TJSP – CSM – Desapropriação – Rodovia em imóvel rural – Aquisição originária da propriedade – Área desapropriada georreferenciada – Necessidade de certificação pelo INCRA, de inscrição junto ao CAR e de apresentação de CCIR.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1027354-97.2021.8.26.0114

      Registro: 2022.0000803769

      ACÓRDÃO 

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1027354-97.2021.8.26.0114, da Comarca de Campinas, em que é apelante CONCESSIONARIA DO SISTEMA ANHANGUERA-BANDEIRANTES S/A, é apelado 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE CAMPINAS.

      ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 27 de setembro de 2022.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL nº 1027354-97.2021.8.26.0114

      APELANTE: Concessionaria do Sistema Anhanguera-bandeirantes S/A

      APELADO: 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas

      VOTO Nº 38.785

      Registro de Imóveis – Desapropriação – Rodovia em imóvel rural – Aquisição originária da propriedade – Área desapropriada georreferenciada – Necessidade de certificação pelo INCRA, de inscrição junto ao CAR e de apresentação de CCIR – Apelação não provida.

      Trata-se de recurso de apelação interposto pela Concessionária do Sistema Anhanguera-Bandeirantes S.A.AUTOBAN contra a r. sentença de fls. 264/267, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas, mantendo a recusa ao ingresso de carta de adjudicação extraída dos autos de ação de desapropriação.

      Aduz a apelante, em suma, que a área desapropriada está localizada em área urbana, nos termos da revisão do plano diretor do Município de Campinas. Assim, nos termos do art. 176, §8º, da Lei n.º 6.015/1.973, por se tratar de área urbana, e o título apresentado para registro ser oriundo de ação judicial, planta e memorial descritivo seriam suficientes para a abertura de matrícula para a área desapropriada.

      A D. Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 336/339).

      É o relatório.

      A apelante, concessionária de serviço público, por sentença proferida em ação judicial, obteve a desapropriação, por utilidade pública, de parte ideal do imóvel objeto da matrícula n.º 115.517 do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas.

      Contudo, a carta de adjudicação expedida nos autos da ação de desapropriação (n.º 0065692-22.2005.8.26.0114 da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Campinas/SP), apresentada a registro pela apelante, foi negativamente qualificada pelo Sr. Oficial Registrador, que apresentou a seguinte exigência (fls. 224/225):

      “1. Necessário apresentar a certificação do INCRA no tocante ao georreferenciamento, a qual deverá ser acompanhada de memorial e projeto, em atenção ao disposto no artigo 225, §3º, da Lei n.º 6.015/73.

      2. Apresentar o CCIR (Certificado de Cadastro de Imóvel Rural) do imóvel retificando, nos termos do item n.º 04, do anexo I, da Instrução Normativa nº 26 do INCRA, de 28/11/2005.

      3. Deverá ser apresentado o Cadastro no CAR (Cadastro Ambiental Rural), do imóvel ora objetivado, contendo o número de inscrição do imóvel rural no CAR/SICAR-SP, em atenção ao disposto no item 123.2 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo e acórdão proferido na Apelação Cível n.º 1000477-52.2019.8.26.0418, do Superior Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

      Em substituição ao CAR poderá ser apresentada a documentação referente a Reserva Legal: os termos de responsabilidade de preservação de reserva legal e outros termos de compromisso relacionados à regularidade ambiental do imóvel, emitidos pelo órgão ambiental competente, conforme item 123, “a” do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo.

      4. Não foi apresentado o projeto da área que foi objeto da desapropriação, apenas o memorial descritivo. Assim, apresentar o projeto para possibilitar a verificação da harmonia na descrição das medidas e do perímetro mencionados no memorial descritivo e na planta”.

      Desde logo, importa lembrar que a origem judicial do título não o torna imune à qualificação registral, ainda que limitada aos requisitos formais do título e sua adequação aos princípios registrais, conforme disposto no item 119 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, vigente à época da qualificação (atual item 117).

      Está pacificado, inclusive, que a qualificação negativa não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação Cível n.º 413-6/7; Apelação Cível n.º 0003968-52.2014.8.26.0453; Apelação Cível n.º 0005176-34.2019.8.26.0344; e Apelação Cível n.º 1001015-36.2019.8.26.0223).

      Fixada, assim, esta premissa, indiscutível que a aquisição da propriedade imobiliária por meio da desapropriação judicial encerra forma originária.

      E, a despeito de dito caráter originário, a partir da redação dos arts. 176, § 3º e 225, § 3º, da Lei n.º 6.015/73, infere-se que, na hipótese em que há destaque de parcela de imóvel rural, observados, por certo, os prazos constantes do art. 10 do Decreto n.º 4.449/2002, existe a necessidade de regular apresentação da planta e do memorial descritivo georreferenciado, contendo as coordenadas georreferenciadas, notadamente pela repercussão no imóvel objeto da desapropriação parcial no aspecto da especialidade objetiva.

      “Art. 176, § 3º – Nos casos de desmembramento, parcelamento ou remembramento de imóveis rurais, a identificação prevista na alínea a do item 3 do inciso II do § 1º será obtida a partir de memorial descritivo, assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, geo-referenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional a ser fixada pelo INCRA, garantida a isenção de custos financeiros aos proprietários de imóveis rurais cuja somatória da área não exceda a quatro módulos fiscais.” (g.n.)

      “Art. 225 § 3º- Nos autos judiciais que versem sobre imóveisrurais, a localização, os limites e as confrontações serãoobtidos a partir de memorial descritivo assinado porprofissional habilitado e com a devida Anotação deResponsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadasdos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, georreferenciadasao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisãoposicional a ser fixada pelo INCRA, garantida a isenção decustos financeiros aos proprietários de imóveis rurais cujasomatória da área não exceda a quatro módulos fiscais.”

      Na expressão consagrada de Afrânio de Carvalho:

      “o requisito registral da especialidade do imóvel, vertido no fraseado clássico do direito, significa a sua descrição como corpo certo, a sua representação escrita como individualidade autônoma, com o seu modo de ser físico, que o torna inconfundível e, portanto heterogêneo em relação a qualquer outro”.[1]

      A necessidade de sua certificação pelo INCRA consta do art. 9º do Decreto n.º 4.449/2002:

      “Art. 9º – A identificação do imóvel rural, na forma do §3º do art. 225 da Lei nº 6015, de 1973, será obtida a partir de memorial descritivo elaborado, executado e assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro, e com precisão posicional a ser estabelecida em ato normativo, inclusive em manual técnico, expedido pelo INCRA.

      § 1º – Caberá ao INCRA certificar que a poligonal objeto do memorial descritivo não se sobrepõe a nenhuma outra constante de seu cadastro georreferenciado e que o memorial atende às exigências técnicas, conforme ato normativo próprio”.

      Não se olvida dos prazos de carência estabelecidos no mencionado art. 10 de referido Decreto que, na hipótese, ocorreria em vinte e dois anos.

      “Art.10 – A identificação da área do imóvel rural, prevista nos §§ 3º e 4º do art. 176 da Lei nº 6.015, de 1973, será exigida nos casos de desmembramento, parcelamento, remembramento e em qualquer situação de transferência de imóvel rural, na forma do art. 9º, somente após transcorridos os seguintes prazo:

      VII – vinte e dois anos, para os imóveis com área inferior a vinte e cinco hectares”.

      Contudo, georreferenciada a descrição perimétrica da área desapropriada, como ocorre in casu, ainda que não expirado o prazo de carência afigura-se imprescindível a apresentação, no Registro de Imóveis competente, da certificação expedida pelo INCRA, confirmando a inexistência de sobreposição com outro imóvel rural, tudo a fim de se evitar o ingresso de identificação incompleta no fólio real.

      Nestes moldes foi o parecer de lavra do então Juiz Auxiliar da Corregedoria, Dr. José Antônio de Paula Santos Neto, nos autos do Processo n.º 24066/2005, aprovado pelo D. Corregedor Geral da Justiça, à época, Desembargador José Mário Antonio Cardinale:

      “Foi questionado, outrossim, se ‘aqueles que optarem pelo georreferenciamento já, deverão atender de imediato a certificação de que trata o § 1º do artigo 9º do Decreto 4.449/02, ou poderão fazê-lo dentro do prazo que for entendido como aplicável’. Obviamente, a providência deverá ser imediata. A obtenção do certificado de não sobreposição emitido pelo INCRA é parte integrante e relevante do sistema de individualização imobiliária disciplinado no dito decreto.

      Logo, não é de se admitir o ingresso, no fólio real, de identificação truncada; incompleta. Nem parceladamente, a prestações. Configura a certificação verdadeiro requisito a ser observado. Aliás, sua exigência é um dos aspectos essenciais do mapeamento cadastral que se almeja erigir. Destarte, a bem da própria higidez do Registro Imobiliário, deverá ser desqualificado o ingresso da nova descrição quando o memorial não vier devidamente certificado. Do contrário, ferirse- ia a lógica da estrutura concebida e se correria o risco, até, de permitir a vulneração da tábua por modificação aventureira das características da área rural, uma vez que sem a chancela de segurança do órgão oficial responsável. Além disso, a certificação diferida para o futuro poderia nunca chegar, criando-se perplexidade acerca do destino a ser dado àquela descrição precipitadamente abrigada”.

      Não vinga, ademais, a alegação da apelante no sentido de que o imóvel em questão perdeu o status de rural.

      Com efeito, nos termos do art. 53 da Lei n.º 6.766/79, a alteração de uso do solo rural para fins urbanos depende de aprovação do Município, bem como de prévia audiência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INCRA.

      Nos autos, cumpre anotar, não há demonstração de manifestação do INCRA e tampouco comprovação de aprovação por parte do Município da mudança de destinação do imóvel desapropriado, razão pela qual não há como ser afastada a exigência.

      De outra parte, mesmo que dispensada a reserva legal (art. 12, § 8º, da Lei n.º 12.651/12), em virtude da área desapropriada encerrar imóvel rural para fins de registro imobiliário, compete exigir o Cadastro Ambiental Rural – CAR, nos termos do art. 29 da Lei n.º 12.651/12:

      “Art. 29. É criado o Cadastro Ambiental Rural – CAR, no âmbito do Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente – SINIMA, registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento.

      (…)

      § 3º – A inscrição no CAR é obrigatória e por prazo indeterminado para todas as propriedades e posses rurais”.

      Sobre o tema, já se manifestou este Colendo Conselho Superior da Magistratura:

      “Registro de Imóveis. Dúvida julgada procedente. Escritura de venda e compra. Descrição sucinta do imóvel constante da matrícula e reproduzida no título que, porém, dadas as circunstâncias do caso concreto, não chega a ofender o princípio da especialidade objetiva. Alegada destinação urbana de imóvel originalmente rural. Necessária apresentação de certidão de descadastramento pelo INCRA. Recurso não provido” (Apelação nº 790-6/6, Rel. Des. Ruy Camilo, j. em 27/5/2008).

      E mais recentemente, em hipótese bastante semelhante, ficou decidido que:

      “REGISTRO DE IMÓVEIS – Desapropriação de imóvel rural – Aquisição originária da propriedade  Rodovia em área rural – Áreas desapropriadas georreferenciadas – Necessidade de certificação pelo INCRA e de registro no Cadastro Ambiental Rural – CAR – Nega-se provimento à apelação” (TJSP; Apelação Cível 1000288-86.2021.8.26.0553; Relator (a): Ricardo Anafe (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro de Santo Anastácio – Vara Única; Data do Julgamento: 02/12/2021; Data de Registro: 15/12/2021).

      O Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) documento emitido pelo INCRA nas hipóteses de desmembramento, arrendamento, hipoteca, venda ou promessa de venda de imóveis rurais deve ser exigido com fundamento no art. 22 da Lei n.º 4.947/1996 e, especialmente, por força do estabelecido no art. 9º do Decreto n.º 4.449/2002.

      Frise-se que a natureza originária da aquisição pela desapropriação não descaracteriza a submissão dessa situação jurídica à hipótese de desmembramento de imóvel rural, porquanto a área desapropriada foi destacada de imóvel rural com área maior, o que confirma a necessidade do cumprimento das exigências.

      A propósito, também há decisões recentes deste Colendo Conselho Superior da Magistratura:

      “REGISTRO DE IMÓVEIS. DESAPROPRIAÇÃO PARCIAL DE ÁREA RURAL. Carta de Adjudicação. Qualificação registral. Aquisição originária da propriedade. Rodovia em área rural. Cabimento do georreferenciamento, em cumprimento à Lei de Registros Públicos (artigos 176, § 1º, 3 ‘a’, 176, §§ 3º e 5º e 225, § 3º) e ao Princípio da Especialidade Objetiva. Cabimento do registro no CAR. Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR). Recurso não provido, com observação” (TJSP; Apelação Cível 1001639-44.2018.8.26.0539; Relator (a): Pinheiro Franco (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro de Santa Cruz do Rio Pardo – 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 25/06/2019; Data de Registro: 12/07/2019).

      “REGISTRO DE IMÓVEIS – Desapropriação de imóvel rural – Aquisição originária da propriedade – Rodovia em área rural  Descrição georreferenciada do imóvel desapropriado e sua certificação pelo INCRA – Cadastro Ambiental Rural – CAR – Certificado de Cadastro de Imóvel Rural – CCIR  Exigências mantidas, em observância aos princípios da legalidade e da especialidade objetiva – Dúvida procedente – Apelação a que se nega provimento” (TJSP; Apelação Cível 1000463-37.2021.8.26.0341; Relator (a): Ricardo Anafe (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro de Maracaí – Vara Única; Data do Julgamento: 14/12/2021; Data de Registro: 16/12/2021).

      Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      NOTA:

      [1] Registro de Imóveis, pág. 206.

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