TJSP – CSM – Hipoteca judiciária – Dúvida – Manutenção da recusa do registro – Princípio da especialidade objetiva – Transcrições que não permitem a localização do imóvel no solo – Necessária a retificação para abertura da matrícula.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação nº 1002583-35.2022.8.26.0562

      Registro: 2023.000006402

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.º 1002583-35.2022.8.26.0562, da Comarca de Santos, em que é apelante ISAAC DE FARIA, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SANTOS.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 27 de janeiro de 2023.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça

      Relator

      APELAÇÃO CÍVEL N.º 1002583-35.2022.8.26.0562

      APELANTE: ISAAC DE FARIA

      APELADO: 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SANTOS

      VOTO N.º 38.891

      Registro de imóveis – Hipoteca judiciária – Dúvida – Manutenção da recusa do registro – Princípio da especialidade objetiva – Transcrições que não permitem a localização do imóvel no solo – Necessária a retificação para abertura da matrícula – Apelo improvido.

      Trata-se de apelação (fls. 124/138) interposta por ISAAC DE FARIA contra a r. sentença (fls. 118/121), proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do 1º Oficial de Registro de Imóveis de Santos, que julgou procedente a dúvida suscitada, mantendo a recusa de registro de hipoteca judiciária dos imóveis das transcrições n.os 21.816 e 21.817 daquela Serventia.

      Fundou-se o óbice registral, em suma, na necessidade de melhor descrever os imóveis para a abertura das matrículas, havendo que se realizar a retificação do registro e juntar a certificação pelo INCRA, para, só, então, registrar a hipoteca judiciária (fls. 46/47).

      Aduz a apelante, em síntese, que a hipoteca judiciária deve ser registrada nos termos do item 2, I, do artigo 167, da Lei de Registros Públicos, e que a abertura da matrícula deve se dar com a descrição dos imóveis contida nas transcrições.

      A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 155/157).

      É o relatório.

      Isaac de Faria apresentou requerimento para registro de hipoteca judiciária à margem das transcrições nos 21.816 e 21.817, o qual recebeu a prenotação nº 305.482 no 1º Oficial de Registro de Imóveis de Santos.

      A Nota de Devolução nº 470 (fls. 46/47) indicou como motivos de recusa do ingresso do título:

      “- De acordo com o item 2, inciso I, do artigo 167, da Lei nº 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos), a hipoteca trata-se de ato de registro, não sendo possível sua averbação a margem das transcrições 21.816 e 21.817, sendo necessária portanto a abertura das matrículas dos imóveis objeto dos citados registros.

      -Tendo em vista que as Transcrições nº 21.816 e 21.817 referemse a áreas que formam a Fazenda Pelaes, e devido as descrições precárias das mesmas, é necessário providenciar antes a retificação dos imóveis para constar suas medidas lineares, área e confrontações atualizadas, nos termos do item II, do artigo 213, da Lei nº 6.015/73, alterada pela Lei nº 10.931/04, e em se tratando de imóveis rurais, apresentar o levantamento topográfico georreferenciado, devidamente certificado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INCRA, atestando que o imóvel não se sobrepõe a nenhum outro constante do cadastro de imóveis georreferenciados do referido órgão, esclarecendo que o pedido de retificação administrativa de medidas, áreas e confrontação poderá ser negado com base na NOTA constante do item 136.6, Cap. XX, Tomo II, das NSCGJ, in verbis:

      NOTA A retificação será negada pelo Oficial de Registro de Imóveis sempre que não for possível verificar que o registro corresponde ao imóvel descrito na planta e no memorial descritivo, identificar todos os confinantes tabulares do registro a ser retificado, ou implicar transposição, para o registro, de imóvel ou parcela de imóvel de domínio público, ainda que não seja impugnada. (grifo nosso).

      – Caso tratar-se de imóvel rural, para abertura da matrícula será necessário também:

      – Juntar Certificado de Cadastro de Imóveis Rurais CCIR atualizado, conforme item 57.II, do Cap. XX, Tomo II, das NSCGJ;

      – Juntar CAR Cadastro Ambiental Rural contendo a especialização da reserva legal florestal, conforme item 10.4, do Cap. XX, Tomo II, das NSCGJ e parágrafo 3º, do artigo 29, da Lei nº. 12.651/2012;

      – Juntar os ITR´s dos últimos 5 exercícios e os respectivos comprovantes de pagamento ou Certidão Negativa de Débitos Relativo ao Imposto Sobre a Propriedade Territorial Rural, conforme artigo 21, da Lei 9.393/1996”.

      Insiste o apelante que os elementos identificadores dos imóveis constantes das respectivas transcrições devem ser aceitos para a abertura das matrículas. Alega que não é o momento de se exigir o aprimoramento da descrição imobiliária, devendo ser recepcionadas aquelas que constam das transcrições, por mais precária que sejam, permitindo-se, assim, a observância ao princípio da continuidade registrária, o tráfego de transações envolvendo os imóveis e o atendimento ao princípio da equidade, nos termos dos artigos 4º e 5º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, e do artigo 723, parágrafo único, do Código de Processo Civil.

      Mas não tem razão.

      O artigo 176, §1º, I, da Lei 6.015/1973, estabelece que

      “cada imóvel terá matrícula própria, que será aberta por ocasião do primeiro ato de registro ou de averbação caso a transcrição possua todos os requisitos elencados para a abertura da matrícula”.

      Dentre os requisitos da matrícula, destaca-se a identificação do imóvel, que será feita com indicação: “a – se rural, docódigo do imóvel, dos dados constantes do CCIR, da denominação e de suascaracterísticas, confrontações, localização e área; b – se urbano, de suas característicase confrontações, localização, área, logradouro, número e de sua designação cadastral,se houver” (art. 176 §1º, II, item “3”, Lei 6.015/1973).

      E como dispõe o §15 do artigo 176, da mesma lei,

      “ainda que ausentes alguns elementos de especialidade objetiva ou subjetiva, desde que haja segurança quanto à localização e à identificação do imóvel, a critério do oficial, e que constem os dados do registro anterior, a matrícula poderá ser aberta nos termos do § 14 deste artigo”.

      Na espécie, houve requerimento para registro de hipoteca judiciária relativamente a dois imóveis identificados em transcrição, o que deflagrou a necessidade de serem abertas as respectivas matrículas.

      Ante a descrição precária dos imóveis contida nas transcrições e que não permitia a abertura da matrícula mesmo que ausentes alguns elementos de especialidade objetiva, o Registrador apresentou a exigência para a retificação do imóvel, assim como para a apresentação do Certificado de Cadastro de Imóveis Rurais (CCIR) atualizado, do CAR Cadastro Ambiental Rural (CAR), e dos ITR´s dos últimos 5 exercícios e os respectivos comprovantes de pagamento ou Certidão Negativa de Débitos Relativo ao Imposto Sobre a PropriedadeTerritorial Rural, tudo conforme os dispositivos normativos que indicou.

      De fato, a vagueza da descrição do imóvel contida nas transcrições é tamanha que não autorizava a abertura das correspondentes matrículas.

      Pela leitura da descrição dos imóveis nas transcrições n.os 21.816 (fls. 55/72) e 21.817 (fls. 73 a 88), constata-se que as áreas são aproximadas, portanto, não precisas, e as informações sobre seu perímetro e confrontantes não permitem saber onde elas se encontram no solo. Destaca-se que as confrontações fazem referências a acidentes naturais e a vizinhos, cuja titulação é desconhecida e que muito provavelmente já não se encontram no local.

      Confira-se parte de cada uma das transcrições:

      “TERRAS que formam a Fazenda Pelaes, nesta cidade, descritas como se seguem: ÁREA Nº 1 Aproximadamente 4.772.000 m². de terras no local denominado Itatinga, delimitadas como segue: A partir do marco 1, situado a 50,00 ms. do eixo da linha de torres, medidos para o lado da Serra a 100,00 ms. da margem direita do Rio Tachinhos, desse marco 1 e para o lado da serra, delimitando com terras de José Vergara por uma paralela à margem direita do Rio Tachinhos até encontrar o marco 2, distante 430,00 ms do eixo da linha de torres; desse marco 2 e para o lado Oeste, pelo alinhamento reto que serve de divisa com terras de José Vergara até encontrar o marco 39, …” (Transcrição 21.816).

      “‘TERRAS DESMEMBRADAS DA FAZENDA PELAIS’, na Comarca de Santos, descrito como segue: ÁREA Nº1 Aproximadamente 1.560.000 m² de terras no local denominado Itatinga, delimitadas como segue: A partir do marco 3, situado na perpendicular ao eixo da linha de torres, levantada a 41,00 ms. do centro da torre nº 13, medidos para o lado de Itatinga e a 1.483,5 ms. desse mesmo eixo, medidos para o lado da Serra; desse marco 3 e para o lado Norte, delimitando com terras do Serviço Social do Comércio, pelo divisor das águas das bacias do Guaxanduba e Três Torres, até encontrar o espigão secundário das bacias do Itapanhaú e alto do Itatinga; desse ponto e para o lado do Nordeste, delimitando com terras da adquirente, por esse mesmo espigão secundário, até encontrar o divisor de águas das bacias dos rios Tachinhos e Ponte Preta;…” (Transcrição 21.817).

      Não se pretende, no caso, exigir extremo rigor na observância do princípio da especialidade objetiva, apenas obstar a que descrições que não possibilitam a localização do imóvel sejam consideradas para a abertura de novas matrículas.

      Nesse sentido, destaco ementa e parte do voto proferido pelo então Corregedor Geral de Justiça, DES. RICARDO MAIR ANAFE, nos autos da Apelação Cível n° 1010738-19.2020.8.26.0361, julgada por este Conselho Superior de Magistratura em 13 de maio de 2021:

      “Registro de Imóveis – Dúvida – Título notarial – Escritura de venda e compra – Imóvel rural – Princípio da especialidade objetiva – Descrição tabular deficiente – Imóvel que, embora ainda não esteja sujeito a georreferenciamento, vem descrito de modo absolutamente precário, sem nenhum ponto de amarração – Prédio que não pode ser considerado um corpo certo – Impossibilidade de aplicar-se o item 10.1.1 do Capítulo XX do Tomo II das NSCGJ – Apelação a que se nega provimento, mantida a r. sentença.

      (…)

      In casu, não se pode dizer que tenha mera ‘descrição precária’, mas possa ser identificado como ‘corpo certo’, um imóvel cujas confrontações não possuem nenhum ponto de amarração, ou, por outras palavras, cujas confrontações não é possível saber onde se iniciam (‘começa numa pedra que se acha na beira de um ribeirão’) nem aonde vão chegar (‘daí segue em rumo direito, dividindo com Augusto Antonio Rodrigues, até encontrar outra pedra, daí segue dividindo com Francisco Cardoso, até encontrar terras de Guilherme Pessolato; daí segue rumo direito até encontrar uma pedra e daí dividindo com Benedito Rodrigues, até a pedra, ponto de partida’)”.

      No mais, incabível a invocação do artigo 4º, da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, porque não ocorre omissão legislativa a autorizar a decisão de acordo com a analogia, os costumes e os princípios legais de direito.

      Com referência ao artigo 5º, da mesma lei, não se vislumbra ofensa às exigências do bem comum nem aos fins sociais a que a lei se dirige ao exigir, na hipótese vertente, que a abertura das matrículas dos imóveis transcritos se deem após sua retificação para constar suas medidas lineares, área e confrontações atualizadas.

      Ao contrário, a boa descrição dos imóveis é que dará atendimento ao disposto no artigo 5º, da LINDB. Da mesma forma, não se mostra oportuno e conveniente abrir as matrículas com os elementos de descrição precários das transcrições apenas para atender ao interesse do apelante, não havendo, então, espaço para a aplicação do disposto no artigo 723, parágrafo único, do Código de Processo Civil, notadamente na via administrativa em que a questão está colocada.

      Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça

      Relator.

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