TJMG – APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO DE FAMÍLIA – AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL – REQUISITOS – AUSÊNCIA – COABITAÇÃO – INSUFICIÊNCIA – NAMORO QUALIFICADO.

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      Número do 1.0000.22.255996-5/001 Númeração 5006491-

      Relator: Des.(a) Eveline Mendonça (JD Convocada)

      Relator do Acordão: Des.(a) Eveline Mendonça (JD Convocada)

      Data do Julgamento: 27/07/2023

      Data da Publicação: 28/07/2023

      EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO DE FAMÍLIA – AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL – REQUISITOS – AUSÊNCIA – COABITAÇÃO – INSUFICIÊNCIA – NAMORO QUALIFICADO.

      – É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família, nos termos do art. 1.723, do Código Civil.

      – O pedido de reconhecimento de união estável só pode ser acolhido quando, comprovadamente, o relacionamento houver se revestido dessas características, devendo ser analisado com muita cautela, a fim de que se evite a equiparação do mero namoro à união estável.

      – A coabitação, isoladamente, é insuficiente para a comprovação da existência da união estável, podendo configurar mero namoro qualificado.

      APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.22.255996-5/001 – COMARCA DE GOVERNADOR VALADARES – APELANTE (S): I.M.M.S. – APELADO (A)(S): A.P.S., E.P.S., I.P.S., J.M.P., M.P.S.S., M.J.S.L., N.P.R., S.P.V.

      ACÓRDÃO

      (SEGREDO DE JUSTIÇA)

      Vistos etc., acorda, em Turma, a 4a Câmara Cível Especializada do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

      JD. CONVOCADA EVELINE FELIX

      RELATORA

      JD. CONVOCADA EVELINE FELIX (RELATORA)

      VOTO

      Cuida-se de apelação cível interposta por I.M.M.S. contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3a Vara Cível da Comarca de Governador Valadares, Dr. Marcelo Carlos Candido, que, nos autos da Ação de Reconhecimento e Dissolução de União Estável “post mortem” movida pela apelante em face de E.P.S., M.P.S., A.P.S., N.P.R., I.P.S., J.M.P., S.P.S. e M.J.S., julgou improcedente o pedido, nos seguintes termos:

      Posto isso, e por tudo o mais que dos autos consta, nos termos do art. 487I, do CPC, resolvo o mérito do processo e julgo IMPROCEDENTE o pedido contido na inicial.

      Em razão da sucumbência, condeno a autora ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como com os honorários da parte contrária, estes fixados em 10% do valor da ação, restando suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade da justiça concedida à fl. 37 (art. 98§ 3º, do CPC).

      Em suas razões recursais, a autora arguiu que é inquestionável que em 24/04/2010 a apelante e o “de cujus” contraíram matrimônio sob o regime de separação de bens; que o falecido era homem mais velho e não gostava de se fotografar, o que justifica a inexistência de acervo fotográfico entre ele e apelante antes e depois do casamento; que a prova testemunhal comprovou o relacionamento público e notório do casal, com início entre 2001/2002, período em que foi comprado um barracão, realizando benfeitorias no imóvel. Transcreveu o depoimento das testemunhas. Defendeu que a prova testemunhal “é firme e segura” em demonstrar que as partes viviam em união estável por ocasião da aquisição do imóvel da Rua Jacarandá; que o testemunha da Sra. N., não possui credibilidade, já que contraditório e inverídico; que a prova testemunhal apresentada pela apelante é coerente; que deve ser reconhecida a união estável; que o regime aplicável é o da comunhão parcial; que deve ser reconhecido o direito da apelante a sua meação no imóvel ou, pelo menos, nas benfeitorias erigidas.

      Devidamente intimados, os apelados apresentaram contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso.

      Em seguida, foi solicitado ao Juízo de origem que disponibilizasse a mídia das audiências na plataforma PJe mídias.

      Cumprida a diligência, foi designada audiência de conciliação perante o CEJUSC, restando frustrada a tentativa de composição.

      É o relatório.

      Conheço do recurso, presentes os pressupostos de admissibilidade.

      Pretende a recorrente o reconhecimento de união estável com o “de cujus”, a partir do ano de 2001, bem como do seu direito à meação em imóvel adquirido em 2004.

      Vejamos.

      Em razão do teor da Lei 8.971/94, exigia-se, para o reconhecimento da união estável, a convivência “more uxoria” por mais de cinco anos, ou a existência de prole comum. Entretanto, o art. , da Lei 9.278/96, excluiu os requisitos de tempo mínimo de convivência e existência de prole, bastando a convivência duradoura, pública e contínua, com o objetivo de constituição de família, senão vejamos:

      Art. . É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família.

      Ocorre que, com o advento do Código Civil de 2002, que disciplinou a matéria atinente à união estável, inclusive no que concerne aos requisitos para a sua configuração, ao direito a alimentos pelos companheiros e aos direitos sucessórios, as leis antecedentes restaram parcialmente revogadas, na forma do parágrafo 1º, do art. 2º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, “in verbis”:

      Art. 2o Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.

      § 1o A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

      O art. 1.723, do Código Civil de 2002, determina que:

      Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

      Em suma, hodiernamente, não há prazo mínimo para configuração da união estável e não há exigência de prole comum ou “more uxoria”.

      Convém destacar que o principal requisito capaz de distinguir um namoro de uma união estável é a intenção de constituir família (“animus familiae”), ou seja, os envolvidos precisam ser tratados e reconhecidos socialmente como companheiros.

      Sobre o tema, as lições do professor Álvaro Villaça Azevedo:

      Realmente, como um fato social, a união estável é tão exposta ao público como um casamento, em que os companheiros são conhecidos, no local em que vivem, nos meios sociais, principalmente de sua comunidade, junto aos fornecedores de produtos e serviços, apresentando-se, enfim, como se casados fossem. Diz o povo, em sua linguagem autêntica, que só falta aos companheiros o ‘papel passado’. Essa convivência, como no casamento, existe em continuidade; os companheiros não só se visitam, mas vivem juntos, participam um da vida do outro, sem termo marcado para se separarem (In, Comentários ao Código Civil. Saraiva. Vol. 19, p. 255).

      Registre-se que a separação de fato (independente da decretação do divórcio) já é o bastante para legitimar que o novo relacionamento de qualquer dos envolvidos possa alçar o patamar de união estável (art. 1.723§ 1º, do CC/2002).

      Posto isso, verifico que não foi produzida prova documental capaz de demonstrar a existência da união estável e os poucos registros fotográficos acostados aos autos são insuficientes para comprovar que, à época da aquisição do imóvel, a apelante e o “de cujus” já exerciam convivência duradoura, pública e contínua, com o objetivo de formar família.

      Melhor sorte não assiste à parte quanto à prova oral produzida.

      A testemunha T.V.C. afirmou que conheceu a autora há uns dez anos, ou seja, por volta de 2011/2012; que não sabe se os filhos eram comuns do casal; que não sabe de onde eles vieram antes de se tornarem vizinhos da depoente; que sabe que a casa onde o casal morava havia sido adquirida da Sra. Cecília; que conheceu o “de cujus” na mesma época em que conheceu a apelante; que ele se mudou para a casa com a apelante; que fizeram construção no imóvel, acima da laje já existente, quando já estavam juntos.

      O depoimento não traz elementos capazes de comprovar a existência da união estável antes do casamento, ocorrido no ano de 2010, indicando apenas que as benfeitorias foram feitas durante a relação.

      A testemunha C.G.F., por sua vez, vendedora do imóvel objeto da demanda, informou que conhecia a apelante desde 2005/2006; que a apelante já morava com o “de cujus” naquela ocasião; que o “de cujus” foi olhar a casa e voltou no dia seguinte, acompanhado da apelante, para ela ver se gostava da casa, antes da aquisição; que foi feito contrato de compra e venda, não registrado, como é praxe na localidade; que ele era “enrolado” com a apelante e depois casou com ela; que o imóvel era um barracão de três cômodos à época da venda; que, após a compra, o “de cujus” derrubou a construção e fez nova casa; que a apelante toda vida morou lá com ele e “olhou ele até ele morrer”; que ouviu dizer que o “de cujus” tinha outro imóvel, em São Paulo; que soube que o casal morava na roça, no interior, antes de se mudarem para a casa; que apelante e “de cujus” moravam juntos antes da aquisição da casa.

      Extrai-se do depoimento que o “de cujus” e a apelante já moravam juntos por ocasião da aquisição e que pretendiam nele residir, tanto que o falecido somente adquiriu o imóvel após ouvir a opinião da apelante sobre o bem.

      No entanto, a simples coabitação é insuficiente para o reconhecimento da união estável, visto que pode caracterizar mero namoro qualificado. A intenção futura de formação de família decorrente de namoro ou noivado não permite a qualificação da relação como união estável.

      Sobre o tema, veja-se decisão deste Tribunal:

      APELAÇÃO CÍVEL – UNIÃO ESTÁVEL – RECONHECIMENTO – NAMORO QUALIFICADO – AFFECTIO MARITALIS – INSUFICIÊNCIA DE PROVAS.

      – O namoro qualificado pode incluir a coabitação do casal, o que não prova a união estável. A entidade familiar estará comprovada quando demonstrado o propósito de se constituir uma família. (TJMG – Apelação Cível 1.0000.20.050995-8/004, Relator (a): Des.(a) Alice Birchal , 4a Câmara Cível Especializada, julgamento em 08/09/2022, publicação da súmula em 08092022)

      Desse modo, a narrativa da testemunha C. é insuficiente para dar certeza de que, ao tempo da aquisição do bem, a relação possuía todos os requisitos necessários à configuração da união estável.

      A Sra. A.M.S.Q, ouvida como informante por ser amiga antiga da apelante, pontuou que conhecia a apelante desde 2001/2002; que a apelante residia em Baguari com o “de cujus”, à época, sendo a mesma cidade onde morava a depoente; que a apelante tinha filhos de relacionamento anterior; que desconhece o convívio antes dessa data; que não sabe informar o início da convivência; que sabe o que imóvel foi adquirido por volta de 2004; que, após a compra, foram feitas melhorias no imóvel; que houve casamento posteriormente; que a apelante e o “de cujus” ficaram juntos até o falecimento; que conheceu o “de cujus” na mesma época que a apelante; que moravam numa casinha “na beirada da linha” e que a cidade era pequena; que a apelante, à época da compra do imóvel, havia comunicado à depoente que estava sendo adquirido o bem.

      As informações prestadas demonstram que a apelante e o “de cujus” já possuíam relacionamento à época da aquisição do bem, mas também não sustentam a alegação de que as partes já viviam em união estável naquele período.

      A Sra. N.M.R.F., também ouvida como informante, asseverou que não conheceu a apelante, mas foi esposa do “de cujus” por 23 anos; que o casamento durou até 2002/2003, mais ou menos; que não é mãe dos filhos do “de cujus”, mas os criou como tal; que não teve mais contato com ele depois da separação, apenas cumprimentando, como bons amigos; que ele ficou solteiro até conhecer a apelante; que ele já tinha amizade com o pai da apelante; que a apelante e o “de cujus” começaram a namorar por volta de 2002/2003; que o pai da apelante não aceitava que eles morassem juntos até o casamento; que o lote de (…) foi adquirido quando ainda estava com a depoente; que a construção estava no alicerce por ocasião da separação entre a depoente e o “de cujus”; que o lote foi comprado “de um rapaz lá”; que, após a separação, ele foi morar em imóvel da rua (…), sozinho; que ficou um bom tempo lá, entre dois e três anos; que não sabe informar se o “de cujus” morou em Baguari; que, ao se separar do “de cujus”, a depoente deixou para ele diversos bens, entre os quais o imóvel da Turmalina, o imóvel da Rua(…) e o salão de cabeleireiro; que não sabe se o “de cujus” morou em Baguari; que sabe apenas que ele estava construindo para morar ali com a apelante; que, à época da separação, o “de cujus” já conhecia a família da apelante, em função do trabalho no salão; que a depoente ainda morava com o “de cujus” quando foi adquirido o imóvel da (…); que só foi no lote depois da compra; que nunca viu nada antes da compra pelo falecido; que a compra foi feita antes da separação, em 2002.

      Nota-se que há diversas incongruências no depoimento da referida pessoa, notadamente quanto à data de aquisição do imóvel. Afirma a depoente que o bem objeto da demanda havia sido adquirido antes de sua separação, ocorrida em 2002/2003, e que as obras de construção da edificação já haviam se iniciado, mas os documentos acostados aos autos comprovam que a compra e venda se realizou no ano de 2004, quando a informante já não estava mais em relacionamento com o falecido.

      Além do vínculo próximo com os filhos do “de cujus”, que revela possível interesse na improcedência da demanda, os dados apresentados se mostram contraditórios ou conflitantes com as provas dos autos, não sendo possível lhe atribuir grande peso ao depoimento no julgamento do feito.

      De fato, analisando o conjunto das provas produzidas, não há como reconhecer a existência de união estável à época da aquisição do lote objeto da demanda, pelas razões acima explanadas. Sequer é possível afirmar que houve união estável entre a apelante e o “de cujus” antes do casamento.

      Assim, a sentença de improcedência deve ser mantida.

      Com estas considerações, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO.

      Majoro os honorários sucumbenciais para 15% (quinze por cento) do valor da causa, com suspensão da exigibilidade, visto que a parte litiga ao amparo da justiça gratuita.

      Custas na forma da lei.

      DES. PEDRO ALEIXO – De acordo com o (a) Relator (a).

      DES. KILDARE CARVALHO – De acordo com o (a) Relator (a).

      SÚMULA: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.”

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