TJSP – CSM – Registro de imóveis – Registro de carta de sentença – Acordo em separação judicial – Doação da parte do imóvel cabente ao ex-marido às filhas e instituição de usufruto em favor da ex-mulher – Desnecessidade de escritura pública de doação – Procedimento de dúvida em que a qualificação do título deve ser realizada por inteiro – Reconhecimento de óbice ao registro não indicado pelo registrador – Cabimento – Título que deveria ter sido instruído com prova do pagamento do ITCMD ou de sua isenção.

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      PODER JUDICIÁRIO

      TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

      CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

      Apelação Cível nº 1023875-19.2023.8.26.0602

      Registro: 2024.0000161395

      ACÓRDÃO

      Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1023875-19.2023.8.26.0602, da Comarca de Sorocaba, em que é apelante JOANA ALVES DE QUEIROZ, é apelado 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SOROCABA.

      ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

      O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

      São Paulo, 26 de fevereiro de 2024.

      FRANCISCO LOUREIRO

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

      APELAÇÃO CÍVEL nº 1023875-19.2023.8.26.0602

      APELANTE: Joana Alves de Queiroz

      APELADO: 2º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Sorocaba

      VOTO Nº 43.094

      Registro de imóveis – Registro de carta de sentença – Acordo em separação judicial – Doação da parte do imóvel cabente ao ex-marido às filhas e instituição de usufruto em favor da ex-mulher – Desnecessidade de escritura pública de doação – Procedimento de dúvida em que a qualificação do título deve ser realizada por inteiro – Reconhecimento de óbice ao registro não indicado pelo registrador – Cabimento – Título que deveria ter sido instruído com prova do pagamento do ITCMD ou de sua isenção – Dúvida procedente, ainda que por fundamento diverso – Apelação não provida.

      Trata-se de apelação interposta por Joana Alves de Queiroz contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do 2º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas de Sorocaba/SP, que manteve a qualificação negativa do título apresentado a registro, confirmando a necessidade de lavratura de escritura pública de doação e recolhimento de eventuais impostos incidentes (fls. 55/56).

      Alega a apelante, em síntese, que por acordo celebrado nos autos da ação de separação judicial, seu ex-marido, Antonio Teodoro, doou às filhas a parte que lhe cabia no imóvel do casal, instituindo usufruto em favor da ex-esposa. Assim, entende ser desnecessária a lavratura de escritura pública de doação e instituição de usufruto, como exigido pelo registrador com base no princípio da continuidade registral, pois o ex-marido não mais possui nenhum direito sobre o imóvel em questão (fls. 62/65).

      A Douta Procuradoria de Justiça opinou pelo provimento da apelação (fls. 77/79).

      Nos termos da r. decisão a fls. 84, os autos foram remetidos a este C. Conselho Superior da Magistratura.

      É o relatório.

      Pretende a apelante o registro de carta de sentença expedida nos autos da ação de separação consensual (Processo nº 0009421-23.2001.8.26.0602), que tramitou perante a 2ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Sorocaba/SP, tendo por objeto o imóvel matriculado sob nº 98.287 junto ao 2º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas daquela localidade.

      Os títulos judiciais, cumpre lembrar, não estão isentos de qualificação para ingresso no fólio real. E a qualificação negativa do título judicial não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação Cível nº 413-6/7; Apelação Cível nº 0003968-52.2014.8.26.0453; Apelação Cível nº 0005176-34.2019.8.26.0344; e Apelação Cível nº 1001015-36.2019.8.26.0223). No exercício desse dever, o Oficial encontrou óbices ao registro do título, emitindo Nota de Devolução com o seguinte teor (fls. 19):

      “Em atenção ao princípio da segurança jurídica e da continuidade registral, fica prejudicado o exame pormenorizado e registro do presente título, tendo em vista que o imóvel objeto da matrícula nº 98.287, constante da Carta de Sentença ora apresentada, já encontra-se na titularidade das partes, na proporção de 50% para cada, no estado civil de “separados”, portanto não há o que se falar em Partilha de bens.

      E ainda e for o caso, apresentar o título hábil para a Doação (Escritura Pública de Doação), para análise e registro.”

      Consoante se infere da petição inicial da ação de separação consensual de Joana de Queiroz Teodoro, ora apelante, e Antonio Teodoro, ficou ajustado, em relação aos bens, que “o separando assume o compromisso de continuar pagando as prestações vincendas do financiamento do imóvel” adquirido na constância do casamento e “doa sua meação dos direitos incidentes” sobre o referido imóvel “às três filhas, reservando o usufruto à separanda” (fls. 21/27). O acordo foi homologado judicialmente em 21 de agosto de 2001 (fls. 32/33) e o trânsito em julgado foi certificado naquela mesma data (fls. 34).

      A questão cinge-se, pois, à possibilidade de registro da carta de sentença oriunda do processo nº 0009421-23.2001.8.26.0602 da 2ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Sorocaba/SP, tendo por objeto o imóvel matriculado sob nº 98.287 junto ao 2º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas daquela localidade, sem a necessidade da lavratura de escritura pública de doação.

      Entende o Oficial de Registro que haveria ofensa ao princípio da continuidade registral, pois o imóvel já está registrado em nome dos ex-cônjuges, em igual proporção, ambos qualificados na matrícula como separados judicialmente, de maneira que a partilha ajustada não comportaria ingresso no fólio real e a doação às filhas, da parte cabente ao genitor, deveria se dar por meio de escritura púbica.

      Ora, diferentemente do que entendeu o registrador, nos autos da separação deliberaram as partes apenas sobre os direitos havidos, na constância do casamento, sobre o imóvel em que residia o casal. Não havia bens imóveis registrados em nome dos cônjuges, de maneira que, de fato, não há partilha a ser registrada.

      A propósito, mister observar que o financiamento do imóvel foi quitado após a separação judicial do casal, razão pela qual o respectivo registro de aquisição foi realizado em nome de ambos, na qualidade de condôminos, cabendo a cada qual igual proporção na titularidade do bem (R.04-98.287, fls. 15/16). Por conseguinte, não há que se falar em ofensa ao princípio da continuidade registral, devendo esse óbice ser afastado.

      Por outro lado, há vários precedentes deste Conselho Superior da Magistratura no sentido de ser dispensada a lavratura do ato notarial quando a avença já passou pelo crivo do Poder Judiciário. É o que se observa do teor da ementa da Apelação nº 1000762-62.2014.8.26.0663, cujo relator foi o então Corregedor Geral da Justiça, Desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças:

      “Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente, impedindo-se o registro de Carta de Sentença, oriunda de separação judicial, com doação de imóvel a filha menor – Desnecessidade de escritura pública – Precedentes – Desnecessidade de aceitação da donatária (art. 543 do Código Civil) – Não incidência de emolumentos, por haver gratuidade expressamente exposta no título – Necessidade, contudo, de recolhimento dos tributos – Dúvida prejudicada e recurso não conhecido.”

      Também é essa a orientação atual do C. Superior Tribunal de Justiça, da qual destacamos o seguinte julgado:

      “RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. DIVÓRCIO CONSENSUAL. PARTILHA DE BENS. ACORDO. DOAÇÃO AOS FILHOS. HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL. SENTENÇA COM EFICÁCIA DE ESCRITURA PÚBLICA. FORMAL DE PARTILHA. REGISTRO NO CARTÓRIO DE IMÓVEIS. POSSIBILIDADE.

      1.Não constitui ato de mera liberalidade a promessa de doação aos filhos como condição para a realização de acordo referente à partilha de bens em processo de separação ou divórcio dos pais, razão pela qual pode ser exigida pelos beneficiários do respectivo ato.

      2.A sentença homologatória de acordo celebrado por excasal, com a doação de imóvel aos filhos comuns, possui idêntica eficácia da escritura pública.

      3.Possibilidade de expedição de alvará judicial para o fim de se proceder ao registro do formal de partilha. 4. Recurso especial provido.” (REsp n. 1.537.287/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 18/10/2016, DJe de 28/10/2016).

      Em outras palavras, igualmente extraídas de precedente da Corte Superior, há “tese pacificada pela Segunda Seção no sentido da validade e eficácia do compromisso de transferência de bens assumidos pelos cônjuges na separação judicial, pois, nestes casos, não se trataria de mera promessa de liberalidade, mas de promessa de um fato futuro que entrou na composição do acordo de partilha dos bens do casal” (REsp n. 1.355.007/SP, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 27/6/2017, DJe de 10/8/2017).

      No caso concreto, a vontade manifestada pelo doador é tão clara que sequer pode ser confundida com mera promessa, a qual se distingue da formalização de seu objeto e comporta arrependimento.

      Como então consignado, dadas as peculiaridades da partilha ajustada em separações e divórcios – cuja finalidade é a dissolução pacificada e a contento da sociedade conjugal – há que se reconhecer verdadeiro pacto concretizado com relação ao ato prometido.

      Note-se que tal solução em nada conflita com outros precedentes deste C. Conselho Superior da Magistratura, que versam sobre casos em que havia expressa menção quanto à necessidade de escritura pública no próprio acordo de partilha dos cônjuges (Apelação nº 1002967-74.2019.8.26.0506, j. em 16/03/2020, e Apelação nº 1001280-43.2020.8.26.0404, j. em 13/05/2021, Rel. Desembargador Ricardo Anafe, então Corregedor Geral da Justiça). Essa não é a hipótese em análise.

      Não há dúvida, portanto, de que também esse óbice não subsiste.

      Contudo, o título não comporta ingresso no fólio real por motivo diverso.

      Como é sabido, tanto o MM. Juiz Corregedor Permanente quanto este C. Conselho Superior da Magistratura, ao apreciar as questões postas no processo de dúvida, devem requalificar o título por completo. A qualificação do título realizada no julgamento da dúvida é devolvida por inteiro ao órgão para tanto competente, sem que disso decorra decisão extra ou ultra petita e, tampouco, violação do contraditório e ampla defesa (cf. Apelação Cível nº 33.111-0/3; in “Revista de Direito Imobiliário”; 39/339. Apelação Cível 1024566-08.2020.8.26.0224; Relator: Ricardo Anafe (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Data do Julgamento: 15/04/2021; Data de Registro: 23/04/2021).

      In casu, ainda que a nota devolutiva não tenha se referido à prova de pagamento do imposto devido na espécie ou de sua isenção, possibilidade aventada apenas pelo MM. Juiz Corregedor Permanente como uma das razões para a negativa de ingresso do título, o fato é que, realmente, sem essa prova não é possível o registro da doação.

      De rigor, pois, a manutenção da procedência da dúvida, ainda que por outro fundamento.

      Por fim, mister consignar que, estando afastadas as exigências anteriormente formuladas pelo registrador e uma vez reapresentado o título com a prova do pagamento do ITCMD ou de sua isenção, após nova qualificação e desde que não surjam outros óbices, poderá ser registrada a doação da parte do imóvel cabente ao genitor às filhas, conforme acordo homologado judicialmente e sem a necessidade de lavratura de escritura pública.

      Diante do exposto, pelo meu voto, embora por fundamento diverso, mantenho a recusa do registro e, em consequência, nego provimento à apelação.

      FRANCISCO LOUREIRO

      Corregedor Geral da Justiça e Relator

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