TJSP – CSM – Negativa de registro de escritura pública de doação por ofensa ao princípio da continuidade – Inexistência – Coincidência entre os disponentes e os titulares de domínio segundo o registro – Ausência de irregularidades.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível n.º 1001340-70.2018.8.26.0538

      Registro: 2022.0000433974

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.º 1001340-70.2018.8.26.0538, da Comarca de Santa Cruz das Palmeiras, em que é apelante WAYNE WILLIAM HOLLAND, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SANTA CRUZ DAS PALMEIRAS.

      ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento, com determinação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 31 de maio de 2022.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL n.º 1001340-70.2018.8.26.0538

      APELANTE: Wayne William Holland

      APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Santa Cruz das Palmeiras

      VOTO N.º 38.688

      Registro de Imóveis – Negativa de registro de escritura pública de doação por ofensa ao princípio da continuidade – Inexistência – Coincidência entre os disponentes e os titulares de domínio segundo o registro – Ausência de irregularidades que impeçam o ingresso do título telado no fólio real – Cancelamento do bloqueio determinado pela sentença recorrida – Apelação a que se dá provimento, com determinação.

      Trata-se de apelação interposta por WAYNE WILLIAM HOLLAND em face da r. sentença de fls. 71/73, que manteve a recusa levantada pelo Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Santa Cruz das Palmeiras, negando registro à escritura pública de doação com determinação para bloqueio da Matrícula n.º 1.969 (fls. 17/26).

      Da nota devolutiva (fls. 15) constaram os seguintes óbices:

      “1) há indícios de transmissão do domínio útil em percentual além do que dispunha o transmitente e transmissão do domínio útil por pessoas que não eram titulares desse direito sobre o imóvel; seria necessária a correção de alguns atos lançados na matrícula 1.969:

      No R.11/M. 1.969, Godofredo Renato Meduna Pignataro transmitiu 3/28 do imóvel; no entanto, ele seria titular de apenas 1/14 do domínio útil; para verificação do percentual transmitido e, eventualmente, retificação do ato, seria necessária apresentação do título original dque deu origem ao R.11;

      No R.16/M 1.969, Carla Maria Avesani, Francisco José Avesani e sua mulher, Tatiana Pimentel Rios Avesani, Adelina Maria Avesani Spengler e seu marido, Eduardo de Melo Spelngler, e Maria do Carmo Avesani Machado e seu marido Edvaldo Tadeu Mecia Machado figuram como transmitentes; no entanto, não consta registro por meio do qual eles teriam adquirido o domínio útil do imóvel; para verificação dos transmitentes e, eventualmente, retificação do ato, seria necessária apresentação do título original que deu origem ao R. 16”.

      Em suas razões, sustenta o recorrente, em suma, inexistir desrespeito ao princípio da continuidade, pugnando pelo provimento do apelo, com o cancelamento do bloqueio da Matrícula n.º 1.969, do Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Santa Cruz das Palmeiras.      

      A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 113/114).

      É o relatório.

      O recurso merece provimento.

      Por escritura pública de venda e compra lavrada em 24 de outubro de 2000, às fls. 292/296, do Livro n.º 100, perante o Tabelião de Notas da Comarca de Santa Cruz das Palmeiras, registrada em 23 de agosto de 2001, sob n.º 16, na Matrícula n.º 1.969, do Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Santa Cruz das Palmeiras, o apelante e sua irmã, Vanessa Pauliana Holland, adquiriram do Espólio de Antonio Avesani e outros, o domínio do imóvel situado na Rua Crispim de Abreu, nº 775 (fls. 24/25).

      Em 18 de julho de 2018 foi lavrada a escritura pública de doação perante o Tabelião de Notas e Protestos da Comarca de Porto Ferreira, Livro nº 277, fls. 274/276, figurando como doador o recorrente, casado com Alessandra da Silva Holland, e donatário, Breno Silva Holland, filho do apelante, tendo por objeto 50% do imóvel matriculado sob o n.º 1.969, no Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Santa Cruz das Palmeiras.

      Levado a registro, o título foi qualificado negativamente nos termos da nota devolutiva de fls. 15 supramencionada.

      A despeito dos bem lançados fundamentos constantes da exordial, não se vislumbra ofensa ao princípio da continuidade por força do qual só se admite a inscrição (registro stricto sensu ou averbação – Lei n.º 6.015, art. 167, I e II) “daqueles actos de disposição em que o disponente coincide com o titular do direito segundo o registro” (Carlos Ferreira de Almeida, apud Ricardo Dip, Registros sobre Registros, n.º 208).

      In casu, do título qualificado negativamente constou como doador de 50% do imóvel matriculado sob o n.º 1.969 o ora recorrente, casado com Alessandra da Silva Holland.

      E do R.16 da Matrícula telada constam como adquirentes o apelante e sua irmã, Vanessa Pauliana Holland.

      No ponto, então, não se observa ofensa ao princípio da continuidade, uma vez existir coincidência entre o disponente e o titular de domínio segundo o registro.

      Nas palavras de Afrânio de Carvalho (Registro de Imóveis, 3ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1982, p. 304):

      “O princípio de continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidades à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões que derivam umas das outras, asseguram sempre a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente. Ao exigir que cada inscrição encontre sua procedência em outra anterior, que assegure a legitimidade da transmissão ou da oneração do direito, acaba por transformá-la no elo de uma corrente ininterrupta de assentos, cada um dos quais se liga ao seu antecedente, como o seu subseqüente a ele se ligará posteriormente. Graças a isso o Registro de Imóvel inspira confiança ao público”.

      De outro lado, a despeito de, como observado pelo I. Registrador, terem constado inadvertidamente como transmitentes do R. 16, Carla Maria Avesani, Francisco José Avesani e sua mulher,

      Tatiana Pimentel Rios Avesani, Adelina Maria Avesani Spengler e seu marido, Eduardo de Melo Spengler, e Maria do Carmo Avesani Machado e seu marido Edvaldo Tadeu Mecia Machadocerto é que todos aqueles que, por título anterior, eram titulares de domínio do imóvel matriculado sob o n.º 1.969, figuraram como transmitentes do R. 16, não contaminando, assim, a totalidade do assento.

      Tampouco constitui óbice ao ingresso da escritura pública de doação no fólio real a apontada inconsistência no R. 11/M. 1.969 (antecedente ao R.16/M. 1.969), em que constou que o Espólio de Godofredo Renato Meduna Pignataro transmitiu 3/28 do imóvel a Nair Avesani Pignataro, Godofredo Pignataro Neto e Erika Avesani Pignataro, quando era titular de apenas 1/14 do domínio.

      Como levantado pelo próprio Oficial, se o Espólio de Godofredo Renato Meduna Pignataro transmitiu 3/28 do domínio do bem, apesar de ser titular de apenas 1/14, ele, ao final, acabou transmitindo tudo o que titulava.

      Ademais, como já ressaltado, Nair Avesani Pignataro, Godofredo Pignataro Neto (com autorização de sua mulher, Carmen Silvia Mira Pignataro) e Erika Avesani Pignataro constam, juntamente com os demais titulares de domínio, como transmitentes do R. 16/M. 1.969.

      As apontadas irregularidades, portanto, não impedem o ingresso do título telado na Serventia Imobiliária.

      O registro constante do R. 11 não é mais eficaz, pois já cancelado por transmissão legítima, ainda que tumultuada.

      Observa-se, por oportuno, que a declaração de nulidade, com o consequente cancelamento, só é cabível em defesa da regularidade dos assentos, o que, contudo, não se mostra necessário à vista, como dito, da ineficácia do registro pretérito.

      No ponto, vale trazer à baila lição de Luis Guilherme Loureiro, que, ao comentar a invalidade do registro, consignou que:

      “(…) Entretanto, não é qualquer vício que causa a invalidade do registro, sobretudo aquele mais antigo. Conforme pronunciamento da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo:

      ‘A pesquisa rigorosa e implacável de vícios quando dos primeiros registros feitos no regime do Código Civil levaria, certamente, ao aniquilamento da propriedade no país’. Diante disso, entendeu-se que cancelamento administrativo previsto no art. 214 da Lei n.º 6.015/73 está subordinado a determinados requisitos: a) existencia de vício registrário; b) efetivo prejuízo que tal vício cause a terceiros; e c) conveniência da Administração, sopesando os efeitos que trarão a manuntenção do registro viciado ou o seu cancelamento” (Registros Públicos, Teoria e Prática, 7ª edição, Editoa JusPODIVM, 2016).

      Finalmente, não se verifica razão para a subsistência do bloqueio determinado pelo MM. Juiz Corregedor Permanente na matrícula n.º 1.969.

      Em primeiro lugar, a providência não pode ser decretada no curso da ação de dúvida, cujo campo de cognição se limita à possibilidade ou não de registro de um título; assim, quaisquer outras providências registrais (bloqueios, nulidades e retificações, por exemplo) têm de ser tomadas na via administrativa própria, como já reconheceu este C. Conselho Superior da Magistratura (cf. Apel. Cív. N.º 964-6/0, j. 16.6.2009). Em segundo lugar, e como se sabe, cuida-se de medida administrativa de caráter preventivo e pressupõe que, demonstrada ou vislumbrada situação de nulidade de pleno direito, seja também constatado que a superveniência de novas inscrições (“registros”) poderá causar danos de difícil reparação (art. 214, § 3º), o que, à vista do já exposto, não ocorre no caso em tela. Assim, depois do trânsito em julgado, além das providências previstas no art. 203, I, da Lei n.º 6.015/1973, deverá ser providenciado o cancelamento do bloqueio, na instância de origem.

      Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento ao recurso, com determinação.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

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