Artigo – IPTU e o direito obrigacional: uma interpretação sui generis do STJ – Lourival da Silva Ramos Júnior.

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      O direito obrigacional abrange apenas o negócio jurídico entre partes, ao passo que o direito real tem eficácia erga omnes. Por outro lado, no tocante ao direito obrigacional, há 03 (três) espécies ultra partes: obrigação com eficácia real, obrigação preferencial e obrigação propter rem.

      A primeira é a obrigação com eficácia real, valendo contra terceiros, cujo exemplo clássico é a cláusula de vigência da locação de imóveis (art. 8º da Lei n.º 8.245/91 c/c art. 167, I-3, e mais o art. 242, ambos da Lei n.º 6.015/73). O segundo é o direito obrigacional preferencial que não se pode ceder nem se passar aos herdeiros (art. 520 do Código Civil), logo, para que a vontade das partes sobreponha terceiros, precisará de previsão legal (art. 504, 513 e 519, do Código Civil e caput do art. 25 da Lei n. 10.257/2001). Por fim, temos o direito obrigacional propter rem ou ob rem: “são um tipo especial de dever jurídico obrigacional que adstringe uma pessoa específica, identificada (aí, sim) pela sua qualidade de titular de situação jurídica de direito das coisas [e não necessariamente por ser proprietário da coisa, sob pena de confundir com o direito real]” (Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery citados no Resp n.º 1.672.508-SP, 3ª turma, de relatoria do Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 01/08/2019).

      Note-se que, “a obrigação propter rem está vinculada à titularidade do bem, sendo essa a razão pela qual será satisfeita determinada prestação positiva ou negativa, impondo-se a sua assunção a todos os que sucedam ao titular na posição transmitida” (Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald citados no Resp n.º 1.672.508 – SP, 3ª turma, de relatoria do Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 01/08/2019).

      Nesse passo, a decisão do REsp 1.978.780-SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, 2ª Turma, julgado em 05/04/2022 (informativo 732 do STJ), parece dissonante das diferentes formas de direito obrigacional acima, quando evoca o AgInt no REsp 1.948.435/RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª Turma, DJe de 18/11/2021, cuja decisão diz o seguinte: “Na forma da jurisprudência do STJ, só o registro da escritura definitiva de compra e venda autoriza o reconhecimento da ausência de responsabilidade tributária do proprietário vendedor do imóvel (…)”.

      Embora o objeto da REsp 1.978.780-SP seja “o parcelamento tributário [do IPTU] requerido por um dos devedores solidários não importa em renúncia à solidariedade em relação aos demais coobrigados”, um de seus fundamentos judiciais tornou-se objeto de análise deste trabalho, qual seja, uma obrigação pura afasta uma obrigação ob rem.

      No tocante ao direito obrigacional propter rem, a sua influência ultrapassou o direito civil, para alcançar o direito tributário, pois serviu para configurar uma classe de tributos reais (IPTU e ITR) ou condominiais, em razão de causa ambulatória ligada à titularidade da situação jurídica ao bem imóvel. Por exemplo, a obrigação de pagamento de IPTU independe da vontade das partes, e sim da relação jurídica do contribuinte com o imóvel.

      Assim, será analisada a obrigação ob rem sob o viés jurisprudencial do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU, de competência dos Municípios.

      No caso, cabe à lei complementar a definição dos contribuintes (arts. 146 e 156 da CF/1988), a qual se deu pelo Código Tributário Nacional, que, por sua vez, definiu que o contribuinte do IPTU é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título (art. 34 do Código Tributário Nacional – CTN).

      O critério interpretativo do art. 34 do CTN pode ser ilustrado na ementa do REsp 475.078/SP, 1ª turma, DJ 27/09/2004, de Rel. Min. Teori Albino Zavascki, a saber: “Ao legislador municipal cabe eleger o sujeito passivo do tributo, contemplando qualquer das situações previstas no CTN. Definindo a lei como contribuinte o proprietário, o titular do domínio útil, ou o possuidor a qualquer título, pode a autoridade administrativa optar por um ou por outro visando a facilitar o procedimento de arrecadação”.

      Em suma, a definição de contribuinte tem como principal critério a facilidade no procedimento de arrecadação fiscal, complementando, assim, o art. 34 do CTN, cuja leitura pode ser assim: “Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título, podendo a autoridade administrativa optar por um ou por outro visando a facilitar o procedimento de arrecadação, tendo em vista a facilidade na arrecadação tributária”.

      O Tribunal Superior também firmou orientação segundo a qual “a existência de possuidor apto a ser considerado contribuinte do IPTU não implica a exclusão automática, do polo passivo da obrigação tributária, do titular do domínio (assim entendido aquele que tem a propriedade registrada no Registro de Imóveis)” (REsp 475.078/SP, 1ª turma, DJ 27/09/2004).

      A 1ª turma do STJ (AgInt no Resp nº 1.948.435 – RJ, DJe 18/11/2021) ratificou o entendimento proferido pela 1ª seção do Tribunal Superior, por meio do REsp 1110551/SP, 1ª seção, DJe 18/06/2009, no qual ficou pacificado “o entendimento de que a existência de contrato de compromisso de compra e venda de imóvel, com transferência imediata da posse, ainda que acompanhada de registro no cartório imobiliário, não afasta a responsabilidade tributária do alienante [do pagamento de IPTU]”.

      No julgamento do REsp 1110551/SP, com repercussão geral, a 1ª seção proferiu a seguinte Tese 122: “1-Tanto o promitente comprador (possuidor a qualquer título) do imóvel quanto seu proprietário/promitente vendedor (aquele que tem a propriedade registrada no Registro de Imóveis) são contribuintes responsáveis pelo pagamento do IPTU; 2-cabe à legislação municipal estabelecer o sujeito passivo do IPTU”.

      Nesse contexto, configura-se devedores solidários o contribuinte registral (proprietário com registro de imóveis) e o compromissório-comprador com direito real à aquisição (art. 1.417 do CC/02) ou compromissário-comprador com direito real de adjudicação compulsória (art. 1.418 do CC/02 e súmula 239 do STJ), nos moldes do art. 282 do Código Civil (“a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes”).

      Entretanto, em caso de parcelamento tributário por um dos devedores solidários (art. 151, inciso VI, c/c o art. 155-A, ambos do CTN), desprovida de renúncia expressa, pelo sujeito ativo da exação, em relação à solidariedade passiva do promitente-vendedor, não configura razão bastante para afastar a lógica da tese firmada no Tema 122/STJ (REsp 1.978.780-SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, 2ª Turma, por unanimidade, julgado em 05/04/2022).

      Em suma, fica evidente que, para fins de definição de sujeito passivo do IPTU, a ambulatoriedade obrigacional, também conhecida como obrigação propter rem, alcança às partes ligadas juridicamente ao bem imóvel, a despeito do registro de imóveis.

      Pois bem, no obter dictum do voto do rel. Min. Benedito Gonçalves, no AgInt no REsp 1.948.435/RJ, com publicação no DJe 18/11/2021, que não traz muitas explicações, mas cujo texto também se encontra no item 3 de sua ementa, a saber: “só a escritura definitiva de compra e venda autoriza o reconhecimento da ausência de responsabilidade tributária do proprietário vendedor do imóvel, razão pela qual não serve a essa finalidade o contrato de promessa, ainda que registrado e apoiado nas cláusulas de irretratabilidade e irrevogabilidade”.

      Acontece que, no referido voto, como não menciona a necessidade de registro de imóveis da escritura da escritura definitiva, bem como não informa se é o caso de loteamento – cujo compromisso de compra e venda vale como título ao registro de propriedade de lote adquirido (art. 26, § 6º, da Lei n. 6.766/79) –, é possível concluir que as 1ª e 2ª turmas do STJ entendem realmente pelo afastamento de uma obrigação propter rem por causa de uma relação puramente obrigacional (escritura pública definitiva)?

      Peço ajuda aos universitários…

      Lourival da Silva Ramos Júnior

      Tabelião/Registrador da Serventia Extrajudicial de Sucupira do Riachão/MA.

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