TJSP – CSM – Contrato particular de compra e venda – Valor atribuído ao bem negociado que dispensa escritura pública (artigo 108 do Código Civil) – Ingresso no fólio real obstado por violação ao princípio da continuidade.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1015117-03.2021.8.26.0576

      Registro: 2022.0000533618

      ACÓRDÃO 

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1015117-03.2021.8.26.0576, da Comarca de São José do Rio Preto, em que é apelante R.M.A. EMPRESA SIMPLES DE CRÉDITO EIRELLI, é apelado SEGUNDO OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO.

      ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 4 de julho de 2022.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL nº 1015117-03.2021.8.26.0576

      APELANTE: R.M.A. Empresa Simples de Crédito Eirelli

      APELADO: Segundo Oficial de Registro de Imóveis da comarca de São José do Rio Preto

      VOTO Nº 38.702

      Registo de Imóveis – Contrato particular de compra e venda – Valor atribuído ao bem negociado que dispensa escritura pública (artigo 108 do Código Civil) – Ingresso no fólio real obstado por violação ao princípio da continuidade – Vendedor que figura como compromissário comprador no ofício imobiliário, não como titular do domínio – O título de transmissão do imóvel só pode ter ingresso e dar causa a um registro ‘stricto sensu’ se nele constarem, como afetados, os titulares dominiais – Dever do Oficial de fiscalizar o recolhimento dos impostos devidos por força dos atos que lhe forem apresentados em razão do ofício – Dúvida procedente – Apelação a que se nega provimento.

      Trata-se de apelação interposta por R.M.A. Empresa Simples de Crédito – EIRELI contra a r. sentença, proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo 2º Oficial de Registros de Imóveis da Comarca de São José do Rio Preto, mantendo a recusa ao registro do instrumento particular de compra e venda referente ao imóvel matriculado sob nº 91.223, da referida serventia extrajudicial (fls. 67/69).

      Aduz a apelante, em síntese, que a exigência posta quanto à outorga da escritura pública relativa ao negócio antecedente – compromisso de compra e venda – e seu consequente registro como condição para o posterior registro do contrato de compra e venda apresentado não se justifica e sequer encontra amparo legal, de modo que deve ser autorizado o ingresso do título na tábua registral para salvaguardar os interesses dos envolvidos e até mesmo de terceiros. No mais, insurge-se contra o r. decisório sob o argumento de que desbordou do que foi exigido e motivou a suscitação da dúvida registral (fls. 78/91).

      A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 112/115).

      É o relatório.

      Pretende a recorrente o registro do contrato particular de compra e venda referente ao imóvel matriculado sob nº 91.223 do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São José do Rio Preto.

      O Oficial encontrou óbice ao registro, nos seguintes termos (fls. 21):

      “Foi apresentado o recibo de pagamento referente ao compromisso de venda e compra registrado sob nº 3/91.223, todavia necessário a apresentação de escritura pública definitiva em nome do Edson Bertellini de Lima, isso porque referido documento não possui o efeito translativo da propriedade, situação a qual ocorre apenas quando o objeto do contrato é oriundo de loteamento registrado pelo loteador, conforme dispõe o artigo 26, §6º, da Lei 6766/79.

      Essa nota devolutiva está amparada pelo o processo 2014/35956, da Corregedoria Geral da Justiça, bem como pela Apelação Cível nº 0012160-45.2010.8.26.0604.

      Obs. Após o registro da escritura acima, o compromisso apresentado entre Edson e a firma RMA, poderá ser registrado, mas também após a quitação deverá também ser providenciado a escritura definitiva conforme já acima mencionado”.

      De acordo com o contrato celebrado, denominado instrumento particular de contrato de venda e compra de imóvel quitado, firmado em caráter irrevogável e irretratável, EdsonBertellini de Lima vendeu a RMA Empresa Simples de Crédito Eireli o box nº 97, localizado no 9º pavimento do Edifício Garagem Automática Hércules, situado na Rua Voluntários de São Paulo, nº 3.173, pelo valor de R$ 3.500,00, cujo preço foi pago à vista (fls. 22/24).

      Bem caracterizados os elementos necessários à configuração do contrato de compra e venda: coisa, preço e consentimento (artigo 482 do Código Civil).

      E devido ao valor atribuído ao bem negociado, inferior a 30 salários mínimos, desnecessária a escritura pública (artigo 108 do Código Civil).

      Definido, então, que se trata de compra e venda, não promessa de compra e venda ou cessão de promessa de compra e venda, para o ingresso do título no fólio real, em obediência ao princípio da continuidade, aquele que figurou como vendedor deve ostentar a condição de proprietário.

      Por força do princípio da continuidade, qualquer título de transmissão do imóvel só pode ter ingresso e dar causa a um registro stricto sensu se nele constarem, como afetados, referidos titulares de domínio.

      Entrementes, não é isso que sucede com o contrato de compra e venda em testilha, pois quem figurou como vendedor foi o compromissário comprador.

      Analisada a certidão da matrícula imobiliária (fls. 31/32), o vendedor Edson Bertellini de Lima é mero compromissário comprador (R.03), não titular dominial. José Ricardo FernandesSalomão e sua mulher Emilia Sorai Feres Pereira Salomão ainda ostentam a condição de proprietários (R.02).

      O contrato de compromisso de compra e venda, desde que irretratável e levado a registro, atribui tão somente o direito real de aquisição, nos termos dos artigos 1.417 e 1.418 do Código Civil.

      Daí a razão da exigência formulada para que, precedentemente ao registro do contrato particular de compra e venda, fosse efetuado o registro do título aquisitivo de EdsonBertellini de Lima.

      Frise-se que, pelo princípio do trato consecutivo (ou da continuidade), como regra geral, só se admite a inscrição (registro stricto sensu ou averbação Lei nº 6.015/73, artigo 167, I e II)

      “daqueles actos de disposição em que o disponente coincide com o titular do direito segundo o registro” (Carlos Ferreira de Almeida, apud Ricardo Dip, Registro sobre Registros, nº 208).

      É o que diz a Lei nº 6.015/73:

      “Art. 195 Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro.

      Art. 237 Ainda que o imóvel esteja matriculado, não se fará o registro que dependa da apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a continuidade do registro”.

      Nas palavras de Afrânio de Carvalho (Registro de Imóveis, 3ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1982, p. 304):

      “O princípio de continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidades à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões que derivam umas das outras, asseguram sempre a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente”.

      Cabe notar, ainda, que, para o ingresso do título no registro imobiliário, observado que o Registrador tem o dever de fiscalizar o recolhimento dos impostos devidos por força dos atos que lhe forem apresentados em razão do ofício, sob pena de responsabilidade pessoal (artigo 289 da Lei nº 6.015/73), é imprescindível a comprovação do pagamento do imposto devido – ITBI – ou de sua não-incidência ou isenção, quer se trate da transmissão do domínio, quer se trate de cessão de direito do promitente comprador, na forma do direito local (Lei Complementar nº 323, de 27 de outubro de 2010, do Município de São José do Rio Preto).

      Nesse cenário, justifica-se a confirmação do juízo negativo de qualificação.

      Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator 

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