TJRJ – ANULATÓRIA DE TESTAMENTO. TANTO A PROVA ORAL COMO A PERICIAL CONFIRMAM A DIFICULDADE DE ESCRITA DO TESTADOR, CONCLUINDO PELA FALSIDADE DA ASSINATURA APOSTA NO TESTAMENTO. RECURSO PROVIDO PARA ANULAR O TESTAMENTO.

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      Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro

      Décima Sexta Câmara Cível

      APELAÇÃO N.º 11.862-76/2010.0045 – PROCESSO ELETRÔNICO (O)

      APELANTE: 

      APELADOS: 

      RELATOR: DES. LINDOLPHO MORAIS MARINHO

      CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.

      ANULATÓRIA DE TESTAMENTO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. TANTO A PROVA ORAL COMO A PERICIAL CONFIRMAM A DIFICULDADE DE ESCRITA DO TESTADOR, CONCLUINDO PELA FALSIDADE DA ASSINATURA APOSTA NO TESTAMENTO. RECURSO PROVIDO PARA ANULAR O TESTAMENTO.

      As conclusões do laudo pericial não podem ser descartadas vez que os testemunhos confirmam as premissas que derivaram suas conclusões.

      Os depoimentos prestados confirmam que o testador possuía há anos escrita irregular, com muito tremor e, no momento da lavratura do testamento, possuía escrita comprometida, às vezes “um rabisco”.

      O laudo pericial é categórico no sentido de que a assinatura aposta no testamento é firme, “escrita impecável”, portanto, diversa da assinatura de Ivan que era “trêmula, com claudicações, indecisões, comprometimento da motricidade”, portanto, atestou pela falsidade da assinatura aposta no testamento objeto da lide.

      Inversão do ônus sucumbencial para condenar a parte ré ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios que fixo em 20% sobre o valor atualizado da causa. Recurso provido para anular o terceiro testamento feito por (…) firmado em 22/05/2009.

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n.º 11.86276/2010-0045, em que é apelante (…) e apelados LAURA MARIA CARCEGLIA MARTINELLI E ESPÓLIO DE IVAN PITES MARINHO

      Apelação nº 11.862-76/2010/0045 – Acórdão – fls. 2

      A C O R D A M os Desembargadores que compõem a Décima Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso para anular o terceiro testamento feito por Ivan Pires Marinho, firmado em 22/05/2009, condenando a parte ré ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 20% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do voto do Relator.

      Rio de Janeiro, 28 de janeiro de 2020.

      DES. LINDOLPHO MORAIS MARINHO

      Relator

      Apelação nº 11.862-76/2010/0045 – Acórdão – fls. 3

      I – RELATÓRIO

      É o do arquivo, na forma regimental do art. 92, do RITJRJ.

      II – VOTO

      Os recursos preenchem os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, por isso, devem ser conhecidos.

      Trata-se de ação de anulação de testamento, cujo pedido foi julgado improcedente, razão pela qual foi interposta a presente apelação.

      No caso, o testamento foi lavrado por escritura pública perante o Tabelião do 1º Ofício de Notas de Resende e na presença de testemunhas em 22/05/2009, figurando como única herdeira a companheira do mesmo, ora ré, Laura Maria.

      Alega a apelante o precário estado de saúde do testador à época da lavratura do testamento e que promoveu perícia grafotécnica que concluiu serem falsas as assinaturas do testador Ivan.

      A ré sustenta que os depoimentos testemunhais confirmam a lucidez do testador, ressaltando que o testamento foi lavrado por escritura pública, na presença de tabelião “in loco” e de testemunhas idôneas, gozando de fé pública e de presunção de veracidade.

      O testamento é um ato solene que deve submeter-se às formalidades previstas na lei, sob pena de nulidade.

      Apelação nº 11.862-76/2010/0045 – Acórdão – fls. 4

      No que se refere ao testamento público, reza o Código Civil:

      “Art. 1.864. São requisitos essenciais do testamento público:

      I – ser escrito por tabelião ou por seu substituto legal em seu livro de notas, de acordo com as declarações do testador, podendo este servirse de minuta, notas ou apontamentos;

      II – lavrado o instrumento, ser lido em voz alta pelo tabelião ao testador e a duas testemunhas, a um só tempo; ou pelo testador, se o quiser, na presença destas e do oficial;

      III – ser o instrumento, em seguida à leitura, assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo tabelião.

      Parágrafo único. O testamento público pode ser escrito manualmente ou mecanicamente, bem como ser feito pela inserção da declaração de vontade em partes impressas de livro de notas, desde que rubricadas todas as páginas pelo testador, se mais de uma.

      Art. 1.865. Se o testador não souber, ou não puder assinar, o tabelião ou seu substituto legal assim o declarará, assinando, neste caso, pelo testador, e, a seu rogo, uma das testemunhas instrumentárias.

      Art. 1.866. O indivíduo inteiramente surdo, sabendo ler, lerá o seu testamento, e, se não o souber, designará quem o leia em seu lugar, presentes as testemunhas.

      Art. 1.867. Ao cego só se permite o testamento público, que lhe será lido, em voz alta, duas vezes, uma pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra por uma das testemunhas, designada pelo testador, fazendo-se de tudo circunstanciada menção no testamento.”

      Na hipótese foram produzidas prova oral, consistente na testemunhal e depoimento pessoal das partes, bem como prova pericial grafotécnica e a sentença se fundamentou na prova oral.

      Cabe aqui saber, no conflito entre a prova pericial e a oral, qual

      deve prevalecer, sendo necessária, portanto, a análise e a valoração de cada

      Apelação nº 11.862-76/2010/0045 – Acórdão – fls. 5

      Primeiramente, cumpre destacar que, no que se refere à valoração das provas pelo juiz, vigora no sistema brasileiro o sistema do livre convencimento motivado, de modo que “O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento”, conforme disposto no artigo 371 do Código de Processo Civil.

      Assim, não há uma regra que estabeleça o valor e a importância de cada tipo de prova, devendo tal análise ser feita pelo Magistrado no caso concreto quando da formação do seu convencimento, indicando especificamente os motivos pelos quais aceita ou rejeita cada prova produzida.

      Dessa forma, ao proferir a decisão, incumbe ao juiz apresentar uma valoração discursiva da prova, justificando seu convencimento acerca da veracidade das alegações e indicando os motivos pelos quais acolhe ou rejeita cada elemento do conjunto probatório.

      Com efeito, as conclusões do laudo pericial não podem ser descartadas vez que os testemunhos confirmam as premissas que derivaram suas conclusões.

      O depoimento da ré Laura diz:

      “que foi olhar e percebeu que assinatura estava realmente muito tremida e grosseira; que até para falsificação teria que ser algo melhor; que todas as pessoas que conviviam com ela e com o falecido Ivan sabiam que ele sofria de tremores nas mãos”.

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      O da testemunha Marcia Alves Barreto, ouvida na qualidade de informante, contadora do falecido, confirmam que o testador já possuía assinatura muito trêmula, muitas vezes um “rabisco”. Veja-se:

      “que verificou a modificação na assinatura do falecido; que a assinatura dele era muito tremida; que ele tinha muitos tremores; que, ao assinar os cheques, saía só um” rabisco “(sic); que o banco aceitava por já conhecer sua condição;”

      Ainda mais, pelo testemunho da sra. Tabeliã, Luzia Aparecida, ouvida como informante, que se encontrava no momento da lavratura do testamento, apesar do testador apresentar dificuldade de escrita, posto que tremia muito , realizou e lavrou o testamento, nos ditames legais, na presença de testemunhas.

      Portanto, os depoimentos prestados confirmam que o testador possuía há anos escrita com muito tremor e no momento da lavratura do testamento possuía escrita comprometida, como já dito, às vezes “um rabisco”.

      Por outro lado, o laudo pericial é categórico no sentido de que a assinatura aposta no testamento é firme, “escrita impecável”, portanto, diversa da assinatura de Ivan que era “trêmula, com claudicações, indecisões, comprometimento da motricidade”, portanto, atestou pela falsidade da assinatura aposta no testamento objeto da lide.

      Veja-se trechos do laudo pericial:

      “(…) Nos exames grafotécnicos da PEÇA CONTESTADA, através dos padrões fornecidos nos autos em fls. 1361137 (em apenso), foi observado que se trata de escrita situada em estágio avançado na escala de evolução gráfica, onde o agente demonstra habilidade

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      gráfica, firmeza do punho escritor, boa definição dos símbolos, alinhamento constante, espontaneidade e dinamismo . Nos exames grafotécnicos da PEÇA PADRÃO de confronto, analisando detidamente os paradigmas fornecidos nos autos (fls. 1511152 verso), foi observado, no seu aspecto geral, que se trata de escrita situada em estágio de extenuação total, com avançado estado de debilidade. A grafia da PEÇA PADRÃO apresenta símbolos gráficos mal definidos, com o símbolo das versais e passantes superiores, I, M, e 1″ com amplitudes mais reduzidas se comparado aos da peça questionada, sobreposição de símbolos e um total desalinhamento com a linha de base. No entanto, as principais características observadas foram os tremores, as claudicações, as quebras, as indecisões no traçado com a presença de um notório problema na motricidade. No aspecto geral, a Peça Contestada, quando comparada com os paradigmas fornecidos nos autos como peça padrão de confronto, apresentou grandes e notórias divergências. (…)” (grifos nossos)

      Tenho, pois, pela relevância do laudo pericial que é tido, pela

      doutrina, como prova de capital importância, como ensina José Carlos de Moraes

      Salles:

      “É verdade que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos (art. 436 do CPC). Não é menos verdade, entretanto, que o laudo, sendo um parecer dos técnicos que levaram a efeito a perícia, é peça de fundamental importância para o estabelecimento daquela convicção. (…)” (A desapropriação à luz da doutrina e da jurisprudência, 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 259) .
      Como se não bastasse a conclusão a que chegou a perícia, ou
      seja, a falsidade da assinatura do testador, todas as pessoas ouvidas confirmam
      a dificuldade de escrita de Ivan, portanto, não poderia ter apresentado, no
      momento da lavratura do testamento, escrita firme e impecável, o que corrobora a
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      conclusão do laudo de que a assinatura aposta não proveio do punho do falecido Ivan, sendo falsa.
      Por essas razões, tanto a prova pericial, que concluiu que a assinatura aposta no testamento não era do falecido, como a prova testemunhal, que deixa claro que o problema de tremor do falecido vinha de longa data e era crônico, complementam-se e corroboram que Ivan não poderia ter assinado o testamento de maneira tão firme.
      Por certo, inexiste conflito entre as provas produzidas, pericial e testemunhal, ambas realizadas sob o crivo do contraditório, sendo que não se sobrepõem, ao contrário, complementam-se, e contribuíram eficazmente para a formação da convicção a respeito dos fatos narrados, qual seja a falsidade da assinatura aposta no testamento.
      As escrituras públicas possuem presunção de veracidade. Todavia, tal presunção não é absoluta, sendo possível a anulação de algum ato realizado, desde que comprovado eventual vício no mesmo.
      As inúmeras divergências e inconsistências constatadas pelas provas produzidas, especialmente a pericial, comprometem a própria essência do testamento, que é garantir a vontade livre e consciente do testador.
      Portanto, considerando que o vício constatado atinge diretamente a substância do ato, tornando o suspeito e pondo em risco a higidez e a real intenção da falecida, não há que se falar em legalidade do ato, devendo ser declarada a nulidade do testamento.
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      Assim, tenho que a fundamentação do decisum de primeiro grau foi simples no sentido de que “o tremor nas mãos que apresentava justifica o fato de suas assinaturas não serem sempre iguais” e não ilide todo o arcabouço probatório aqui evidenciado, cuja falsidade foi reconhecida não apenas por um, mas por dois laudos periciais, os quais se basearam em premissa corroborada pelas provas orais produzidas em juízo, como dito acima.
      Tendo em vista a modificação no julgado, impõe-se a inversão do ônus sucumbencial, razão pela qual condeno a parte ré ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre o valor atualizado da causa.
      Deixo de majorar os honorários recursais, considerando que os honorários foram fixados em seu patamar máximo.
      Em vista destas considerações, o voto é para dar provimento ao recurso para anular o terceiro testamento feito por Ivan Pires Marinho, firmado em 22/05/2009, condenando a parte ré no pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 20% sobre o valor atualizado da causa.
      Rio de Janeiro, 28 de janeiro de 2020.
      DES. LINDOLPHO MORAIS MARINHO
      Relator

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