TJSP – CSM – Usucapião extrajudicial – Ausência de comprovação do lapso temporal legalmente exigido – Falta de demonstração de origem e tempo da posse.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1002759-63.2021.8.26.0363

      Registro: 2023.0000511138

      ACÓRDÃO 

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1002759-63.2021.8.26.0363, da Comarca de Mogi-Mirim, em que são apelantes SSAA ADMINISTRACAO DE BENS LTDA e MMCA ADMINISTRAÇÃO DE BENS LTDA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE MOGI-MIRIM.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 16 de junho de 2023.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL Nº 1002759-63.2021.8.26.0363

      APELANTES: Ssaa Administracao de Bens Ltda e Mmca Administração de Bens Ltda

      APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Mogi Mirim

      VOTO Nº 39.015

      Usucapião extrajudicial – Ausência de comprovação do lapso temporal legalmente exigido – Falta de demonstração de origem e tempo da posse – Certidões de distribuição só exigidas dos proprietários, qualidade não mais ostentada pela pessoa indicada pelo registrador – Mantido o óbice ao prosseguimento da usucapião – Recurso a que se nega provimento.

      Trata-se de recurso de apelação interposto por SSAA ADMINISTRAÇÃO DE BENS LTDA. e MMCAADMINISTRAÇÃO DE BENS LTDA. (fls. 448/467), em processo de dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Mogi Mirim, visando à reforma da r. sentença de fls. 437/442, que manteve a recusa de registro de usucapião extrajudicial da parte ideal de 33,3333% do imóvel de matrícula nº 5.455 daquela serventia.

      A nota devolutiva de fls. 379/381 contém, em suma, a seguinte motivação:

      “(…) a comprovação da posse ad usucapione[m] pelas requerentes é conditio sine qua non para o reconhecimento administrativo do pedido de usucapião extrajudicial, (…)

      (…) a exigência de apresentação de certidões negativas de distribuições cíveis e criminais decorre do Provimento nº. 65/2017 – CNJ, do Conselho Nacional de Justiça (artigo 4, inciso IV e item 416.2, inciso IV, do Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo), que estabelece diretrizes para o procedimento da usucapião extrajudicial, não competindo a este Oficial afastar a sua aplicação.

      Assim, se faz necessária a apresentação das certidões negativas dos distribuidores cíveis da Justiça Estadual e da Justiça Federal do local da situação do imóvel usucapiendo, expedidas nos últimos trinta (30) dias, demonstrando a inexistência de ações que caracterizem oposição à posse do imóvel, em nome de MARY LEWIS KAMMERER, cônjuge de Daniel McCarthy Kammerer apontada no R.04/M.5.455, deste Registro (fls. 251).

      (…) De acordo com a petição de fls. 211/221, foi apontada como MODALIDADE DA USUCAPIÃO a USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. De acordo com o artigo 1.238 da Lei 10.406/2020 Código Civil brasileiro, NÃO se faz necessária a apresentação de JUSTO TÍTULO que demonstre a natureza possessória das requerentes, desde que seja comprovado o tempo de posse superior a 15 anos. Todavia, no que tange ao Procedimento de Usucapião Extrajudicial, o Provimento 65/2017 do CNJ, em seu artigo 4º, inciso III e o item 416.2., inciso III, do capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo, enseja a NECESSIDADE de que as requerentes apresentem justo título ou quaisquer outros documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a cadeia possessória e o tempo de posse referente à parte ideal de 33,3333%, pertencente ao condômino ANTÔNIO DE GODOY FILHO (CPF/MF 052.930.228-49) e sua mulher MARINA PONTE KAAM DE GODOY, uma vez que ainda são proprietários da parte ideal de 33,3333%, conforme consta do R.04/M.5.455, deste Registro.

      Destarte, não compete a este Oficial de Registro de Imóveis, em sede administrativa, resolver o conflito aparente de normas (disparidade entre a Lei 10.406/2002 Código Civil, entre o Provimento 65/2017 CNJ e entre o Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo), conforme restou apontado pelas requerentes a fls. 258/260, cabendo esta tarefa ao juízo competente.”

      As apelantes aduzem, em suma, que há prova da posse de 100% do imóvel na ata notarial de fls. 25/35, com o reconhecimento dos confrontantes, além de outros documentos acostados aos autos, e que não há amparo legal para a apresentação das certidões negativas de Mary Lewis Kammerer e seu cônjuge Daniel McCarthy Kammerer porque não são proprietários ou possuidores do imóvel. Por fim, quanto ao conflito entre o Código Civil e o Provimento nº 65/2017 do CNJ, no que se refere à exigência do justo título, dispensada pelo artigo 1.238 do Código Civil, mas exigida pelo artigo 4º do Provimento mencionado, alega que deve prevalecer o disposto no Código Civil, por ser norma superior à contida no provimento.

      A Procuradoria Geral de Justiça opina pelo não provimento do recurso (fls. 484/487).

      É o relatório.

      Trata-se de Usucapião Extraordinária, fundada em alegação de posse mansa e pacífica, há mais de vinte anos, sobre a totalidade do imóvel de matrícula nº 5.455 do Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de Mogi Mirim, consistente num terreno localizado no Parque da Empresa, à Avenida João Pinto, nº 1.011, na quadra “G”, com a área total de 9.847,11 metros quadrados, contendo um galpão industrial com a área de 381,25 metros quadrados, e outra edificação com a área de 82,55 metros quadrados, melhor descrito na correspondente certidão de matrícula, que ora se junta.

      Como consta da certidão de matrícula, o imóvel pertencia a três casais, e dois deles alienaram suas cotas partes aos sócios das apelantes, Miguel Henrique Moreno e esposa e Aprígio Sérgio Moreno e esposa, conforme escritura de compra e venda datada de 10 de dezembro de 2004 (registro 7).

      Deste modo, o imóvel permaneceu em condomínio entre referidos sócios e os anteriores proprietários, Antônio de Godoy Filho e sua esposa Marina Ponte Kaam de Godoy.

      Pelos registros 09 e 10, a parte ideal de 33,3333% pertencente a Aprígio Sérgio Moreno e sua mulher foi transmitida a título de conferência de bens à apelante SSAA ADMINISTRAÇÃO DE BENS LTDA., e a parte ideal de 33,3333% pertencente a Miguel Henrique Moreno e sua mulher foi transmitida a título de conferência de bens à apelante MMCA ADMINISTRAÇÃO DE BENS LTDA., respectivamente.

      Vê-se, portanto, que cada apelante é detentora da propriedade equivalente a 1/3 do imóvel da matrícula de nº 5.455.

      Permaneceu o restante 1/3 do imóvel na propriedade de Antônio de Godoy Filho e sua esposa Marina Ponte Kaam de Godoy.

      Apesar de as apelantes alegarem que exercem desde 10/12/2004 a posse exclusiva sobre a totalidade do imóvel, não há prova alguma nos autos neste sentido.

      A escritura pública lavrada em 10/12/2004, pela qual os sócios Miguel e Aprígio adquiriram 2/3 do imóvel em apreço não faz prova alguma da posse da totalidade do bem. O que a escritura comprova é o que ela contém, ou seja, a aquisição de 2/3 do imóvel por referidos sócios.

      A posterior conferência de bens a favor das apelantes também nada comprova a título de posse. A partir das conferências registradas na matrícula, cada apelante passou a deter 1/3 do imóvel, nada além.

      Em suma, a prova documental existente apenas comprova o condomínio existente sobre o imóvel, sendo 1/3 da titularidade de cada apelante e o 1/3 restante de propriedade de Antônio de Godoy Filho e sua esposa Marina Ponte Kaam de Godoy.

      A ação movida por Daniel McCarthy Kammerer contra Color Plastic Indústria e Comércio Ltda., autos de nº 0006165-76.2002.8.26.0363, que tramitou perante a 1ª Vara de Mogi Mirim-SP, em nada favorece as apelantes.

      Daniel McCarthy era um dos proprietários do imóvel desde 26 de julho de 1978 e até a alienação de sua cota parte aos sócios das apelantes em 10 de dezembro de 2004, como consta do registro de nº 07 junto à matrícula do bem.

      O fato de ter movido ação de despejo da totalidade do imóvel não causa espécie, já que era condômino do imóvel ao lado de outras pessoas, e não existe qualquer impedimento a que apenas um dos condôminos dê o imóvel em locação ou mesmo que promova a ação de despejo em caso de descumprimento dos deveres contratuais pelo locatário.

      Préstimo algum as apelantes gozam da locação invocada. A locação foi realizada pelo proprietário à época, e muito antes da venda feita aos sócios das apelantes e da transmissão a título de conferência de bens às recorrentes.

      Portanto, apesar da assertiva das recorrentes de que exercem a posse desde o ano de 2004 sobre a totalidade do imóvel, nenhum documento foi apresentado para demonstrar a alegação.

      A ata notarial contém concordância de confrontantes ao pedido de usucapião, com expressa menção de que reconhecem a posse do imóvel, sem oposição, por mais de 15 anos, mas se trata de mera declaração testemunhal sem a descrição da origem da posse, o que não atende às determinações do Provimento nº 65/2017, da Corregedoria Nacional de Justiça.

      O artigo 4º, III, do Provimento CNJ nº 65/2017 estabelece:

      “Artigo 4º. O requerimento será assinado por advogado ou por defensor público constituído pelo requerente e instruído com os seguintes documentos:

      (…)

      III – justo título ou quaisquer outros documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a cadeia possessória e o tempo de posse;”

      Ainda que a modalidade de usucapião invocada seja a extraordinária, o que dispensa a presença do justo título, era imprescindível que as apelantes trouxessem documentos hábeis a demonstrar a origem, a continuidade, a cadeia possessória e o tempo de posse, o que não se vê dos autos.

      Quanto à exigência de apresentação de certidões de distribuição em nome de Mary Lewis Kammerer, a exigência não se sustenta porque referida senhora não é mais proprietária do imóvel, como consta da certidão de matrícula, daí porque não há razão para a aplicação do disposto no artigo 216-A, inciso III, da Lei nº 6.015/1973 e no artigo 4º, inciso IV, alínea “b”, do Provimento nº 65/2017 da Corregedoria Nacional de Justiça.

      Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação, mantida a negativa de prosseguimento da usucapião extrajudicial.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

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