Carta de adjudicação – Forma derivada de aquisição da propriedade – Executado que não figura como proprietário do imóvel na respectiva matrícula – Afronta ao princípio da continuidade

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      Apelação nº 1020107-44.2015.8.26.0577

      Espécie: APELAÇÃO

      Número: 1020107-44.2015.8.26.0577

      Comarca: SÃO JOSÉ DOS CAMPOS

      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação nº 1020107-44.2015.8.26.0577

      Registro: 2017.0000594696

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1020107-44.2015.8.26.0577, da Comarca de São José dos Campos, em que são partes são apelantes MARIA AUXILIADORA MARQUES DA SILVA e JULIANO BRAULINO MARQUES DE MELO, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS.

      ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, JOÃO CARLOS SALETTI, RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E PÉRICLES PIZA.

      São Paulo, 20 de julho de 2017.

      MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      Apelação n.º 1020107-44.2015.8.26.0577

      Apelantes: Maria Auxiliadora Marques da Silva e Juliano Braulino Marques de Melo

      Apelado: 1º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de São José dos Campos

      VOTO N.º 29.768

      Registro de Imóveis – Carta de adjudicação – Forma derivada de aquisição da propriedade – Executado que não figura como proprietário do imóvel na respectiva matrícula – Afronta ao princípio da continuidade – Recurso desprovido.

      Cuida-se de recurso de apelação tirado de r. sentença do MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de São José dos Campos, que julgou procedente dúvida suscitada para o fim de manter a recusa a registro de carta de arrematação expedida em execução de que figura, como executada, pessoa diversa daquela que consta como proprietária na matrícula do imóvel arrematado.

      Os apelantes afirmam, em síntese, que arrematação é modo originário de aquisição da propriedade imóvel, de forma que o registro da respectiva carta não implicaria violação ao princípio da continuidade, ainda que distintos o devedor da execução em que arrematado o bem e a titular registrária do imóvel.

      Sustenta que a atual proprietária do imóvel teria sido indolente ao esperar cerca de oito anos para registrar a aquisição do imóvel, também por arrematação.

      A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso.

      É o relatório.

      Consoante se verifica de fls. 51, o imóvel em comento está registrado em nome de Soraia Kazon. Não obstante, o bem foi arrematado pelos recorrentes no bojo de execução movida em face de Sérgio Afonso de Paula Ferreira. O devedor na execução em que havida a arrematação promovida pelo recorrente é, pois, pessoa diversa daquela que atualmente figura, perante o Registro Imobiliário, como titular do imóvel arrematado.

      Todavia, à luz do art. 195 da Lei de Registros Públicos:

      “Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro.”

      Já o art. 237 do mesmo Diploma dispõe:

      “Ainda que o imóvel esteja matriculado, não se fará registro que dependa da apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a continuidade do registro.”

      Inviável, pois, o registro, tal como almejado, por implicar injustificado rompimento na cadeia de sucessão dos titulares do bem. Trata-se de obedecer ao princípio da continuidade registrária. Conforme os magistérios de Afrânio de Carvalho:

      "O princípio da continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidade à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram sempre a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente. Ao exigir que cada inscrição encontre sua procedência em outra anterior, que assegure a legitimidade da transmissão ou da oneração do direito, acaba por transformá-la no elo de uma corrente ininterrupta de assentos, cada um dos quais se liga ao seu antecedente, como o seu subseqüente a ele se ligará posteriormente. Graças a isso o Registro de Imóveis inspira confiança ao público" (Registro de Imóveis, 4ª edição, Ed. Forense, 1998, pág. 253).

      Em idêntico sentido o entendimento de Narciso Orlandi Neto:

      "Existe uma inteiração dos princípios da especialidade e da continuidade na formação da corrente filiatória. Quando se exige a observância da continuidade dos registros, exige-se que ela diga respeito a um determinado imóvel. O titular inscrito, e só ele, transmite um direito sobre um bem específico, perfeitamente individualizado, inconfundível, sobre o qual, de acordo com o registro, exerce o direto transmitido. É por este corolário dos princípios da continuidade e da especialidade, reunidos, que o §2º do art. 225 da Lei nº 6015/73 dispõe: "Consideram-se irregulares, para efeito de matrícula, os títulos nos quais a caracterização do imóvel não coincida com a que consta do registro anterior." (Retificação do registro de imóveis, Ed. Juarez de Oliveira, 2ª ed., 1999, p. 67/68)

      O só fato de se tratar de arrematação judicial não basta para afastar a incidência das normas aludidas. Trata-se, com efeito, de modo derivado de aquisição da propriedade imóvel, mantendo-se vínculo com a situação pretérita do bem. A participação do Estado-Juiz na alienação forçada do imóvel não transmuda para originária a natureza da aquisição.

      Consoante ensina o eminente magistrado Josué Modesto Passos:

      "Diz-se originária a aquisição que, em seu suporte fático, é independente da existência de um outro direito; derivada, a que pressupõe, em seu suporte fático, a existência do direito por adquirir. A inexistência de relação entre titulares, a distinção entre o conteúdo do direito anterior e o do direito adquirido originariamente, a extinção de restrições e limitações, tudo isso pode se passar, mas nada disso é da essência da aquisição originária" (PASSOS, Josué Modesto. A arrematação no registro de imóveis: continuidade do registro e natureza da aquisição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, pp. 111-112).

      E, em seguida, reforça:

      "A arrematação não pode ser considerada um fundamento autônomo do direito que o arrematante adquire. A arrematação é ato que se dá entre o Estado (o juízo) e o maior lançador (arrematante), e não entre o mais lançador (arrematante) e o executado; isso, porém, não exclui que se exija – como de fato se exige -, no suporte fático da arrematação (e, logo, no suporte fático da aquisição imobiliária fundada na arrematação), a existência do direito que, perdido para o executado, é então objeto de disposição em favor do arrematante. Ora, se essa existência do direito anterior está pressuposta e é exigida, então – quod erat demonstrandum – a aquisição é derivada (e não originária)" (op. cit., p. 118).

      Para o mesmo Norte aponta a pacificada jurisprudência deste Colendo Conselho Superior da Magistratura:

      “REGISTRO DE IMÓVEIS. Dúvida. Registro de carta de adjudicação. Modo derivado de aquisição da propriedade. Modificação do posicionamento anterior do Conselho Superior da Magistratura. Análise da natureza jurídica do ato de adjudicação.

      Fundamentos que não afastam a natureza derivada da transmissão coativa. Óbices ao registro mantidos. Recurso não provido.” (APELAÇÃO CÍVEL: 9000001-34.2013.8.26.0531, Rel. Des. Elliot Akel, j. 7/10/14)

      “Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal. O exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental” (Ap. Cível nº 31881-0/1).

      Não bastasse, a penhora – e, portanto, a arrematação – deram-se em relação a direitos sobre o imóvel. Não abarcaram a propriedade do imóvel em si.

      E não consta da matrícula do bem qualquer direito real registrado em nome do executado. Sequer compromisso de compra e venda registrado há.

      Por fim, o só fato de a obrigação que deu azo à execução ser de natureza propter rem não altera o caráter derivado da aquisição da propriedade, inerente à adjudicação. Haveria a demanda de ser movida em face daquele que efetivamente figura como proprietário da unidade em relação à qual pende a dívida condominial. A disparidade entre executado e proprietária, como se disse, é óbice absoluto ao registro da carta, ainda que seja obrigação propter rem o nascedouro da dívida executada.

      Desta feita, bem postada a recusa do Sr. Oficial, nego provimento ao recurso.

      MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

      Corregedor Geral da Justiça e Relator. (DJe de 20.09.2017 – SP)

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