TJSP – CSM – Escritura pública de divisão de imóvel – Ao oficial de registro de imóveis incumbe examinar e qualificar o título que lhe é apresentado para registro e, caso o considere inapto a tanto, é seu dever indicar em nota devolutiva as razões da recusa.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação nº 1003892-87.2016.8.26.0114

      Registro: 2022.0000738075

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1003892-87.2016.8.26.0114, da Comarca de Campinas, em que é apelante JOSÉ CARLOS SPANHOLETTO, é apelado QUARTO OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE CAMPINAS.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento à apelação e anularam o procedimento de dúvida ab initio, v. u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 9 de setembro de 2022.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça

      Relator

      APELAÇÃO CÍVEL nº 1003892-87.2016.8.26.0114

      APELANTE: José Carlos Spanholetto

      APELADO: Quarto Oficial de Registro de Imóveis da comarca de Campinas

      VOTO Nº 38.796

      Registro de imóveis – Escritura pública de divisão de imóvel – Registro obstado – Dúvida suscitada – Ao oficial de registro de imóveis incumbe examinar e qualificar o título que lhe é apresentado para registro e, caso o considere inapto a tanto, é seu dever indicar em nota devolutiva as razões da recusa – Impossibilidade de suscitação de dúvida com apresentação de óbices hipotéticos, condicionados a cenários diversos – Nulidade configurada – Apelação provida, com determinação.

      Trata-se de recurso interposto por José Carlos Spanholeto contra a r. sentença que julgou procedente dúvida suscitada em virtude de negativa de registro de escritura pública de divisão amigável tendo por objeto o imóvel matriculado sob nº 13.016 junto ao 4º Oficial de Registro de Imóveis de Campinas, mantendo os óbices registrários (fls. 131/133).

      Alega o recorrente, em síntese, que a escritura de divisão amigável levada a registro, com as respectivas retificações, especialmente aquela realizada para incluir na descrição do imóvel a faixa de servidão noticiada pelo 2º Oficial de Registro de Imóveis de Campinas, em 13 de setembro de 2015, está em perfeita consonância com os princípios da continuidade e especialidade objetiva. Aduz que elementos estranhos ao título que se pretende registrar não podem ser considerados pelo Oficial para fins de qualificação registrária, de maneira que eventual doação realizada no passado e o instrumento de instituição de servidão celebrado com a SANASA não podem obstar o acesso do título ao fólio real, devendo a escritura de divisão amigável, com seus respectivos aditamentos e retificações, ser registrada tal como lavrada. Entende que as exigências formuladas pelo Oficial não merecem subsistir, pois não há certeza, a partir dos registros existentes, de que a área da denominada viela sanitária pertence ao Município, sobretudo porque o titular de domínio paga IPTU incidente sobre toda a área do imóvel, ou seja, 918m². Ressalta que a referida viela sanitária não configura área pública, mas sim, um ônus para o imóvel, devidamente mencionado na escritura cujo registro requer (fls. 135/144).

      A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 175/177 e fls. 195).

      Os autos foram encaminhados da E. Corregedoria Geral da Justiça para este C. Conselho Superior da Magistratura (fls. 179/181).

      É o relatório.

      De início, saliente-se que se cuida (como já foi ressaltado a fls. 179/181) de dúvida e de recurso de apelação, uma vez que a inscrição colimada é registro em sentido estrito (artigos 198, 203, II, e 296, da Lei nº 6.015, 31 de dezembro de 1973). De qualquer forma, o erro de nominação em nada prejudica o processamento do apelo, pois foi respeitado o prazo legal para interposição, de resto idêntico para essa espécie e para o recurso inominado (artigo 202, da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, artigo 1003, § 5º, do Código de Processo Civil, e artigo 246, do Código Judiciário de São Paulo).

      Pois bem. Foi prenotada, sob nº 71.303, a escritura pública de divisão amigável, lavrada em 20 de junho de 2007, fls. 189/192 do livro nº 183 do Tabelião de Notas do Distrito de Souzas, Município de Campinas/SP, e seus respectivos aditamentos e retificações, tendo por objeto o lote 2 da quadra 6 do loteamento denominado Jardim Conceição, matriculado sob nº 13.016 junto ao 4º Oficial de Registro de Imóveis de Campinas, anteriormente matriculado sob nº 55.317 junto ao 2º Oficial de Registro de Imóveis de Campinas, tendo o Oficial de Registro expedido a nota de devolução a fls. 80, cujas exigências foram mantidas por ocasião da suscitação da presente dúvida. A propósito, esclareceu o registrador que (fls. 01/05):

      “O título foi apresentado anteriormente nada menos do que 10 (dez) vezes (…), exigindo-se, na última devolução, que a partir da documentação juntada, fosse descontada do imóvel a porção relativa à faixa da viela sanitária objeto da transcrição nº 10.478, com apuração do remanescente, com as devidas adaptações tanto no projeto de desdobro quanto na escritura de divisão, já que estes contemplam o imóvel sem descontar a área da faixa de servidão, ficando a advertência a ser observada no processo de retificação, de que a certidão da transcrição nº 10.478 não esclarece a qual loteamento pertence e tampouco o motivo pelo qual a faixa de viela deixou de ser destacada do lote 2 da quadra 6, quando da abertura da matrícula 55.317 pelo 2º Oficial de Registro de Imóveis de Campinas, bem como que a descrição tabular da viela contida na transcrição nº 10.478 está divergente daquela lançada na escritura de divisão retificada”.

      Ainda, apresentando dois cenários – um deles considerando a pré-existência da viela sanitária “desde a transcrição nº10.478 do 2º Oficial de Registro de Imóveis de Campinas, lavrada a partir daapresentação da escritura de doação lavrada pelo 3º Tabelião de Notas deCampinas” e outro, “a nova constituição de servidão de viela sanitária” – o Oficial de Registro relacionou, para cada uma das hipóteses, diferentes óbices à inscrição postulada.

      Ora, não poderia o registrador suscitar dúvida condicional, apresentando situações hipotéticas.

      Com efeito, a ele cabe examinar o título apresentado, de forma exaustiva, a partir de pesquisas nas tábuas registrárias existentes e, havendo exigências de qualquer ordem, formulá-las de uma só vez (NSCGJ, Capítulo XX, item 38).

      A qualificação registral é ato próprio do registrador, que deve analisar o título com base em seus saberes jurídicos e técnicos. Trata-se de atribuição fundamental e indissociável da atividade do Oficial de Registros, de natureza obrigatória, inafastável e vinculada ao princípio da legalidade, que traduz o controle dos requisitos legais e normativos do documento apresentado, em juízo prudencial (DIP, Ricardo. Registro de Imóveis: vários estudos. Porto Alegre: IRIB: Sérgio Antonio Fabris; Ed., 2005. p. 168).

      Para obtenção da segurança jurídica que se espera dos registros públicos, não basta que o registrador impeça o acesso de títulos inaptos. Há que possibilitar a correção dos títulos viciados, expedindo nota devolutiva clara, explicativa e conclusiva, jamais condicional.

      Em outras palavras, a qualificação deve abranger completamente a situação examinada, em todos os aspectos relevantes para ingresso do título no fólio real ou seu indeferimento, permitindo a certeza de sua aptidão registrária, ou a indicação integral das deficiências para a inscrição perseguida, lembrando-se, por oportuno, que o procedimento de dúvida é limitado à análise da insurgência do apresentante com as exigências formuladas para o registro do título, como disposto no art. 198 da Lei nº 6.015/73.

      No caso concreto, o registrador, ao suscitar a presente dúvida, deixou de qualificar o título segundo a inscrição que lhe foi rogada e o título protocolado. Em verdade, fez referência à última nota devolutiva expedida e, contradizendo-se, apresentou óbices relacionados às diferentes prenotações anteriormente realizadas, deixando, assim, de esclarecer qual seria a exigência específica para registro do título agora prenotado.

      Como é sabido, ao Oficial de Registro de Imóveis não é possível substituir a qualificação dos títulos que lhe são apresentados para registro mediante questionamento ao Juiz Corregedor Permanente quanto à admissibilidade da prática de ato de registro considerado em seu sentido estrito ou mesmo ao modo como deve fazê-lo. Não se enfeixa no âmbito das funções administrativojudiciais da Corregedoria Permanente das Serventias Extrajudiciais e da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo “o múnus de responder aconsultas de caráter genérico, sequer o de, preventivamente, qualificar atosespecíficos, julgando de sua subsunção a determinada hipótese normativa, a cujopropósito dúvida possua serventuário incumbido de sua realização.” (CGJSP  Processo nº 81.013/87).

      Na forma como suscitada a dúvida, ou seja, com apresentação de óbices hipotéticos, condicionados às diferentes possibilidades de análise do título e documentos que o acompanham, o presente procedimento administrativo acabou por suprimir a qualificação que deveria ser realizada pelo registrador e adquiriu um caráter consultivo, o que não se admite.

      Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação e anulo o procedimento de dúvida ab initio, a fim de que o Oficial de Registro de Imóveis promova a qualificação do título, tal como protocolado, e formule as exigências que eventualmente entender cabíveis, prosseguindo-se, então, na forma do artigo 198, da Lei nº 6.015/1973.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça

      Relator.

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