TJSP – CSM – Bem imóvel que foi adquirido pelo autor da herança na condição de casado – Necessidade de demonstração do destino dado à cota parte da esposa, que faleceu precedentemente.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1064774-81.2021.8.26.0100

      Registro: 2022.0000439038

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1064774-81.2021.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante LENIR CARVALHO DOS SANTOS NASCIMENTO, é apelado DÉCIMO SEGUNDO OFICIAL DE REGISTRO DE IMOVEIS DA COMARCA DE SÃO PAULO – CAPITAL.

      ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 3 de junho de 2022.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL nº 1064774-81.2021.8.26.0100

      APELANTE: Lenir Carvalho dos Santos nascimento

      APELADO: Décimo Segundo Oficial de Registro de Imoveis da comarca de São Paulo – Capital

      VOTO Nº 38.701

      Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente, impedindo-se o registro do formal de partilha – Bem imóvel que foi adquirido pelo autor da herança na condição de casado – Necessidade de demonstração do destino dado à cota parte da esposa, que faleceu precedentemente – Sentença homologatória de partilha que não implica reconhecimento tácito de separação de fato do ora de cujus e subsequente união estável com outra pessoa – Imperiosa observação do princípio da continuidade registrária – Apelação não provida.

      Trata-se de apelação (fls. 100/105) interposta por Lenir Carvalho dos Santos Nascimento contra a r. sentença (fls. 91/94), proferida pela MMª Juíza Corregedora Permanente do 12º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, que julgou procedente a dúvida por ele suscitada, negando o registro do formal de partilha pelo falecimento de Antonio Carvalho dos Santos no fólio real do imóvel transcrito sob nº 101.572 daquela serventia, dada a inobservância do princípio da continuidade registrária.

      O título foi prenotado sob nº 577.745 e recebeu óbices relativamente à qualificação dos herdeiros, mas que foram superados com a apresentação da documentação pertinente, restando, contudo, as seguintes exigências (fls. 01/02):

      “Apresentar, em seu original, o Inventário de Bens deixados pelo falecimento de AMELIA DE SOUZA MATIAS SANTOS, para ser qualificado e estando em ordem ser registrado. Apresentar em seu original ou cópia autenticada da Certidão de Casamento atualizada de ANTONIO CARVALHO DOS SANTOS e AMELIA DE SOUZA MATIAS SANTOS, constando a averbação da separação, se realizado em outra Comarca deverá ser reconhecida a firma do Subscritor da Certidão na Comarca de origem do documento ou nesta Capital do Estado de São Paulo (Cap. XX Item 120 das NSCGJ-SP) (Provimento 56/2019)”.

      Alega a apelante, em suma, que a sentença homologatória da partilha reconheceu tacitamente a separação de fato do Sr. Antônio e Sra. Amélia, atribuindo à requerente e sua irmã o quinhão de 50% para cada, com relação ao imóvel. Caso o juízo do inventário tivesse dúvida referente à separação de fato do casal, teria reservado a meação da Sra. Amélia, a fim de que possíveis herdeiros reclamassem sua herança dentro do prazo legal, ou teria submetido os autos às vias ordinárias. Postulou, então, a improcedência da dúvida para a efetivação do registro do formal de partilha na matrícula do imóvel (fls. 100/105).

      A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 112/113).

      É o relatório.

      A pretensão da recorrente é a de registrar o formal de partilha dos bens deixados por Antônio Carvalho dos Santos junto à transcrição de nº 101.572, do 12º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, por meio do qual recebeu 50% do bem imóvel transcrito, com atribuição dos restantes 50% a sua irmã.

      O pedido foi apresentado ao 12º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, mas o registro do título foi negado porque Antônio Carvalho dos Santos, ora falecido, era casado com Amélia Matias de Souza Santos desde 06/05/1950, no regime da comunhão de bens, e adquiriu o imóvel no estado civil de casado, em 1965, como confirma a escritura de aquisição (fls. 30).

      Diante disso, o Delegatário exigiu a apresentação do inventário dos bens deixados pelo falecimento de Amélia de Souza Matias, para ser qualificado e, estando em ordem, registrado.

      A apelante suscita que a exigência é descabida, uma vez que a r. sentença homologatória da partilha reconheceu tacitamente a separação de fato de seu genitor, Sr. Antônio, com a Sra. Amélia, atribuindo à requerente e sua irmã o quinhão de 50% para cada, com relação ao imóvel. Além disso, diz que, caso o juízo do inventário tivesse dúvida referente à separação de fato do casal, teria reservado a meação da Sra. Amélia, a fim de que possíveis herdeiros reclamassem sua herança dentro do prazo legal, ou teria submetido os autos às vias ordinárias.

      Mas não tem razão.

      Inicialmente, recorde-se que o título judicial também se submete à qualificação pelo Oficial, tal como dispõe o item 117 do Capítulo XX do Tomo II das Normas de Serviço da

      Corregedoria Geral da Justiça, cujo teor é o seguinte:

      “117. Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.

      Nesse sentido, convém destacar o seguinte trecho extraído de caso análogo:

      “De início, saliente-se que a origem judicial do título não impede a sua qualificação nem implica desobediência, como está no item 117 do Capítulo XX do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça e, no mais, é lição corrente deste Conselho Superior da Magistratura (mencione-se, por brevidade, o decidido na Apelação Cível n.º 0003968-52.2014.8.26.0453, j. 25.2.2016). Observe-se, ademais, que in casu se trata, verdadeiramente, de título judicial (passível, portanto, de qualificação), e não de ordem judicial (hipótese em que o cumprimento seria coativo e independeria do exame de legalidade próprio da atividade registral) (Apelação Cível 1018352-48.2021.8.26.0100, Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, Relator Corregedor Geral Desembargador Ricardo Anafe, data do julgamento: 14/12/2021 grifo não no original”.

      Então, havendo razão bastante para a qualificação negativa do título judicial, a recusa do seu registro é admissível.

      Relativamente à exigência, esta se sustenta.

      Pela análise da certidão da transcrição nº 101.572 (fls. 30), constata-se que o bem imóvel descrito foi adquirido por

      Antonio Carvalho dos Santos em 14 de setembro de 1965, quando ostentava o estado civil de casado.

      E Antonio Carvalho dos Santos se casou com Amélia de Souza Matias em 06 de maio de 1950 (fls. 27), tendo sido identificado como viúvo de Amélia por ocasião de seu falecimento (fls. 25).

      Nestas condições, era imperioso que fosse trazido ao registro o inventário de Amélia, a fim de que se pudesse aferir a quem foi atribuída sua cota parte do bem imóvel, uma vez que, pelos dados existentes no registro imobiliário, ela seria meeira do bem em apreço, o que não se pode dispensar em razão do princípio do trato consecutivo ou da continuidade.

      Por força do princípio do trato consecutivo (ou da continuidade), como regra geral só se admite a inscrição (registro stricto sensu ou averbação – Lei nº 6.015, art. 167, I e II) “daqueles actos de disposição em que o disponente coincide com o titular do direito segundo o registro” (Carlos Ferreira de Almeida, apud Ricardo Dip, Registros sobre Registros, n.º 208).

      É o que diz a Lei nº 6.015/1973:

      “Art. 195 – Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro.

      Art. 237 – Ainda que o imóvel esteja matriculado, não se fará registro que dependa da apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a continuidade do registro”.

      Nas palavras de Afrânio de Carvalho (Registro de Imóveis, 3ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1982, p. 304):

      “O princípio de continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidades à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões que derivam umas das outras, asseguram sempre a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente. Ao exigir que cada inscrição encontre sua procedência em outra anterior, que assegure a legitimidade da transmissão ou da oneração do direito, acaba por transformá-la no elo de uma corrente ininterrupta de assentos, cada um dos quais se liga ao seu antecedente, como o seu subseqüente a ele se ligará posteriormente. Graças a isso o Registro de Imóvel inspira confiança ao público”.

      E como já mencionado, no presente caso, não seria possível registrar o formal de partilha da integralidade do imóvel às herdeiras de Antonio Carvalho dos Santos, sem que fosse informado o destino dado à cota parte do imóvel correspondente à meação da Sra. Amélia.

      A alegação de que o imóvel foi adquirido pelo Sr. Antonio quando estava separado de fato da Sra. Amélia e vivia em união estável com a genitora das herdeiras, a Sra. Maria Casemira Servulo, não foi objeto de reconhecimento judicial específico em ação própria, com a participação de todos os interessados.

      A mera afirmação, por parte das herdeiras, no curso do processo de arrolamento de que seu genitor adquiriu o imóvel quando separado de fato da Sra. Amélia e já tendo assumido convivência de união estável com a Sra. Maria Casemira Servulo, e a consequente homologação da partilha nos termos do pretendido, ou seja, da totalidade do bem entre as duas herdeiras do de cujus, não implica reconhecimento tácito do Juízo quanto ao alegado, e, por via de consequência, não tem o condão de afastar a qualificação do título pelo Oficial de Registro.

      Como bem ressaltou a sentença, “a parte suscitada confirma que a separação do casal deu-se apenas de fato (fls.05), sendo certo que a questão não foi enfrentada adequadamente pelo juízo do inventário, o qual homologou a partilha dos bens com base nas primeiras declarações, sem que tenha havido comprovação da dissolução do casamento (fls. 35/37)” (fls. 94).

      E, como sempre ocorre em sentenças meramente homologatórias, houve ressalva de eventuais direitos de terceiros prejudicados (fls. 73).

      Ressalte-se que a exigência de respeito à continuidade, como requisito para o registro do título de transmissão do domínio, decorre de reiterada jurisprudência deste C. Conselho Superior da Magistratura:

      “REGISTRO DE IMÓVEIS. Dúvida julgada procedente. Carta de sentença extraída de ação de adjudicação compulsória. Ação originariamente movida contra sucessores do proprietário e promitente vendedor do imóvel, já falecido. Necessidade de prévio registro da partilha que, em inventário ou arrolamento de bens, atribuiu o imóvel aos réus da ação de adjudicação compulsória. Princípio da continuidade. Recurso não provido.” (CSM, Apelação Cível nº 1.104-6/4, Comarca de São Caetano do Sul, Relator Desembargador Ruy Camilo, j. 16/06/2009).

      Não há, portanto, como afastar as exigências apresentadas pelo Oficial de Registro de Imóveis, devendo ser mantida a sentença proferida pela MMª Juíza Corregedora Permanente.

      Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao apelo.

      FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

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