TJSP – CSM – Escritura de inventário e partilha – Óbices relativos à especialidade objetiva de dois imóveis – Imóvel que sofreu pequeno desfalque, sem que, entretanto, se tenha feito impossível a verificação de disponibilidade quantitativa e qualitativa.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1000032-10.2020.8.26.0059

      Registro: 2021.0000815165

      ACÓRDÃO 

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000032-10.2020.8.26.0059, da Comarca de Bananal, em que é apelante MARIA CLÁUDIA TEIXEIRA FERRAZ, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DAS PESSOAS JURÍDICAS DA COMARCA DE BANANAL.

      ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram parcial provimento à apelação, para deferir o registro stricto sensu rogado para a matrícula nº 839, v.u.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

      São Paulo, 17 de setembro de 2021.

      RICARDO ANAFE

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      Apelação Cível nº 1000032-10.2020.8.26.0059

      Apelante: Maria Cláudia Teixeira Ferraz

      Apelado: Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de Bananal

      VOTO Nº 31.560

      Registro de Imóveis – Dúvida – Sucessão causa mortis – Título notarial – Escritura pública de inventário e partilha – Óbices relativos à especialidade objetiva de dois imóveis distintos – Imóvel que sofreu pequeno desfalque, sem que, entretanto, se tenha feito impossível a verificação de disponibilidade quantitativa e qualitativa – Inexistência de inovação na descrição do imóvel desfalcado – Prédio tratado como corpo certo, o que permite o registro da partilha – Outro imóvel que, entretanto, tem área superior a cem hectares e tem de receber descrição por coordenadas georreferenciadas – Exigência de georreferenciamento que também se aplica às transmissões a causa de morte – Precedente – Exigência mantida quanto a esse segundo imóvel – Apelação a que se dá parcial provimento.

      1. Trata-se de apelação (fl. 83/108) interposta por Maria Claudia Teixeira Ferraz contra a r. sentença (fl. 78/79) proferida pelo MM. Juízo Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de Bananal, que julgou procedente a dúvida (fl. 01/06) e manteve a recusa (fl. 22/24 nota nº 205/2019) de registros stricto sensu de partilha causa mortis (fl. 25/31) nas matrículas nºs 839 e 2.504 daquele cartório (fl. 15/17 e 18/21).

      Está dito nas razões de dúvida (fl. 01/06) que foi apresentada a protocolo uma escritura pública de inventário e partilha que tem por objeto os imóveis das mencionadas matrículas nºs 839 e 2.504.

      Examinado esse título, formularam-se duas exigências de retificação administrativa desses registros, pois, de um lado, o prédio da matrícula nº 839 sofreu desmembramento, e é necessário apurar o remanescente; e, de outro lado, o imóvel objeto da matrícula nº 2.504 conta mais de cem hectares e, dessa forma, demanda descrição por georreferenciamento.

      Segundo a r. sentença (fl. 78/79), não é possível deferir os registros rogados, porque, como exigiu o cartório, em ambas as matrículas atingidas é necessário proceder à retificação. No caso da matrícula nº 839, a área foi desfalcada, e é preciso apurar o remanescente.

      Quanto à matrícula nº 2.504, deve ser inserida a descrição por georreferenciamento (Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, art. 176, § 4º; Decreto nº 4.449, de 30 de outubro de 2002, art. 10, V), por meio de processo de retificação (Lei nº 6.015/1973, art. 213, II), já que a descrição hoje existente é precária demais, por lhe faltarem as linhas perimetrais.

      Em seu recurso (fl. 83/108), alega a apelante que os direitos de propriedade em questão não foram transmitidos onerosa e voluntariamente, mas de modo gratuito e a causa de morte, e estão descritos na escritura pública de inventário e partilha tais como informava o registro de imóveis. As inscrições pretendidas em verdade só servem para declarar a transmissão já ocorrida, segundo a regra da saisina (Cód. Civil, art. 1.784), e, como revela a doutrina e os julgados colacionados, não se devem interpretar literalmente as normas aplicáveis ao georreferenciamento, como se também abrangessem as transferências causa mortis, o que não fazem. Ademais, não há nenhuma violação aos princípios da especialidade objetiva e da continuidade. Por conseguinte, os registros têm de ser deferidos, como foram rogados, depois de afastadas as exigências opostas pelo Ofício de Registro de Imóveis.

      A douta Procuradoria Geral de Justiça ofertou parecer pelo não provimento do recurso (fl. 157/158).

      É o relatório.

      2. A r. sentença tem de ser reformada em parte.

      Não há óbice para o registro stricto sensu da partilha no que diz respeito ao imóvel da matrícula nº 839.

      Como se verifica a fl. 15/17, esse prédio rústico efetivamente sofreu um desfalque, pois da área original, calculada em 80.366 m² (fl. 15), veio a ser subtraída, segundo a Av. 2 (fl. 15), a fração de 131,25 m². A despeito das imprecisões da descrição original e, depois, da parte destacada, fato é que o desmembramento havido, sendo pequeno e único, ainda permite concluir que subsiste disponibilidade quantitativa e qualitativa na matrícula, ou seja, que realmente houve transmissão de uma gleba, como documentado na escritura pública de inventário e partilha (fl. 28).

      Portanto, incide a regra das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, Tomo II, Capítulo XX, item 10.1.1, verbis:

      A descrição precária do imóvel rural, desde que identificável como corpo certo e localizável, não impede o registro de sua alienação ou oneração, salvo quando sujeito ao georreferenciamento ou, ainda, quando a transmissão

       implique atos de parcelamento ou unificação, hipóteses em que será exigida sua prévia retificação.” (grifou-se)

      Note-se: não se contesta que, considerado o atual estado da técnica e as exigências atuais da doutrina jurídica e do tráfego imobiliário, a descrição do imóvel tem de ser melhorada. Ainda como está, entretanto, fato é que a matrícula traz alguma indicação de área e de confrontações e, pois, pode receber o ato registral de transmissão causa mortis. A bem ver, a solução contrária (= o indeferimento da inscrição, nessas circunstâncias específicas) não só negaria eficácia à matrícula (que é válida e produz efeitos até que se desfaça, nos termos da Lei nº 6.015/1973, art. 252), como ainda facilitaria a clandestinidade e dificultaria, ainda mais, o seu aperfeiçoamento (neste caso, por negar que os herdeiros obtenham a disponibilidade de seu direito). Logo, deve-se afastar a exigência e proceder ao pretendido registro stricto sensu de partilha, relativo ao imóvel da matrícula nº 839, como rogado.

      Cabe salientar que a descrição do imóvel, tal como consta da matrícula (e, agora, do ato notarial), não foi em nada inovada, o que poderá ser feito no futuro, mediante apuração de remanescente, sem prejuízo atual para a segurança jurídica.

      Não pode ser deferida, contudo, a inscrição pedida para a matrícula nº 2.504.

      Não se nega e as razões recursais bem o demonstram – a possibilidade de discutir se as disposições dos §§ 4º5º e 13 do art. 176 e

      § 3º do art. 225 da Lei nº 6.015/1973 abrangem apenas os atos voluntários inter vivos que impliquem desmembramento, parcelamento, unificação ou transmissão total, ou também os atos coativos (e. g., os advindos da execução forçada) e os atos causa mortis: boas razões militam num e noutro sentido, dentre elas a facilitação do tráfego e da publicidade (em se tratando de transmissões oriundas do direito das sucessões) e a eficiência dos processos judiciais (em se tratando de constrições).

      No entanto, este Conselho Superior da Magistratura já atribuiu, aos dispositivos citados e aqueles que os regulamentam, interpretação segundo a qual a inscrição da partilha causa mortis também impõe a inserção de coordenadas georreferenciadas, uma vez que se tenha escoado o prazo previsto no art. 10 do Decreto nº 4.449, de 30 de outubro de 2002 – como sucede na hipótese, em que o prédio da matrícula nº 2.504 supera a área de cem hectares (fl. 18).

      Confira-se:

      “Registro de Imóveis – Dúvida – Negativa de registro de escritura pública de inventário e partilha – Imóvel Rural com Área superior a 100 hectares – Exigência de Georreferenciamento – Princípio da especialidade objetiva Óbice mantido – Apelação a que se nega provimento.” (CSM, Apelação Cível n. 1000075-91.2020.8.26.0302, j. 20.11.2020, DJe 08.3.2021).

      Consta do voto de vencedor:

      “A partir de referidas disposições legais e normativas inferese, pois, a necessidade de georreferenciamento dos imóveis rurais em qualquer situação de transferência, inclusive na hipótese telada de transmissão causa mortis.

      Objetiva-se, como já dito, a individualização do bem imóvel rural de modo a destacá-lo de qualquer outro, evitando-se, assim, a sobreposição, não havendo qualquer ressalva acerca da transmissão em razão da morte.

      Ao revés, a necessidade de identificação do imóvel rural apresenta-se, sem distinção, em qualquer situação de transmissão, seja voluntária ou não, até mesmo em casos de decisões judiciais e nas hipóteses de forma originária de transmissão da propriedade.

      […]

      Nesta ordem de ideias, uma vez necessário o georreferenciamento de imóveis rurais nas hipóteses de inventário judicial, não se vislumbra razão para qualquer distinção e dispensa de identificação por georreferenciamento nos inventários extrajudiciais.

      […]

      Não se olvida, ainda, que, consoante o Princípio da Saisine, a transmissão ocorre no momento da morte, conforme preceitua o Art. 1.784 do Código Civil: “Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.”

      […]

      A transmissão da propriedade dá-se, pois, no momento da abertura da sucessão e a partilha tem o efeito de encerrar o estado de indivisão, atribuindo a cada herdeiro a parte que lhe tocar.

      Contudo, o registro da escritura pública de inventário e partilha no Oficial de Registro de Imóveis é requisito para o ingresso de títulos de disposição da propriedade pelos herdeiros, em observância ao princípio da continuidade registral, sujeitando-se ao cumprimento das exigências legais e normativas, o que, contudo, não ocorreu no presente caso.”

      Finalmente, e em conclusão, saliente-se que a hipótese destes autos ou seja, a discussão, no mesmo processo da dúvida, de dois registros autônomos, cada qual numa matrícula distinta é o único caso em que se pode falar em provimento parcial do recurso: a apelação, como dito de início, tem de ser provida em parte quanto a uma inscrição apenas (matrícula nº 839), mantendo-se o óbice levantado à outra (matrícula nº 2.504).

      3. À vista do exposto, pelo meu voto, dou parcial provimento à apelação, para deferir o registro stricto sensu rogado para a matrícula nº 839.

      RICARDO ANAFE

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

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