Processo Administrativo – Oficial que se aposenta durante o procedimento – Sanção que pode ser aplicada, uma vez que a falta disciplinar que se imputa ao acusado ocorreu, em tese, enquanto sujeito ao poder correcional.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

      Processo CG n° 2016/38426

      (89/2016-E)

      Processo Administrativo Disciplinar – Oficial que se aposenta durante o procedimento – Perda do objeto – Inocorrência – Sanção que pode ser aplicada, uma vez que a falta disciplinar que se imputa ao acusado ocorreu, em tese, enquanto sujeito ao poder correcional – Acusado no gozo de sua capacidade civil – Sanção de cassação da aposentadoria que não pode ser aplicada, por analogia, a delegado de serventia extrajudicial – Pretensão punitiva alcançada pela prescrição – Recurso provido, prejudicada a análise do mérito direto.

      Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

      Trata-se de recurso administrativo tirado em face de sentença que, por conta das faltas disciplinares descritas na Portaria, aplicou ao acusado a pena de cassação de aposentadoria.

      O recurso baseia-se, além da questão de mérito, em quatro preliminares: a perda do objeto do procedimento, diante da aposentadoria do acusado no seu curso; incapacidade civil do acusado; a ausência de previsão legal da pena de cassação de aposentadoria a delegados de serventias extrajudiciais; a ocorrência de prescrição.

      É o breve relato.

      Passo a opinar.

      O recurso comporta provimento.

      As três primeiras preliminares devem ser afastadas.

      A aposentadoria do acusado não acarretou perda de objeto do processo administrativo. Nesse sentido, existe recente precedente dessa Corregedoria Geral da Justiça. Trata-se do julgamento do Recurso Administrativo n° 2015/31314, pelo então Corregedor Geral da Justiça, Desembargador Hamilton Elliot Akel, cujo parecer foi subscrito por toda a equipe do extrajudicial (esse parecerista, inclusive). Transcrevo o trecho que aqui interessa:

      “Embora o recorrente tenha se aposentado voluntária e recentemente, no curso deste processo, pela Carteira de Previdência das Serventias Notariais e de Registro do Estado de São Paulo (fls.852) com a consequente extinção da delegação, nos termos do inciso II do artigo 39 da Lei 8.245/94, os ilícitos que lhe foram imputados neste processo administrativo disciplinar, são anteriores à data da aposentação.

      É cediço que no âmbito disciplinar aplicam-se subsidiariamente à Lei nº 8.935/94 (Lei dos Notários e dos Registradores) a Lei nº 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, e a Lei Estadual nº 10.261/68 (Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de São Paulo) pois, o registrador e o notário são delegados do Estado, e, nesta condição, atuam como se fossem o próprio Estado a serviço dos particulares, com a finalidade de tutelar e proteger os interesses destes com relevância e reflexos para a sociedade e para o próprio Estado. Nesta linha de raciocínio, estão sujeitos aos princípios da administração e que são os da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência.

      Assim sendo, se de um lado é certo que a causa da aposentadoria do recorrente foi o tempo de contribuição previdenciária, e que o ato administrativo que a concedeu não poderá ser atingido pela decisão final deste processo administrativo disciplinar, pois, não há possibilidade de cassação da aposentadoria, de outro lado, é certo que a razão (fundamento) que possibilita a continuidade deste processo administrativo disciplinar para fatos ocorridos antes do ato de aposentação, é a de evitar que simplesmente sejam apagados eventuais ilícitos cometidos, e, com isso, blindar e brindar o prestador do serviço público, que ficaria incólume de responsabilização.

      Além do mais, a Lei Estadual n° 10.261/68 estabelece no artigo 259 "numerus clausus" às hipóteses em que o funcionário público aposentado pode sofrer punição administrativa, que se cinge à cassação da aposentadoria, e assim o faz justamente pelo fato de a aposentadoria extinguir o vínculo funcional, e por existir interesse da Administração de que as faltas de intensa gravidade praticadas possam alcançar os funcionários que já estão aposentados.

      Nestas condições, é possível decretar a pena de perda da delegação do recorrente, como reconhecimento da prática de ato de natureza grave e incompatível com o exercício de uma função pública exercida pelo particular por delegação, apenas não será possível a execução da pena, porém, fica registrada a prática de infração funcional grave que configurou a perda da delegação, referente a fatos ocorridos antes da/aposentadoria, quando o faltoso estava à frente do serviço público prestado em caráter particular.

      A Colenda Câmara Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo decidiu neste sentido em caso que se aplica ao ora examinado por analogia, no Recurso Administrativo nº 146.382-0/8, amparado na lição de J. Cretella Júnior:

      "É engano pensar que o funcionário em disponibilidade e o aposentado estão a salvo de punições. Descoberta muito tempo depois a infração cometida “in officio” ou “propter officium”, o funcionário “reverterá” simbolicamente ao serviço, responderá ao processo e sofrerá a pena de cassação de aposentadoria ou disponibilidade. Do mesmo modo o funcionário exonerado a pedido, embora nem mais o vínculo remuneratório o ligue ao Estado, poderá sofrer sanção. Neste caso a exoneração a pedido (ou dispensa) será transformada em exoneração-sanção (ou dispensasanção), com todas as consequências jurídicas diretas e reflexas advindas, conforme a hipótese. Nestas três hipóteses aplicam-se as regras prescricionais como se o funcionário estivesse no serviço" (Prescrição da Falta Administrativa, RT, 544/12-26). (Destaquei)

      Assim sendo e não obstante a extinção da delegação decorrente da aposentadoria voluntária concedida pela autarquia previdenciária, nada obsta a decretação da perda da delegação decorrente de infração funcional de natureza grave, pois, apenas a execução ficará prejudicada.”

      Aliás, entendo que, para se tornar mais efetiva, a pena, na hipótese em que o acusado se aposenta, deveria ser a de multa, a possibilitar a execução, mesmo após a aposentadoria.

      Na medida em que, para funcionários públicos em geral, a lei prescreve a sanção de cassação de aposentadoria – no caso presente, como se verá, não era possível aplicar essa pena, por falta de previsão legal –, fica claro que é a própria lei que permite a responsabilização mesmo após essa aposentadoria. Ora, só se pode cassar aquilo que já se concedeu. Se a aposentadoria pode ser cassada por fatos ocorridos antes dela, resta evidente que o evento não acarreta a perda do objeto do processo administrativo.

      A segunda preliminar também não vinga. Não obstante o quadro psicopatológico atestado pelo laudo, a conclusão foi a seguinte: "sob o ponto de vista psiquiátrico forense, depreende-se que, à época do fato, sua capacidade de entendimento e determinação estavam preservadas, não havendo incidência de doença mental, perturbação de saúde mental oudesenvolvimento mental retardado. "

      Caso não fosse a hipótese de reconhecimento de prescrição da pretensão punitiva, a terceira preliminar seria albergada. É que, de fato, não existe previsão legal para a aplicação de pena de cassação de aposentadoria a delegado de serventia extrajudicial. E a analogia – ao Estatuto dos Funcionários Públicos –, como se sabe, em sede sancionatória, não pode ser usada em prejuízo do acusado.

      A Lei n° 8.935/94, que encontra eco no item 32, do Capítulo XXI, das NSCGJ, prevê, tão somente, quatro espécies de sanções aos notários e oficias de registros:

      Art. 32. Os notários e os oficiais de registro estão sujeitos, pelas infrações que praticarem, assegurado amplo direito de defesa, às seguintes penas:

      I – repreensão;

      II – multa;

      III – suspensão por noventa dias, prorrogável por mais trinta;

      IV – perda da delegação.

      Ademais, não fosse a proibição de analogia in malam partem, outra circunstância impediria a aplicação da pena de perda de cassação: ela não foi prevista, como pena mais grave, na Portaria acusatória. Vejam-se os considerandos da Portaria e se observará que ela própria previu, em abstrato, apenas as quatro sanções a que acima me referi.

      Assim, caso o mérito direto viesse a ser julgado e se concluísse pelo apenamento do acusado, a sanção teria que ser alterada.

      Contudo, o fato é que ocorreu a prescrição, em caráter intercorrente, da pretensão punitiva.

      A portaria é datada de 24 de junho de 2010 e o recorrente foi citado em 30 de junho de 2010 (fl. 29verso). A sentença, por sua vez, é datada de 07 de janeiro de 2016 e dela o recorrente foi intimado em 26 de janeiro de 2016 (fl. 517).

      Conforme o art. 261, II, da Lei nº 10.261/68 (Lei que regeu o presente procedimento), a prescrição, no caso, dá-se no prazo de cinco anos.

      O prazo da prescrição foi interrompido, a teor do art. 261, §2°, pela portaria que instaurou o procedimento administrativo. A partir daí, de acordo com o art. 277, o processo deveria ser concluído em 90 dias, após a citação do acusado.

      A citação ocorreu em 30 de junho de 2010 (fl. 29verso). Logo, o processo deveria estar encerrado em 30 de setembro de 2010.

      A partir dessa data, de acordo com entendimento do Superior Tribunal de Justiça (RMS 13174/SP – Relator Ministro Gilson Dipp, 18/11/03), o prazo de cinco anos volta a correr:

      ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE SUSPENSÃO POR SESSENTA DIAS, CONVERTIDA EM MULTA. PRESCRIÇÃO. OCORRÊNCIA. INTERRUPÇÃO DO PRAZO. APLICAÇÃO DOS PRAZOS ADMINISTRATIVOS PREVISTOS NA LEI N° 10.261/68. RECURSO PROVIDO.

      I – Nos termos do art. 261 da Lei n° 10.261/68, a ação disciplinar, quanto às infrações puníveis com demissão a bem do serviço público, prescreve em cinco anos, iniciando-se o prazo a partir da data em que a autoridade competente tomar conhecimento das irregularidades praticadas pelo servidor. Com a instauração o processo administrativo disciplinar, o curso da prescrição interrompe-se. Ultrapassado o período relativo à conclusão e decisão no processo disciplinar o prazo prescricional volta a ter curso por inteiro, a partir do fato interruptivo. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e desta Corte.

      Tornando a correr o prazo, o processo deveria ter sido encerrado até 30 de setembro de 2015. No entanto, a sentença foi exarada, apenas, em janeiro de 2016.

      Nem se diga que o incidente de insanidade mental, instaurado por analogia ao art. 149 do Código de Processo Penal (apenso, ao primeiro volume), tem o condão de suspender o curso de prescrição. Ele suspende, apenas, o processo.

      De acordo com o art. 261, §4°, a prescrição só não corre em duas hipóteses:

      1 – enquanto sobrestado o processo administrativo para aguardar decisão judicial, na forma do § 3º do artigo 250;

      2 – enquanto insubsistente o vínculo funcional que venha a ser restabelecido.

      Sobre a não suspensão ou interrupção do prazo prescricional, mas apenas a suspensão do processo, na hipótese de instauração de incidente de insanidade mental, confira-se, no Superior Tribunal de Justiça, o Habeas Corpus 270474/RN, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, 20/08/13:

      HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. 1. NÃO CABIMENTO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. RESTRIÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. EXAME EXCEPCIONAL QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA DEFESA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL. 2. APROPRIAÇÃO DE RENDIMENTO DE IDOSO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA (ART. 109, IV, DO CÓDIGO PENAL). PENA DE 1 (UM) ANO E 6 (SEIS) MESES. PACIENTE MAIOR DE 70 ANOS NA DATA DA SENTENÇA (ART 115 DO CÓDIGO PENAL). PRESCRIÇÃO EM 2 (DOIS) ANOS. 3. SUSPENSÃO DO PROCESSO DEVIDO A INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL (ART. 149, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL). SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL POR FALTA DE PREVISÃO LEGAL. NÃO OCORRÊNCIA. 4. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO PARA RECONHECER A PRESCRIÇÃO.

      3. Em que pese o incidente de insanidade mental instaurado entre 3/11/2008 e 25/2/2010 ter suspendido o processo, tenho que não suspende a prescrição, por falta de previsão legal. A exceção dos casos enumerados nos arts. 116 e 117 do Código Penal, todas as outras hipóteses em que a suspensão do processo acarreta a suspensão da prescrição devem ser previstas em lei. Na espécie, não se pode interpretar o art. 149, §2°, do Código de Processo Penal, que prevê a suspensão do processo durante o curso do incidente de sanidade mental, de maneira desfavorável ao réu, suspendendo-se, também, a prescrição, uma vez que esta providência não consta do texto legal.

      No corpo do voto, o Relator, citando a lição de Guilherme de Souza Nucci, ressalta:

      No presente caso, não se pode interpretar o art. 149, §2°, do Código de Processo Penal, que prevê a suspensão do processo durante o curso do incidente de sanidade mental, de maneira desfavorável ao réu, suspendendo-se, também, a prescrição, uma vez que esta providência não consta do texto legal. Essa mesma percepção, diga-se, foi registrada por Guilherme de Souza Nucci, em interpretação acerca do art. 116 do Código Penal, cujo autorizado magistério assim apreciou a questão:

      "Não há suspensão da prescrição. Se o juiz suspender o curso do processo para aguardar decisão a ser proferida em procedimento administrativo (embora possa ter a denominação de processo administrativo), não é suficiente para deter o curso da prescrição. O mesmo ocorre se o processo for suspenso para aguardar a realização de laudo pericial para a constatação de inimputabilidade (incidente de insanidade mental) ou qualquer outra forma de procedimento incidente (como, por exemplo, o de suspeição).

      Trata-se, no art. 116, I, do CP, de causa impeditiva do curso da prescrição, situação prejudicial ao réu – logo, aplica-se a interpretação estrita sobre o termo "processo", referindo-se apenas àquele que se realiza em juízo, embora extrapenal. (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 11ª ed. São Paulo, RT, 2012, p. 608).

      Desse modo, inocorrente qualquer outra causa de interrupção ou suspensão da prescrição entre os 90 dias posteriores à citação e à prolação de sentença, tendo decorrido prazo maior do que 5 anos, é de ser decretada a prescrição da pretensão punitiva, prejudicando o exame das demais preliminares e do mérito do recurso.

      Pelo exposto, o parecer que submeto a Vossa Excelência, respeitosamente, é no sentido de se dar provimento ao recurso, declarando-se a extinção da punibilidade, em face da prescrição, e determinando-se o arquivamento do processo administrativo.

      Sub censura.

      São Paulo, 07 de abril de 2016.

      Swarai Cervone de Oliveira

      Juiz Assessor da Corregedoria

      DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, dou provimento ao recurso, para declarar a extinção da punibilidade, em face da prescrição, e determinar, em consequência, o arquivamento do processo administrativo. Publique-se. São Paulo, 11.04.2016. – (a) – MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS – Corregedoria Geral da Justiça.

      Diário da Justiça Eletrônico de 14.04.2016

      Decisão reproduzida na página 43 do Classificador II – 2016

      Fonte: INR Publicações

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