgada procedente  Registro de carta de sentença  Acordo em separação judicial  Partilha de imóvel comum, com doação aos filhos e reserva de usufruto à mulher  Desnecessidade de Escritura Pública de doação – Óbice afastado – Apelação provida para autorizar o registro.

      Trata-se de recurso de apelação interposto por Espólio de Cláudia dos Santos Lima Sobral contra a r. sentença de fls. 143/144, proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Pedro, que julgou “improcedente” a dúvida suscitada pelo Oficial e manteve a recusa em se proceder ao registro de carta de sentença expedida de ação de separação judicial consensual (processo de autos n. 0001592-79.2000.8.26.0584), em que houve partilha do imóvel descrito na matrícula n. 34.540 daquela serventia (prenotação n. 127.726).

      Fê-lo a r. sentença, basicamente, diante da ausência de certeza existente no texto do acordo homologado, o qual não evidencia efetiva transferência da propriedade aos filhos do casal nem reserva de usufruto em favor da mulher (fls. 05/15 e 59/62).

      Manifestação do Oficial às fls. 01/03, no sentido de que necessária escritura pública de doação para formalização adequada da vontade das partes, na forma da nota devolutiva de fls. 119.

      Apela a parte suscitada alegando que solicitou ao Oficial averbação da separação do casal proprietário, Ricardo e Cláudia, e registro da partilha do imóvel da matrícula n. 34.540, conforme carta de sentença extraída de ação de separação judicial (processo de autos n. 0001592-79.2000.8.26.0584); que a exigência deve ser afastada, na medida em que a sentença judicial homologatória do acordo celebrado na separação torna desnecessária a formalização da vontade já declarada por escritura pública; que a interpretação jurídica dos termos da avença evidencia a transferência do imóvel comum aos filhos, com reserva de usufruto à mulher, a qual não é mais relevante na medida em que Cláudia já faleceu.

      A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento da apelação (fls. 173/176).

      É o relatório.

      Decido.

      Por primeiro, vale notar que, embora a dúvida suscitada tenha sido julgada improcedente, o comando judicial foi pela manutenção do óbice.

      No mérito, o recurso comporta provimento, respeitado o entendimento do MM. Juiz a quo. Vejamos os motivos.

      O Oficial dispõe de autonomia no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (art. 28 da Lei n. 8.935/1994).

      Em outras palavras, o Oficial, quando da qualificação, perfaz exame dos elementos extrínsecos do título à luz dos princípios e normas do sistema jurídico (aspectos formais), devendo obstar o ingresso daqueles que não se atenham aos limites da lei.

      Esta conclusão se reforça pelo fato de que vigora, para os registradores, ordem de controle rigoroso do recolhimento do imposto por ocasião do registro do título, sob pena de responsabilidade pessoal (artigo 289 da Lei n. 6.015/73; artigo 134, VI, do CTN e artigo 30, XI, da Lei 8.935/1994), bem como pelo disposto pelo item 117 do Cap. XX das Normas de Serviço:

      “Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular,quer em atos judiciais”.

      Há que se ressaltar, ainda, que os títulos judiciais também dependem de qualificação para ingresso no fólio real, sendo que o Egrégio Conselho Superior da Magistratura já decidiu que a qualificação negativa não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação Cível n.413-6/7).

      Neste sentido, ainda, a Ap. Cível nº 464-6/9, de São José do Rio Preto:

      “Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal. O exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental”.

      Não há dúvidas, portanto, de que a origem judicial não basta para garantir ingresso automático dos títulos no fólio real, cabendo ao delegatário qualificá-los em consonância com os princípios e as regras que regem a atividade registral.

      No caso concreto, o Oficial entendeu pela recusa de registro da carta de sentença em virtude da necessidade de formalização da vontade das partes por escritura pública, já que o acordo celebrado contém termos dúbios, que não possibilitam conclusão inequívoca sobre a sua real intenção (fls. 01/03 e 119).

      Contudo, da leitura da avença em questão, não resta dúvida de que a vontade do casal foi a de transferir gratuitamente o imóvel de propriedade comum para os filhos (doação) por ocasião de sua separação, com reserva de usufruto à mulher (fls. 05/15).

      Embora mediante a utilização de termos simples, como o imóvel “fica” (e não é doado ou transferido) e “uso e fruto” (e não usufruto), a intenção das partes resta clara e evidente diante do fim do casamento: regularização da propriedade em favor dos filhos e proteção da mulher, com garantia de uso e gozo do bem até a morte.

      Note-se que a vontade manifestada é tão clara que sequer promessa, a qual se distingue da formalização de seu objeto, permitindo arrependimento, é identificada no texto.

      E, ainda que houvesse, dadas as peculiaridades da partilha ajustada em separações e divórcios, cuja finalidade é a dissolução pacificada e a contento da sociedade conjugal, haveria que se reconhecer verdadeiro pacto concretizado com relação ao ato prometido.

      Essa é a orientação atual do C. Superior Tribunal de Justiça, da qual destacamos o seguinte julgado:

      “RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. DIVÓRCIO CONSENSUAL. PARTILHA DE BENS. ACORDO. DOAÇÃO AOS FILHOS. HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL. SENTENÇA COM EFICÁCIA DE ESCRITURA PÚBLICA. FORMAL DE PARTILHA. REGISTRO NO CARTÓRIO DE IMÓVEIS. POSSIBILIDADE. 1. Não constitui ato de mera liberalidade a promessa de doação aos filhos como condição para a realização de acordo referente à partilha de bens em processo de separação ou divórcio dos pais, razão pela qual pode ser exigida pelos beneficiários do respectivo ato. 2. A sentença homologatória de acordo celebrado por excasal, com a doação de imóvel aos filhos comuns, possui idêntica eficácia da escritura pública. 3. Possibilidade de expedição de alvará judicial para o fim de se proceder ao registro do formal de partilha. 4. Recurso especial provido” (REsp n. 1.537.287/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 18/10/2016, DJe de 28/10/2016).

      Em outras palavras, também extraídas de precedente da Corte Superior, há “tese pacificada pela Segunda Seção no sentido da validade e eficácia do compromisso de transferência de bens assumidos pelos cônjuges na separação judicial, pois, nestes casos, não se trataria de mera promessa de liberalidade, mas de promessa de um fato futuro que entrou na composição do acordo de partilha dos bens do casal” (REsp n. 1.355.007/SP, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 27/6/2017, DJe de 10/8/2017).

      Na esteira desse entendimento, já se pronunciou o E. Conselho Superior da Magistratura, afastando a obrigatoriedade de se lavrar escritura pública em hipótese semelhante à dos autos:

      “Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente, impedindo-se o registro de Carta de Sentença, oriunda de separação judicial, com doação de imóvel a filha menor – Desnecessidade de escritura pública – Precedentes – Desnecessidade de aceitação da donatária (art. 543 do Código Civil) – Não incidência de emolumentos, por haver gratuidade expressamente exposta no título  Necessidade, contudo, de recolhimento dos tributos  Dúvida prejudicada e recurso não conhecido” (TJSP; Apelação Cível 1000762-62.2014.8.26.0663; Relator (a): Pereira Calças; Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro de Votorantim – 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 24/05/2016; Data de Registro: 15/09/2016).

      Note-se que tal solução em nada conflita com outros precedentes do E. CSM, que versam sobre casos em que havia expressa menção quanto à necessidade de escritura pública no próprio acordo de partilha dos cônjuges (Apelação nº 1002967-74.2019.8.26.0506, j. em 16/03/2020, e Apelação nº 1001280-43.2020.8.26.0404, j. em 13/05/2021, nas quais figurou como Relator o Des. Ricardo Anafe, então Corregedor Geral da Justiça).

      Não bastasse tudo isso, observa-se que Cláudia já faleceu (fls. 108/109), o que impediria nova manifestação de vontade, caso se mantivesse a exigência do Oficial.

      Não resta dúvida, portanto, de que o óbice não subsiste.

      Vale salientar, por fim, que, a despeito de o título dispensar escritura pública de doação, o recolhimento tributário devido deverá ser fiscalizado pelo Oficial, na forma da lei.

      Diante do exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação para julgar improcedente a dúvida e autorizar o registro do título, observado o recolhimento de eventual imposto de transmissão devido.

      FRANCISCO LOUREIRO

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

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