TJSP – CSM – Ingresso no fólio real obstado por violação ao princípio da continuidade – Carta de sentença que determina a transferência da propriedade por quem não é titular de domínio, apenas compromissário comprador.

    Receba gratuitamente a minha e-apostila!

    “10 Artigos Legais Essenciais para conhecer o Direito Notarial e Registral”

    Cadastre-se:



      Receba gratuitamente a minha e-apostila!

      “10 Artigos Legais Essenciais para conhecer o Direito Notarial e Registral”

      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1000717-23.2021.8.26.0272

      Registro: 2022.0000995295

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000717-23.2021.8.26.0272, da Comarca de Itapira, em que são apelantes ROSA MARIA PEREIRA DE MORAES e ANTONIO CARLOS PEREIRA DE MORAES, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE ITAPIRA.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 25 de novembro de 2022.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL nº 1000717-23.2021.8.26.0272

      APELANTES: Rosa Maria Pereira de Moraes e Antonio Carlos Pereira de Moraes

      APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Itapira

      VOTO Nº 38.846 

      Registro de imóveis – Dúvida julgada procedente – Ingresso no fólio real obstado por violação ao princípio da continuidade – Carta de sentença que determina a transferência da propriedade por quem não é titular de domínio, apenas compromissário comprador – Dever do oficial de fiscalizar o recolhimento dos impostos devidos por força dos atos que lhe forem apresentados em razão do ofício – Inexistência, ademais, de qualificação completa das partes – Ofensa ao princípio da especialidade subjetiva – Apelação a que se nega provimento.

      Cuida-se de recurso de Apelação interposto por Antonio Carlos Pereira de Moraes e Rosa Maria Pereira de Moraes em face da r. sentença de fls. 148/152 de lavra da MM.ª Juíza Corregedora Permanente do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Itapira, que julgou procedente a dúvida suscitada, negando o acesso ao registro imobiliário da carta de sentença extraída dos autos do processo nº 0002445-39.2009.8.26.0272 oriundo da 2ª Vara da Comarca de Itapira que tem por objeto o imóvel matriculado sob o nº 16.234.

      Da nota devolutiva de fls. 123, que qualificou negativamente o título, constaram as seguintes exigências:

      “Pelo R. 04 da matrícula nº 16.234, verifica-se que o imóvel foi compromissado a venda para CLÁUDIO LOURENÇO PALOMO e pela carta de sentença apresentada, a plena propriedade do referido imóvel foi objeto de transferência judicial, devidamente homologado por sentença, a ANTONIO CARLOS PEREIRA DE MORAES e sua mulher ROSA MARIA PEREIRA DE MORAES, como pagamento do contrato de cessão societária.

      Todavia, em cumprimento ao princípio da continuidade registrária, Cláudio Lourenço Palomo detém apenas o direito real à aquisição do imóvel, sendo necessário para poder transmitir a propriedade plena do referido imóvel, a outorga da escritura definitiva ou a adjudicação compulsória (art. 195 e 237 da Lei nº 6.015/73; c/c art. 1.417 e 1.418 do Código Civil).

      Ainda que não fosse o impedimento acima, seria necessário:

      Apresentar a guia do ITBI (Imposto de Transmissão de Bens Imóveis) devidamente recolhido (art. 2º, XXII e art. 14 da Lei Municipal nº 2.053 de 21/12/88; c/c art. 289 da Lei nº 6.015/73).

      Todas as partes do título devem estar devidamente qualificadas, ou seja, nacionalidade, profissão, RG e CPF bem como o estado civil, sendo casado, o regime de bens e se foi na vigência da lei nº 6.515/77 e o registro do pacto antenupcial, se caso for (art. 176, §1º, III, item 2, alínea “a” e “b”, da Lei nº 6.015/73; c/c item 63, cap. XX, das NSCGJSP).”

      Em suas razões os apelantes sustentam, em suma, ser desnecessária a lavratura de escritura pública da Sra. Ariane ao Sr. Cláudio, vez que habilitado a praticar todos os atos necessários à outorga de escritura pública a terceiros, por meio da procuração pública de fls. 121/122.

      A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 218/221).

      É o relatório.

      Cuida-se de registro de carta de sentença expedida pela 2ª Vara da Comarca de Itapira extraída dos autos do processo nº 0002445-39.2009.8.26.0272, cujo objeto é a transferência da propriedade do imóvel matriculado sob o nº 16.234 do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Itapira.

      O título foi expedido nos autos da ação de rescisão de contrato ajuizada por Cláudio Lourenço Palomo contra os apelantes. Houve reconvenção, que foi julgada procedente, com a condenação de Cláudio a transferir a propriedade do imóvel aos recorrentes.

      O registro foi obstado por ofensa ao princípio da continuidade, exigindo-se a apresentação de título aquisitivo de Cláudio, escritura pública ou carta de adjudicação do imóvel em seu nome, à luz dos artigos 195 e 237 da Lei de Registros Públicos; além do recolhimento do ITBI e a qualificação completa das partes.

      Suscitada, a dúvida foi julgada procedente nos termos da r. sentença de fls. 148/152, ora recorrida.

      Não se ignora que a origem judicial do título não o torna imune à qualificação registral, ainda que limitada aos requisitos formais do título e sua adequação aos princípios registrais, conforme disposto no item 117 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.

      Está pacificado, inclusive, que a qualificação negativa não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação Cível n. 413-6/7; Apelação Cível n. 0003968-52.2014.8.26.0453; Apelação Cível n. 0005176-34.2019.8.26.0344; e Apelação Cível n. 1001015-36.2019.8.26.0223).

      A redação do item 117, do Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, por seu turno, é expressa acerca do dever do Oficial do Registro de Imóveis de qualificar negativamente o título que não preencha os requisitos legais, in verbis:

      “117. Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais.

      Fixadas, pois, estas premissas, as razões recursais não merecem guarida.

      Por meio do R. 04 da Matrícula nº 16.234 de 07 de fevereiro de 2007, Ariane Aparecida Pelizzer comprometeu-se a vender, em caráter irretratável e irrevogável, o imóvel objeto da referida matrícula, a Cláudio Lourenço Palomo pelo preço certo e convencionado de R$ 30.000,00, já integralmente pago em moeda corrente.

      O título cujo registro se pretende consiste na carta de sentença extraída de processo judicial em que Cláudio Lourenço          Palomo foi condenado a transferir o imóvel para os recorrentes.

      De fato, não há título aquisitivo de Cláudio Lourenço Palomo, ou seja, escritura definitiva ou carta de adjudicação em seu nome. Cláudio é apenas promitente comprador.

      Para o ingresso do título no fólio real, em obediência ao princípio da continuidade, Cláudio Lourenço Palomo deve ostentar a condição de proprietário.

      Por força do princípio da continuidade, qualquer título de transmissão do imóvel só pode ter ingresso e dar causa a um registro stricto sensu se nele constarem, como afetados, referidos titulares de domínio.

      Entrementes, não é isso que sucede no caso em comento. Quem figura do título judicial é o compromissário comprador e não o titular de direito real. Analisada a matrícula de fls. 126/128 observa-se que Ariane Aparecida Pelizzer ainda ostenta a condição de proprietária (R. 03).

      Com efeito, o contrato de compromisso de compra e venda, desde que irretratável e levado a registro, atribui tão somente o direito real de aquisição, nos termos dos artigos 1.417 e 1.418 do Código Civil.

      Daí a razão da exigência formulada para que, precedentemente ao registro da carta de sentença, fosse efetuado o registro do título aquisitivo de Cláudio Lourenço Palomo.

      Frise-se que, pelo princípio do trato consecutivo (ou da continuidade), como regra geral, só se admite a inscrição (registro stricto sensu ou averbação – Lei nº 6.015/73, artigo 167, I e II) “daqueles actos de disposição em que o disponente coincide com o titular do direito segundo o registro” (Carlos Ferreira de Almeida, apud Ricardo Dip, Registro sobre Registros, nº 208).

      É o que diz a Lei nº 6.015/73:

      “Art. 195 – Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro.

      Art. 237 – Ainda que o imóvel esteja matriculado, não se fará o registro que dependa da apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a continuidade do registro”.

      Nas palavras de Afrânio de Carvalho (Registro de Imóveis, 3ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1982, p. 304):

      “O princípio de continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidades à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões que derivam umas das outras, asseguram sempre a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente”.

      No mais, o ato notarial em que Ariane Aparecida Pelizzer nomeia Cláudio Lourenço Palomo como seu procurador (fls. 121/122) não elimina etapas do sistema registral nem supre a necessidade de registro da transmissão do bem.

      Cabe notar, ainda, que, para o ingresso do título no registro imobiliário, observado que o Registrador tem o dever de fiscalizar o recolhimento dos impostos devidos por força dos atos que lhe forem apresentados em razão do ofício, sob pena de responsabilidade pessoal (artigo 289 da Lei nº 6.015/73), é imprescindível a comprovação do pagamento do imposto devido ITBI ou de sua não-incidência ou isenção, quer se trate da transmissão do domínio, quer se trate de cessão de direito do promitente comprador, na forma do direito local.

      Finalmente, a despeito do alegado pelos recorrentes, não se observa da carta de sentença apresentada a qualificação completa das partes.

      Não há nos autos nacionalidade, profissão, RG e CPF bem como o estado civil das partes, além do regime de bens na hipótese de serem casadas e o registro do pacto antenupcial, em desacordo com o art. 176, §1º, III, item 2, alínea “a” e “b”, da Lei nº 6.015/73 e item 63, do Cap. XX, das NSCGJ.

      Nesse cenário, justifica-se a confirmação do juízo negativo de qualificação.

      Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      Deixe um comentário

      O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

      Últimas postagens

      Últimas postagens

      Últimas postagens