TJSP – CSM – Escritura de divórcio e partilha – Excesso de meação em favor do divorciando – Pertinência da exigência – Legislação municipal impositiva de ITBI na partilha de imóveis com excesso de meação.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação nº 0000183-50.2020.8.26.0137

      Registro: 2023.0000412702

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0000183-50.2020.8.26.0137, da Comarca de Cerquilho, em que é apelante EDEZIO GRANDO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE CERQUILHO.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 18 de maio de 2023.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça

      Relator

      APELAÇÃO CÍVEL nº 0000183-50.2020.8.26.0137

      APELANTE: Edezio Grando

      APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Cerquilho

      VOTO Nº 38.999

      Registro de imóveis – Dúvida – Apelação – Escritura de divórcio e partilha – Excesso de meação em favor do divorciando – Pertinência da exigência – Legislação municipal impositiva de ITBI na partilha de imóveis com excesso de meação – Impossibilidade do exame de constitucionalidade da lei municipal na qualificação registral ou no recurso administrativo – ITBI devido – Dever dos registradores imobiliários de exigir a comprovação do recolhimento do ITBI para registro da transferência da titularidade dominial – Apelo não provido.

      Trata-se de apelação interposta por Edézio Grando contra a r. sentença (fls. 58/60) que julgou procedente a dúvida suscitada e manteve as exigências do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas de Cerquilho para o registro da Escritura Pública de Divórcio e Partilha de Bens, lavrada perante o Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos de Cerquilho, no Livro 416, páginas 281/286, em 12 de dezembro de 2019, sendo necessário recolher o ITBI referente a parte que excedeu a meação.

      Alega o apelante, em resumo, que o Oficial exige o recolhimento de ITBI para registro do título apresentado, considerando tão somente o valor imobiliário, não considerando as dívidas do casal, tampouco o bem móvel partilhado, o que não pode prevalecer porque o excesso de meação decorrente da partilha dos bens do ex-casal, no valor de R$ 33.170,56, é decorrente de doação da ex-esposa, como constou na declaração sob nº 63883354, montante esse isento de ITCMD.

      A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 122/125).

      É o relatório.

      Em 12 de dezembro de 2019, o autor e sua então esposa divorciaram-se mediante Escritura Pública de Divórcio e Partilha de Bens lavrada no Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos de Cerquilho, no Livro 416, folhas 281/286, quando realizaram a partilha do patrimônio comum do casal (fls. 16/28).

      Analisada a partilha de bens (fls. 16/28), constatou-se que o ex-marido recebeu bens imóveis que somaram o valor de R$ 416.341,13 (R$ 136.360,00 + R$ 113.640,0 + R$ 166.341,13) e à ex-mulher foram atribuídos bens imóveis que totalizaram a quantia de R$ 250,000,00 (R$ 113.640,0 + R$ 166.341,13). Considerada a partilha como um todo, incluindo as cotas sociais arroladas e uma dívida do casal, apurou-se que o cônjuge varão recebeu, a maior, o montante de R$ 33.170,56, ensejando declaração da ex-esposa de que o excesso de meação decorria de doação.

      Apresentada a escritura pública em apreço ao Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas de Cerquilho, sobreveio a prenotação nº 29.772, e a devolução com a seguinte exigência (fls. 13/14):

      “….

      No título apresentado a registro, o patrimônio de bens imóveis do casal é orçado em R$ 666.341,13. Na partilha dos bens imóveis foi atribuído à divorcianda, MARIA EDITE HORTA, bens imóveis avaliados em R$ 250.000,00, enquanto que ao divorciando, EDÉZIO GRANDO, bens imóveis avaliados em R$ 416.341,13.

      Assim, inexistindo equivalência entre os valores dos imóveis atribuídos a cada um dos cônjuges, incide o Imposto de Transmissão Inter Vivos (ITBI) sobre o que exceder a meação no patrimônio imobiliário, que tem, consoantes ensinamentos de Yussef Said Cahali, como fato gerador do imposto ora analisado

      “a diferença nos quinhões e meação sobre bens imóveis. Se a partilha dos bens imóveis fosse feita, igual por igual, inexistiria tributação. Esta incide apenas sobre as diferenças nos quinhões e meação. No caso somam-se os valores dos imóveis. Metade a metade em meação aos cônjuges. Se houver valor acima da respectiva meação o imposto incidirá sobre a diferença… A lei tributa a diferença recebida a mais em imóveis” (DIVÓRCIO E SEPARAÇÃO, 9ª edição, RT 2000). Diante do exposto, para possibilitar o registro dos imóveis, situados nesta Circunscrição Imobiliária, deve ser apresentada Guia de Pagamento do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), devidamente quitada, expedida pela Prefeitura Municipal de Cerquilho, referente à diferença”.

      Esta a controvérsia.

      Com efeito, a Constituição Federal atribui aos Municípios a competência para instituir impostos sobre a transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição (art. 156, II).

      Com esse contorno constitucional é que deve ser considerado o disposto no artigo 35, II, do Código Tributário Nacional, quando também faz menção à incidência de imposto sobre a transmissão de bens imóveis e direitos a eles relativos, que, à época da sua edição, era de competência dos Estados.

      Conclui-se, então, competir aos Municípios dispor sobre o imposto de transmissão de bens imóveis e direitos a eles relativos que se dá por ato oneroso, tais como a compra e venda, a permuta ou a dação em pagamento.

      O Município de Cerquilho exerceu referida competência por meio da Lei Municipal nº 1.329/1988, cujo inciso VIII, do artigo 4º, assim dispõe:

      “Art. 4º – Estão compreendidos na incidência do imposto: (…)

      VIII – o valor dos imóveis que, na divisão de patrimônio comum ou na partilha, forem atribuídos a um dos cônjuges desquitados, ao cônjuge supérstite ou a qualquer herdeiro, acima da respectiva meação ou quinhão”.

      Como esclarece Antonio Herance Filho (ITBI E ITCMD nas escrituras públicas: principais questões, in Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida et alii, Direito Notarial e Registral Avançado, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 178):

      “No Município de São Paulo, por exemplo, com fulcro no inc. VI do art. 130 do Dec. 52.703/2011, está definido que a alíquota do tributo incide sobre: ‘o valor dos imóveis que, na divisão de patrimônio comum ou na partilha, forem atribuídos a um dos cônjuges separados ou divorciados, ao cônjuge supérstite ou a qualquer herdeiro, acima da respectiva meação ou quinhão, considerando, em conjunto, apenas os bens imóveis constantes do patrimônio comum ou Montemor’.

      Embora haja flagrante desrespeito ao conceito dado pelo Direito Privado, que o patrimônio comum constitui universalidade indivisa de bens, o notário, bem assim o registrador, em razão do princípio da legalidade estrita e da responsabilidade tributária, deve exigir a prova de quitação do tributo municipal conforme estiver previsto na lei de situação do(s) imóvel(is)”.

      Na espécie, pelo que se vê da partilha, ao cônjuge varão foram atribuídos os seguintes bens imóveis: a) a parte ideal de 50% do imóvel de matrícula nº 25.257 do RI de Tietê-SP, avaliada em R$ 136.360,00; b) a parte ideal de 50% do imóvel de matrícula nº 25.258 do RI de Tietê/SP, avaliada em R$ 113.640,00; e c) o imóvel de matrícula nº 4.373 do RI de Cerquilho/SP, avaliado em R$ 166.341,13. Os valores somados equivalem a R$ 416.341,13. À ex-cônjuge foram atribuídos os seguintes bens imóveis: a) a parte ideal de 50% do imóvel de matrícula nº 25.257 do RI de Tietê-SP, avaliada em R$ 136.360,00; e b) a parte ideal de 50% do imóvel de matrícula nº 25.258 do RI de Tietê/SP, avaliada em R$ 113.640,00. Os valores somados equivalem a R$ 250.000,00.

      Enquadra-se a situação concreta exatamente à hipótese de incidência do ITBI prevista no artigo 4º, VIII, da Lei Municipal em referência, qual seja, “o valor dos imóveis que, na divisão depatrimônio comum ou na partilha, forem atribuídos a um dos cônjuges separados oudivorciados, ao cônjuge supérstite ou a qualquer herdeiro, acima da respectiva meaçãoou quinhão”.

      Nesse sentido, não importa que tenha havido compensação em parte do excesso de meação com outros bens e por força de assunção de dívida com exclusividade. Isso não dispensa a requerente de comprovar à serventia imobiliária o recolhimento do tributo decorrente da transmissão de bens imóveis por ato oneroso que exceda o valor que corresponderia à respectiva meação.

      Em situação semelhante, já proferi voto nos autos da Apelação Cível nº 1005304-40.2022.8.26.0309, acolhido por unanimidade no julgamento de 27 de janeiro de 2023 deste C. Conselho Superior da Magistratura, do qual destaco a ementa:

      ” REGISTRO DE IMÓVEIS DÚVIDA APELAÇÃO FORMAL DE PARTILHA EXCESSO DE MEAÇÃO DIVISÃO DOS BENS NÃO IGUALITÁRIA VALOR EXCEDENTE DA MEAÇÃO INCIDÊNCIA DE ITCMD DEVER DOS REGISTRADORES IMOBILIÁRIOS DE EXIGIR A COMPROVAÇÃO DO RECOLHIMENTO DO IMPOSTO DEVIDO PARA REGISTRO DA TRANSFERÊNCIA DA TITULARIDADE DOMINIAL APELO NÃO PROVIDO”.

      De outra parte, não é cabível analisar, no âmbito restrito da dúvida, a constitucionalidade da legislação municipal, considerando-se que as atribuições deste C. Conselho Superior da Magistratura têm natureza administrativa, não jurisdicional. Destacam-se os seguintes precedentes em situação semelhantes:

      “REGISTRO DE IMÓVEIS. ITBI. EXCESSO DE MEAÇÃO EM FAVOR DA APELANTE. LEGISLAÇÃO MUNICIPAL QUE APENAS CONSIDERA OS BENS IMÓVEIS PARA FINS DE PARTILHA E INCIDÊNCIA DE ITBI. IMPOSSIBILIDADE DO EXAME DE CONSTITUCIONALIDADE DA LEI MUNICIPAL EM SEDE DE QUALIFICAÇÃO REGISTRAL OU DE RECURSO ADMINISTRATIVO. CABIMENTO DA DISCUSSÃO DA QUESTÃO EM AÇÃO JURISDICIONAL OU RECOLHIMENTO DO IMPOSTO RECURSO NÃO PROVIDO.

      (…) A atividade registral e as atribuições deste C. Conselho Superior da Magistratura têm natureza administrativa, razão pela qual, tal como no presente feito, não é cabível o exame da constitucionalidade da legislação municipal, cabendo aos interessados, se assim entenderem conveniente, a propositura de ação jurisdicional para discussão dessa questão. Note-se que os entendimentos jurisprudenciais relacionados no recurso administrativo são todos de órgãos jurisdicionais.(…) (Apelação Cível n.º 1043473-49.2019.8.26.0100; j. 1/11/201; REL. DES. PINHEIRO FRANCO).

      “REGISTRO DE IMÓVEIS. Dúvida julgada procedente. Partilha realizada em ação de divórcio. Imposto de transmissão ‘inter vivos’. Apartamento e vaga de garagem atribuídos para a apelante. Partilha desigual, com previsão de pagamento de quantia em dinheiro, ao divorciando, para a reposição do valor correspondente à sua meação na totalidade dos bens comuns. Necessidade de comprovação da declaração e do recolhimento do imposto de transmissão ‘inter vivos’, ou de decisão judicial em que reconhecida a sua não incidência. Recurso não provido” (Apelação Cível n.º 1067171-21.2018.8.26.0100, j. 26/2/2019, REL. DES. PINHEIRO FRANCO).

      Enfim, configurada a hipótese de incidência descrita na lei municipal em referência e sendo da incumbência do registrador a fiscalização do pagamento do imposto de transmissão dos bens imóveis por força dos atos que lhe forem apresentados em razão do ofício (itens 117 e 117.1 do Capítulo XX do Tomo II das NSCGJ), sob pena, inclusive, de ser responsabilizado solidariamente no pagamento do tributo (art. 134, IV, do Código Tributário Nacional), a dúvida era mesmo procedente.

      Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça

      Relator.

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