TJSP – CSM – Descrição do imóvel no título em perfeita consonância com aquela constante da matrícula – Irrelevância do descompasso existente em relação aos dados cadastrais imobiliários mantidos pelo município – Princípio da especialidade objetiva observado.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1001704-11.2020.8.26.0655

      Registro: 2022.0000756795

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001704-11.2020.8.26.0655, da Comarca de Várzea Paulista, em que são apelantes JOBSON AROUDO OLIVEIRA COSTA e FERNANDA ALVES COSTA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE VÁRZEA PAULISTA.

      ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V. U. Deram provimento à apelação e julgaram improcedente a dúvida, com observação, v. u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 15 de setembro de 2022.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL nº 1001704-11.2020.8.26.0655

      APELANTES: Jobson Aroudo Oliveira Costa e Fernanda Alves Costa

      APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Várzea Paulista

      VOTO Nº 38.773

      Registro de imóveis – Compra e venda – Descrição do imóvel no título em perfeita consonância com aquela constante da matrícula – Irrelevância do descompasso existente em relação aos dados cadastrais imobiliários mantidos pelo município – Princípio da especialidade objetiva observado – Apelação provida para julgar improcedente a dúvida e autorizar o registro, com determinação.

      Trata-se de apelação interposta por Jobson Aroudo Oliveira Costa Fernanda Alves Costa contra a r. Sentença, proferida pela MM.ª Juíza Corregedora Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Várzea Paulista, que julgou procedente a dúvida suscitada e manteve a recusa do registro do instrumento particular de compra e venda, mútuo e alienação fiduciária, e respectivo instrumento de retificação, referente ao apartamento nº 1403, do Bloco 1, do empreendimento imobiliário Residencial Paraíso, localizado na Rua Vitória Régia, 199, Bairro Promeca, Várzea Paulista/SP, objeto da matrícula nº 10.960 da referida serventia extrajudicial (fls. 516/520).

      Alegam os apelantes, em síntese, que as exigências formuladas pelo registrador não merecem subsistir, pois o título apresentado a registro está em ordem, notadamente no que diz respeito à identificação do imóvel negociado. Afirmam que o imóvel está devidamente descrito no instrumento de contrato, tal como consta da matrícula nº 10.960, de maneira que os óbices apresentados não se relacionam ao título propriamente dito, mas sim, às informações relativas ao carnê de IPTU e à certidão de cadastro imobiliário expedida pela Municipalidade. Esclarecem que, à exceção da área predial, que não consta da matrícula do imóvel, todas as demais informações são idênticas, ressaltando que as Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça fazem menção à designação cadastral como um elemento de descrição não obrigatório. Dizem ter apresentado o carnê de IPTU do exercício de 2020 e a certidão de cadastro imobiliário emitida de forma manual pela Municipalidade, a fim de possibilitar a averbação da nova inscrição municipal, se o caso, e servir de parâmetro para o cálculo dos emolumentos e impostos devidos, regularmente recolhidos. Aduzem que não há obrigação legal por parte da Municipalidade, como pretende o registrador, de inclusão das áreas predial e territorial na certidão de valor venal, que se destina tão somente a informar a base de cálculo do IPTU.

      Acrescentam que a diferença de área do imóvel constante da matrícula e da certidão de dados cadastrais emitida pela Municipalidade decorre dos critérios diversos por esta adotados para o cálculo do IPTU, conforme a legislação municipal aplicável, e aqueles estabelecidos pela NBR 12.721, que trata da incorporação imobiliária. Por fim, anotam que as dificuldades criadas pelo Oficial ao registro pretendido se repetem em inúmeros outros casos, gerando insegurança jurídica na Comarca, razão pela qual requerem seja realizada correição na serventia extrajudicial (fls. 523/544).

      A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 577/579).

      É o relatório.

      Ao qualificar negativamente o título apresentado a registro, o Oficial expediu a Nota de Devolução nº 18.288, datada de 14.05.2020 (fls. 14/15), formulando as seguintes exigências:

      “Faltou juntar o carnê do imposto predial e territorial urbano (IPTU) do exercício de 2.020, do imóvel transacionado (apartamento 1.403, do Bloco 1, do empreendimento imobiliário denominado Residencial Paraíso, localizado no Bairro Promeca), objeto da matrícula 10.960, deste Oficial de Registro de Imóveis, necessário para embasar a averbação da nova inscrição cadastral municipal, e consequente especialização objetiva, bem como para servir de parâmetro para o cálculo de emolumentos, custas e contribuições

      (…).

      Outrossim, fica consignado, que foram anexadas (i) certidão de

      “VALOR (…)” venal (…), datada de 15 de julho de 2.019, mas que se refere (i.i) ao exercício de 2.019; e (i.ii) a imóvel diverso, o seja, Lote: GL E2-A, localizada no RESIDENCIAL ALEXANDRIA; e, (ii) segunda via do carnê do Imposto predial e territorial urbano (IPTU) do exercício de 2.020, do qual consta que o imóvel transacionado está situado no “RESIDENCIAL ALEXANDRIA”, e possui (ii.i) a área territorial de 84,98m²; e, (ii.ii) a área predial de 58,71m², divergindo da citada matrícula 10.960, deste Oficial de Registro de Imóveis, onde consta que o aludido imóvel está situado no “Bairro Promeca”, e possui as seguintes áreas: (a) 84,9773m²; e, (b) 83,9961m², respectivamente; o que deverá ser regularizado.

      Ademais, verifica-se que foi anexada certidão de cadastro imobiliário (protocolo nº 2672/2020), datada de 04 de maio de 2.020, expedida pelo órgão competente do Município de Várzea Paulista, Estado de São Paulo. Entretanto, faltou constar da aludida certidão de cadastro imobiliário, as áreas territorial e predial do imóvel transacionado, quais sejam, 84,9773m² e 83,9961m², respectivamente, o que deverá ser regularizado (…)”.

      Os interessados apresentaram a certidão de cadastro imobiliário e carnê de IPTU de 2020 e, por discordarem das demais exigências, requereram a suscitação de dúvida, promovendo o reingresso do título na serventia imobiliária.

      No instrumento particular de compra e venda, mútuo e alienação fiduciária em garantia de nº 155554016730, com caráter de escritura pública, firmado em 06 de março de 2020 (fls. 19/40), acompanhado do instrumento particular de retificação datado de 03 de abril de 2020 (fls. 107/110), apresentado a registro pelos apelantes, o imóvel objeto da avença está assim especificado:

      “Imóvel havido conforme da matrícula 10.960 do Oficial de Registro de Imóveis de VARZEA PAULISTA/SP, que assim se descreve: O apartamento nº 1403, Tipo 13, do Bloco 1, localizada no 14º andar, do empreendimento imobiliário RESIDENCIAL PARAÍSO, situado à Rua VITÓRIO RÉGIA, sob nº 199, Bairro Promeca, nesta cidade e comarca de Várzea Paulista/SP CEP: 13.223-470, cabendo-lhe o direito de duas vagas de garagem descobertas e indeterminadas de garagem no estacionamento descoberto (…), dispensando-se a sua inteira descrição nos termos do artigo 2º da Lei 7433/85. Inscrição Cadastral nº 32.028.234.”

      A certidão de matrícula nº 10.960 (fls. 136/143), de seu turno, traz a seguinte descrição do imóvel:

      UM APARTAMENTO, sob o número 1403 (um mil, quatrocentos e três)“Tipo 13”, do Bloco 1, localizado no 14º andar, do empreendimento imobiliário RESIDENCIAL PARAÍSO, situado na RUA VITÓRIA RÉGIA, sob o nº 199 (cento e noventa e nove), Bairro Promeca, nesta cidade e comarca de Várzea Paulista, Estado de São Paulo, com 02 (duas) vagas de garagem descoberta, contendo: 01 (uma) sala jantar/estar, 01 (uma) varanda coberta, 02 (dois) dormitórios, 01 (um) banheiro, 01 (uma) cozinha, 01 (uma) área de serviço e área de circulação; com área privativa de 48,8000 m², área de uso comum de divisão não proporcional de 24,0000 m², área de uso comum de divisão proporcional de 11,1961 m², totalizando uma área de 83,9961 m², corresponde a 0,17830%, equivalente a 84,9773 m² do terreno e coisas de uso comum do condomínio, cabendo-lhe o direito de uso de 02 (duas) vagas indeterminadas de garagem no estacionamento descoberto, as quais são inalienáveis, indivisíveis, acessórias e indissoluvelmente ligadas à unidade autônoma, com as seguintes confrontações: confronta-se pela frente, com a área de uso comum para estacionamento de veículos; do lado direito, confronta com a unidade autônoma de número 1402; do lado esquerdo, confronta com a área de uso comum para estacionamento de veículos; e, nos fundos, confronta com a unidade autônoma de número 1404”.

      Ao que se vê, o Oficial de Registro de Imóveis recusou o registro do título por existir divergência entre a certidão de cadastroimobiliário expedida pelo Município de Várzea Paulista e a matrículado imóvel.

      Com efeito, no cadastro imobiliário Municipal, referente ao exercício de 2020 (fls. 129 e 135), consta que o imóvel está cadastrado sob nº 32.028.393, possuindo 84,98m² de área de terreno e 58,71m² de área construída, divergindo, pois, da descrição constante da matrícula imobiliária (fls. 136/143).

      Ocorre que a divergência na descrição do imóvel não se dá entre o título e a matrícula, mas entre esta e a certidão de cadastro imobiliário expedida pelo Município de Várzea Paulista.

      Tal dissonância, portanto, não impede o registro pretendido, pois a descrição do imóvel trazida no título coincide com aquela lançada na matrícula. A propósito, ensina Narciso Orlandi Neto que “as regras reunidas no princípio da especialidade impedem que sejamregistrados títulos cujo objeto não seja exatamente aquele que consta do registroanterior, sendo necessário que a caracterização do objeto do negócio repita os elementosde descrição constantes do registro” (“Retificação do registro de imóveis”. São Paulo: Editora Oliveira Mendes, 1997, p. 68).

      Destarte, observado o princípio da especialidade objetiva, não há como condicionar a inscrição almejada à prévia retificação do cadastro imobiliário Municipal, nos termos exigidos pelo Oficial de Registro.

      Frise-se que os critérios do Município para a aferição de área e a incidência do imposto predial levam em conta as partes cobertas do imóvel, desconsiderando as descobertas, nos termos da legislação municipal anexada aos autos.

      O Município de Várzea Paulista instituiu o Plano Diretor pela Lei Complementar nº 167/06[1], e o Código Tributário Municipal pela Lei Complementar nº 160/05[2], em que os artigos 10 e 28, respectivamente, consideram área construída apenas as que sejam cobertas. E a NBR 12.721, que trata do cálculo dos custos de construção para incorporação imobiliária, nos termos dos artigos 53 e 54 da Lei nº 4.591/64, considera também as áreas descobertas. Ou seja, enquanto a legislação do Município de Várzea Paulista considera como área construída apenas as áreas cobertas, a NBR mencionada define a área real total da unidade autônoma pela soma das medidas da superfície de quaisquer dependências, ou conjunto de dependências, cobertas ou descobertas, nela incluídas as superfícies das projeções de paredes, de pilares e demais elementos construtivos (item 3.7.1.3) [3]. Esse descompasso entre os diplomas legais justifica a disparidade de área predial constante na certidão de cadastro imobiliário expedida pelo Município de Várzea Paulista em comparação à área mencionada na matrícula.

      E muito embora o título apresentado seja um instrumento particular, é importante lembrar, a título de ilustração, que a Lei nº 7.433/85, ao dispor sobre os requisitos para a lavratura de escrituras públicas, contenta-se com a descrição do imóvel pela menção à matrícula, em se tratando de imóveis urbanos e desde que sua descrição e caracterização estejam presentes na certidão do Cartório de Registro de Imóveis. A propósito, seu artigo 2°, caput, assim prevê:

      “Art 2º – Ficam dispensados, na escritura pública de imóveis urbanos, sua descrição e caracterização, desde que constem, estes elementos, da certidão do Cartório do Registro de Imóveis”.

      No mesmo sentido, o artigo 225, §§ 1º e 2º, da Lei nº 6.015/73 estabelece que:

      “Art. 225 – Os tabeliães, escrivães e juízes farão com que, nas escrituras e nos autos judiciais, as partes indiquem, com precisão, os característicos, as confrontações e as localizações dos imóveis, mencionando os nomes dos confrontantes e, ainda, quando se tratar só de terreno, se esse fica do lado par ou do lado ímpar do logradouro, em que quadra e a que distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima, exigindo dos interessados certidão do registro imobiliário.

      § 1º As mesmas minúcias, com relação à caracterização do imóvel, devem constar dos instrumentos particulares apresentados em cartório para registro.

      § 2º Consideram-se irregulares, para efeito de matrícula, os títulos nos quais a caracterização do imóvel não coincida com a que consta do registro anterior”.

      Ademais, consta da matrícula (fls. 136/143) o número do cadastro municipal do imóvel (32.028.234) correspondente àquele indicado no título (fls. 21) e que, ao que consta, decorre do cadastro único do empreendimento (matrícula-mãe fls. 127), tudo a corroborar a inexistência de ofensa ao princípio da especialidade objetiva.

      Não se ignora, por certo, que a alteração dos dados cadastrais do imóvel, com atribuição de nova designação cadastral para cada unidade autônoma do empreendimento (fls. 135 – imóvel atualmente cadastrado sob nº 32.028.393), exigirá do Oficial providências destinadas à retificação da matrícula (art. 213 da Lei nº 6.015/1973). Tal questão, no entanto, não configura óbice ao pretendido registro.

      E nem mesmo o desencontro de informações sobre o nome do bairro em que localizado o imóvel leva à conclusão diversa, na medida em que isso ocorre exclusivamente nos cadastros da Municipalidade (fls. 129 e 135), havendo, também nesse aspecto, perfeita correspondência entre o título e a matrícula imobiliária (em ambos, há menção ao Bairro Promeca).

      Superados os óbices registrários, o título deve ingressar na tábua registral.

      Por fim, mister consignar que o processo de dúvida é reservado à análise da discordância do apresentante com os motivos que levaram à recusa do registro do título e, de seu julgamento, decorrerá a qualificação negativa, com o cancelamento da prenotação, ou o afastamento da objeção do Oficial, com a consequente realização do ato rogado (art. 203, inciso II, da Lei nº 6.015/1973).

      Logo, a despeito da irresignação apresentada nas razões de recurso, o pedido de adoção de medidas disciplinares contra o Oficial não vinga, sobretudo porque inexistem, nos autos, elementos concretos a indicar violação de deveres funcionais pelo registrador, a quem, é sabido, cabe qualificar o título segundo sua liberdade intelectual e livre convicção.

      Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação e julgo improcedente a dúvida, observando que ao Oficial de Registro caberá adotar as necessárias providências para retificação da matrícula nº 10.960, na forma do art. 213, da Lei nº 6.015/1973, a fim de que dela passe a constar o novo número de cadastro municipal do imóvel: 32.028.393 (fls. 135).

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      NOTAS:

      [1]https://transparencia5.varzeapaulista.sp.gov.br/include/legislacao/pdf/lc_371_434.pdf

      [2]https://transparencia5.varzeapaulista.sp.gov.br/include/legislacao/pdf/lc_4502_5068.pdf

      [3]https://central3.to.gov.br/arquivo/176706/

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