TJSP – CSM – Escritura pública de doação – Desqualificação – Descrição precária do imóvel que não permite identificá-lo – Ausência de registro anterior – Impossibilidade de abertura de matrícula.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1000216-29.2021.8.26.0059

      Registro: 2023.0000511106

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000216-29.2021.8.26.0059, da Comarca de Bananal, em que é apelante TELEFÔNICA BRASIL S/A, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE BANANAL.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 16 de junho de 2023.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL Nº 1000216-29.2021.8.26.0059

      APELANTE: Telefônica Brasil S/A

      APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da comarca de Bananal

      VOTO Nº 39.007

      Registro de imóveis – Escritura pública de doação – Desqualificação – Descrição precária do imóvel que não permite identificá-lo – Ausência de registro anterior – Impossibilidade de abertura de matrícula e registro do título por ofensa ao princípio da especialidade objetiva – Apelação a que se nega provimento.

      Trata-se de apelação interposta por Telefônica Brasil S.A. em face da r. sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de Bananal, que julgou procedente a dúvida suscitada e manteve a recusa do registro da escritura pública de doação lavrada no 9º Tabelião de Notas de São Paulo, aos 11 de maio de 1966, no livro 714, fls. 100, referente ao imóvel localizado na praça Rubião Junior, na cidade de Bananal (fls. 193/194).

      Afirma a apelante, em síntese, que o título apresentado não carece de qualquer retificação (como exigido pelo Oficial de Registro de Imóveis), pois ainda não foi aberta matrícula para o imóvel doado, o que justamente deverá ser feito por ocasião do registro da escritura pública de doação (fls. 221/225).

      A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 249/251).

      É o relatório.

      O registro da escritura pública de doação foi negado pelo Oficial, que expediu nota de devolução nos seguintes termos (fls. 12):

      “1-) Apresentação de certidão da escritura de doação devidamente legível;

      2-) Retificação da escritura para constar o número da transcrição/matrícula do imóvel objeto da doação para que a mesma seja devidamente qualificada (artigo 222 da Lei 6.015/73)”.

      Cumprida a exigência elencada no item 1 e diante da afirmada impossibilidade de cumprimento daquela descrita no item 2 da nota devolutiva, os apresentantes pugnaram pela suscitação da dúvida. Suscitada a dúvida, o Oficial apontou outros óbices ao ingresso do título: a) descrição detalhada do imóvel (artigo 225 da Lei nº 6.015/1973); b) número de inscrição no Cadastro Geral de Contribuintes do Ministério da Fazenda da doadora e donatária (artigo 176, II, 4, b, da Lei nº 6.015/1973); c) número do registro anterior (artigo 176, II, 5, da Lei nº 6.015/1973); e d) designação cadastral (item 57, I, c, Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça).

      De antemão, impede consignar que ao Registrador cabe examinar, de forma exaustiva, o título apresentado e, havendo exigências de qualquer ordem, estas deverão ser formuladas de uma só vez (artigo 198 Lei nº 6.015/1973), não no curso do processo de dúvida.

      Entretanto, não se pode olvidar que tanto o MM. Juiz Corregedor Permanente quanto este Colendo Conselho Superior da Magistratura, ao apreciar as questões postas no processo de dúvida, devem requalificar o título por completo. A qualificação do título realizada no julgamento da dúvida é devolvida por inteiro ao órgão para tanto competente, sem que disso decorra decisão extra ou ultrapetita ou violação do contraditório e ampla defesa, como decidido por este órgão colegiado na Apelação Cível nº 33.111-0/3, da Comarca de Limeira, em v. acórdão de que foi Relator o Desembargador MÁRCIO MARTINS BONILHA:

      “Inicialmente, cabe ressaltar a natureza administrativa do procedimento da dúvida, que não se sujeita, assim, aos efeitos da imutabilidade material da sentença. Portanto, nesse procedimento há a possibilidade de revisão dos atos praticados, seja pela própria autoridade administrativa, seja pela instância revisora, até mesmo de ofício (cf. Ap. Civ. 10.880-0/3, da Comarca de Sorocaba). Não vai nisso qualquer ofensa ao direito de ampla defesa e muito menos se suprime um grau do julgamento administrativo. O exame qualificador do título, tanto pelo oficial delegado, como por seu Corregedor Permanente, ou até mesmo em sede recursal, deve necessariamente ser completo e exaustivo, visando escoimar todo e qualquer vício impeditivo de acesso ao cadastro predial. Possível, portanto, a requalificação do título nesta sede, ainda que de ofício, podendo ser levantados óbices até o momento não argüidos, ou ser reexaminado fundamento da sentença, até para alteração de sua parte dispositiva” (in “Revista de Direito Imobiliário”, 39/339).

      Nesse cenário, a irregularidade verificada não impede o prosseguimento do feito e tampouco a análise do presente recurso, o qual, no entanto, não comporta acolhimento.

      Analisado o título apresentado (fls. 06/09), datado do ano de 1966, o imóvel está descrito da seguinte forma:

      “É proprietária de um terreno situado na praça Rubião Junior, no município de Bananal, deste Estado, livre e desembaraçado de quaisquer ônus, dívidas ou duvidas, medindo 14 (catorze) metros de frente para a referida praça Rubião Junior, 19 (dezenove) metros, da frente aos fundos, do lado direito de quem olha para o terreno; 12 (doze) metros da frente aos fundos, do lado esquerdo e 16 (dezesseis) metros, aproximadamente nos fundos, confrontando de ambos os lados, com terrenos dela doadora, e nos fundos com o córrego Lavapés, tendo a frente, inicio a uma distância de seis metros contados de uma mureta de pedra, divisória do terreno no qual está construído o Fórum local e encerrando a área aproximada de 217 metros quadrados; terreno esse, havido pela outorgante em data de 1.841”.

      Importante lembrar que o Registro de Imóveis, com a função de transcrever aquisições imobiliárias e inscrever ônus reais, instituiu-se, no Brasil, pela Lei nº 1.237/1864, regulamentada pelo Decreto nº 3.453/1865. Anteriormente, com o fim restrito e exclusivo de somente inscrever hipotecas, criou-se, pela Lei Orçamentária nº 317/1843, o Registro Hipotecário.

      Como o bem imóvel foi havido pela doadora no ano de 1841, sequer existia à época o sistema de transcrições e inscrições; ou seja, o imóvel doado não se encontra matriculado nem foi objeto de transcrição, como informado pela apelante.

      Logo, as exigências atinentes ao número da matrícula ou transcrição não se sustentam, observado, ainda, que a referente ao cadastro municipal é facultativa (o qual remanesceu informado por ocasião da impugnação cadastro nº 01.01.038.0127.001 fls. 56/59) e à dos números de inscrição no Cadastro Geral de Contribuintes do Ministério da Fazenda poderia ser superada com a apresentação dos correspondentes documentos (mitigação do princípio da especialidade subjetiva artigo 176, §17, da Lei nº 6.015/1973).

      Contudo, o que se alça como verdadeiro obstáculo ao acesso do título à tabua registral é a precariedade da descrição imobiliária na escritura pública, agravada pelo fato de o imóvel ter ficado à margem de qualquer sistema registral.

      A descrição, tal como posta no título, não permite a perfeita identificação do imóvel para que seja autorizada a abertura de matrícula e, a seguir, registrado o título aquisitivo.

      A perfeita identificação do imóvel é requisito da abertura de matrícula (especialidade objetiva) em consonância com o disposto no artigo 176, §1º, II, 3, b, da Lei nº 6.015/1973:

      “Art. 176 – O Livro nº 2 – Registro Geral – será destinado, à matrícula dos imóveis e ao registro ou averbação dos atos relacionados no art. 167 e não atribuídos ao Livro nº 3.

      §1º – A escrituração do Livro nº 2 obedecerá às seguintes normas:

      I – cada imóvel terá matrícula própria, que será aberta por ocasião do primeiro ato de registro ou de averbação caso a transcrição possua todos os requisitos elencados para a abertura da matrícula;

      II – são requisitos da matrícula:

      (…)

      3) a identificação do imóvel, que será feita com indicação:

      (…)

      b) se urbano, de suas características e confrontações, localização, área, logradouro, número e de sua designação cadastral, se houver”.

      E como dispõe o artigo 176, §15, da mesma lei:

      “§15. Ainda que ausentes alguns elementos de especialidade objetiva ou subjetiva, desde que haja segurança quanto à localização e à identificação do imóvel, a critério do oficial, e que constem os dados do registro anterior, a matrícula poderá ser aberta nos termos do § 14 deste artigo”.

      No mesmo sentir, as Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, em seu item 57 do inciso IV do Capítulo XX, disciplina:

      “57. A identificação e caracterização do imóvel compreendem:

      (…)

      IV – as confrontações, inadmitidas expressões genéricas, tais como ‘com quem de direito’, ou ‘com sucessores’ de terminada pessoas, que deve ser excluídas, se existentes no registro de origem, indicando-se preferencialmente os imóveis confinantes e seus respectivos registros”.

      Desta forma, evidenciado que a descrição do imóvel constante da escritura pública não atende aos requisitos estabelecidos nos dispositivos legais e normativos referidos, para a própria segurança do registro imobiliário e dos efeitos dele irradiados e com a finalidade de preservar a especialidade registrária, inviável a abertura da matrícula e a inscrição do título no fólio real.

      Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

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